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ANAHÍ

Bem, é meio esquisito botar tudo isso no papel. Mas vamos lá. Foi assim que conheci o Alfonso. Tudo aconteceu há seis anos. Eu me hospedava no hotel Americana, em Bogotá. Estava lá para assass...Tinha um trabalho a realizar para a minha firma. A empresa para a qual eu trabalho. Coisa de rotina.

A cidade estava um verdadeiro caos. Políticos eram assassinados, soldados invadiam os prédios todos os dias, policiais vasculhavam os quartos.

Certo dia, num abrir e fechar de olhos, a cidade inteira entrou em ebulição: as pessoas saíram às ruas, gritando e berrando. Ouvi alguém dizer em espanhol:

— O Barracuda foi baleado!

O Barracuda: Sancho Varron.

Conhecia muito bem aquele nome. Um político local que governava a província. Não era um cara do bem. Eu tinha...ouvido dizer que ele fora assassinado.

Nuvens escuras e ameaçadoras se formavam no céu espelhando o clima nas ruas, e por ambos os motivos achei melhor voltar para o hotel. Meus cabelos eram castanhos e meu espanhol excelente, mas minhas roupas definitivamente entregavam o ouro: una turista gringa. Não era um dia propício para se destacar na multidão.

A cotoveladas, abri caminho através da turba ensandecida e cheguei ao hotel. Dei uma rápida espiada para trás antes de cruzar a porta. Enquanto meus olhos se acostumavam à luz mais amena do lobby, avistei um homem sentado ao bar. Ele observava o tumulto do lado de fora, impassível, como se assistisse a uma parada militar.

Cabelos escuros, pele bronzeada. Magro, porém forte, como um pugilista. Simplesmente lindo. Executivo americano em viagem, supus. Ou talvez um turista. Usava um guia de turismo — com algumas páginas marcadas — como apoio para o copo.

Foi a primeira vez que deitei os olhos sobre Alfonso. E naquele instante cheguei a pensar que jamais seria capaz de olhar para outra direção.

Um mensageiro do hotel contava-lhe a novidade do assassinato.

— A polícia está recolhendo os turistas desacompanhados — alertou o jovem em espanhol.

Nunca entendi direito por que eles fizeram isso. Talvez fosse alguma coisa que aprenderam nos filmes americanos.

— O senhor está sozinho? — perguntou o mensageiro a Alfonso. Ele respondeu que sim com a cabeça.

A melhor notícia do dia.

Alfonso sentiu o meu olhar, pois levantou os olhos naquele mesmo instante. E eu perdi o fôlego. Ele tinha olhos impossivelmente verdes. Olhos nos quais uma mulher poderia facilmente se perder.

Já havia cumprido minha agenda do dia e portanto achei que não haveria mal algum em me perder um pouquinho. Dei um passo na direção dele. Foi então que um capitão da polícia irrompeu no bar e arrumou a festa, recolhendo suspeitos e intimidando todos os
demais.

Por um simples capricho poderia nos arrastar para a cadeia, e ninguém jamais teria notícias nossas outra vez. Meu coração veio à boca quando o policial notou minha presença. Olhou-me da cabeça aos pés, tirou suas conclusões e olhou para Alfonso.

— Vocês dois estão juntos? — perguntou.

Nossos olhos se encontraram. E... foi o que bastou. Uma troca de olhares — um refúgio no meio daquela confusão sanguinolenta —, e Alfonso e eu ficamos juntos. Apertou-me a cintura como se tivesse esperado por mim a tarde inteira. Dei-lhe um abraço carinhoso e puxei-o em direção às escadas.

O policial deu uma olhada invejosa e seguiu em frente — iria aterrorizar outros inocentes pelo caminho. Apertei a mão de Alfonso enquanto continuávamos descendo.

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