Capítulo 8

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Ian

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Ian

     Se eu dormi depois daquela cena no corredor? Sim. Se eu tive descanso? Não, pois tudo que havia em minha mente era Missy, suas lágrimas, e aquela camisola azul. Vejo o nascer do sol e decido descer para preparar minha partida imediata. Vou até a cozinha para tomar um gole de café antes de procurar meu cavalo e ali encontro o objeto de meus sonhos coando a bebida matinal.

-- Bom dia. -- cumprimento.

     Ela sorri.

-- Bom dia! O senhor é madrugador pelo visto.

-- Não tanto quanto a senhorita. -- digo.

     Ela concorda com um aceno e termina a tarefa, colocando uma toalha na mesa, pães e um pote de manteiga. Depois trás os talheres e xícaras.

-- Se importa de tomarmos o café aqui? -- ela pergunta.

-- De forma alguma. -- digo, já me servindo.

     A observo enquanto passa manteiga no pão. Está com os cabelos soltos, ainda com cara de sono mas sem o ar desolado de ontem. Depois que a abracei, relutei em soltá-la e Missy por sua vez fez o mesmo. Depois que ela disse aquelas coisas naquele corredor eu comecei a compreendê-la. Pelas palavras e por ver o que aconteceu ali, a mágoa e raiva que ela tem de Edmund Kedard, como ela tremia ao ver o sangue naquele quarto, tão próximo de seu próprio aposento. Como se sentia ao saber que esteve tão próxima daquele lugar, tão próxima do assassino do pai. E se ele entrasse pela janela errada, a mataria também?

-- Senhorita, creio que depois de ontem temos um vínculo de amizade, não? -- pergunto sorrindo.

     Ela olha para mim, desconfiada. Toma um gole de café para engolir o pão que mastigava.

-- Um vínculo ainda tênue. Mas, pergunte.

-- Como sabe que quero lhe fazer perguntas?

-- É tudo o que tem feito desde ontem, senhor. -- ela sorri e me sinto encorajado.

-- É um costume recente beber conhaque?

     Ela cora ligeiramente.

-- Só bebo quando não consigo dormir. Uma ou duas doses pequenas.

-- Pelas suas olheiras, a insônia lhe é frequente.

-- Está me chamando de bêbada? -- ela me acusa.

-- De forma alguma, eu também aprecio uma boa bebida. Só queria alertá-la quanto ao perigo fazer isso frequentemente.

-- Eu os conheço muito bem. Mas é isso ou ficar insone noites a fio ouvindo aquele gemido naquele quarto assombrado. Não pode me julgar por isso.

     Ela está magoada e envergonhada, percebo.

-- Tem razão, me perdoe. -- decido mudar de assunto -- O assassino de seu pai foi pego?

     Ela me olha por um longo tempo antes de responder.

-- Não.

-- E a senhorita tem ideia de quem poderia ser?

-- Porque está me perguntando isso? O senhor sabe de algo que eu não sei?

-- Não, eu infelizmente não sei. Pergunto pois estou preocupado que o assassino volte atrás da senhorita.

-- O senhor conheceu Edmund Kedard, um homem como ele cultivava inimigos. Se eu temer a cada um deles, irei enlouquecer em poucos meses.

-- Tem razão.

     Concordei, mas não me senti confiante, pois sabia que os inimigos de Edmund Kedard poderiam aparecer e lhe fazer mal. Talvez até mesmo tenha sido um deles que lhe fez aquele machucado recente.

     Enquanto eu pensava com meus botões terminando a refeição, uma gritaria se fez ouvir. Agnes apareceu na cozinha correndo e estancou ao me ver.

-- Senhorita! Senhor. -- ela me cumprimentou.
    
     Acenei com a cabeça.

-- O que aconteceu, Agnes? Quando a vejo correr assim, já sei que não é boa coisa. -- Missy diz, levantando-se.

-- Senhor Matias estava indo até a cidade vizinha visitar a mãe doente quando encontrou uma coisa. Erik.

     Vejo o rosto de Missy perder a cor, e ela se apoia na mesa, como se fosse tomada por uma súbita tontura, tamanha surpresa aquele nome lhe causou, seja de quem fosse. Logo ela se recupera e sai a passos rápidos, e eu sigo ao seu encalço. Saímos para fora e encontramos ali dois homens conversando, e uma carriola coberta com um grande pano de sapê. Vejo sob ele pés imóveis quase encostando no chão.

     Sem cerimônias, Missy puxa o tecido que cobre o corpo e o olha atentamente, assim como eu. Ali jaz um homem grande e corpulento, já com a pele acizentada, ele deve estar morto há um ou dois dias. E a causa da morte é bem aparente: um pequeno, porém profundo corte no pescoço o fez sangrar até morrer.

     Os homens cessam a conversa e um deles pergunta a patroa.

-- Devemos chamar o coveiro, senhorita?

     Missy tira os olhos do cadáver e olha para eles, espantada.

-- Coveiro? Não, isso me custaria duas moedas. O joguem no rio, a correnteza forte cuidará dele. -- ela diz, firme.

     Isso me assombra um pouco, porém os homens concordam e, sem hesitar carregam o homem até o destino ordenado. Agnes logo entra em casa silenciosamente, já Missy e eu ficamos ali até os homens desapareceram de vista. Levo alguns momentos para entender o sentido dessa cena.

-- Bem que a senhorita me avisou que o rato saiu daqui em condições piores.

     Ela apenas se vira para mim e me encara com altivez, como se aguardasse meu julgamento.

-- Não é tão frágil quanto pensei, senhorita. -- sorrio -- Isso é bom. Me deixará mais tranquilo quando eu for embora.

     Ela solta o ar que prendia.

-- Já está indo?

-- Sim, preciso partir o quanto antes.

      Pensar em tudo o que aconteceu aqui, completo mentalmente.

-- Desejo que faça boa viagem. E lhe agradeço a consideração de ter vindo até aqui. -- ela sorri sinceramente.

     Pego suas mãos novamente, como se eu não pudesse resistir a esse último contato.

-- Antes, preciso que me faça uma promessa.

-- Que promessa, senhor?

-- Prometa que, se não houver mais saída, irá me procurar. Eu… nós iremos dar um jeito. Prometa-me.

     Ela me encara sem piscar, sem dúvidas analisando, pesando as consequências daquela promessa.

-- Eu prometo, Ian.

-- Ótimo! Nos veremos novamente então. Até esse dia, senhorita Missy.

     Levo sua mão aos meus lábios num beijo que, conscientemente, leva alguns segundos mais que o necessário.

Meu querido Senhor Mackenzie - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora