< Innamabel Gertsner >
Innamabel aproximava-se das vozes que clamavam em sua cabeça por sua saída daquele hórrido lugar.
Ela ergueu-se do banco onde se encontrava, olhou para a porta de madeira a frente daquele singelo templo com cerca de três acomodações e lugares dispostos frente uns aos outros e se precipitou naquela direção, distante o suficiente para que deixasse de sentir o peso do próprio corpo, a textura da pele, o calor da saliva em sua boca. Seus olhos estavam paralisados, talvez em agonia, imersos nos gritos que escutava como se fossem um dito em seus ouvidos, nos terrores que assistia e nas faces blasfemas que a inspiravam e a guiavam um passo por vez, um centímetro por vez, buscando sentido a sua caminhada através de um longo corredor que poria fim a suas descobertas em Agamir, o mundo dos vivos, e a levaria a Gallir, o mundo dos espíritos.
As respostas as suas indagações estavam aquém daquelas portas, respostas que fuçavam seu amago como agarras acariciando-lhe com suavidade.
Mas o torpor passou quando algo a tocou no ombro e a despertou com um suspiro engasgado. Ela virou e vislumbrou a face da nova amiga, Dália.
— Ia sair? Seu toucado ainda não está pronto!
E então a mulher olhou para trás, percebendo a distância que havia percorrido desde a luz da fresta do telhado quebrado que ficava sobre o altar central até próximo da porta, onde vislumbrou as molduras e se perguntou o que fazia, sabendo que seria calcinada se saísse sem suas vestes apropriadas.
— Eu... eu não sei.
— O que se sucede aqui? — a mentora Gertruida surgiu doutra sala, se achegando as mais jovens.
— Eu preciso de respostas, senhora Gertruida. Tão breve quanto minha sanidade ainda permite. Há uma voz aqui, na minha cabeça, ela me diz que eu devo me vingar, verter sangue, trazer tortura e sofrimento para que possa ter paz e morte, mas eu nunca quis isso!
Dália acariciou-lhe os ombros e a levou de volta a senhora.
— Parte de sua adaptação se dá através do repudio a loucura e as intenções perversas que alimentam seu desejo por almas e pelo justo retorno. Se as vozes que ressoam em sua mente pedem por isso, mesmo que você nunca tenha sentido tal vontade, isso implica que a conclusão de sua saga envolva dor e sofrimento.
— Por que eu precisaria causar mais dor e sofrimento? Certamente se morri, já causei dor suficiente aos que me amavam. Arranquei a cabeça de duas inocentes pessoas que sequer conhecia na noite de ontem... não quero ter que fazer aquilo novamente. Não quero ter que fazer aquilo nunca mais!
— Você se lembra qual moléstia a acometeu?
Ela balançou a cabeça em negação.
— Não... não lembro. Lembro apenas que nada tinha, nada sofria, dispunha de boa saúde mesmo com o advento da praga.
— Dália... leve-a pelo vilarejo e refaça seus últimos passos. Innamabel, Dália mediará suas transformações mais profundas através de conselhos e eu prometo ensina-la a controlar o que há de pior nos sentimentos dos homens; a sede de vingança e a loucura que provem dessa sede. Cuidem-se para que não sejam flagradas. Ficarei a observar quaisquer novos avanços.
— Sim, Gertruida. Vamos, Inna. Posso te chamar de Inna, não é?
Ela sorriu de forma afetada.
— Certamente.
Dália ofertou-lhe um pedaço rejeitado da manufatura de seu toucado que Innamabel usou como um lenço ao redor do braço esquerdo, e ao sair, a primeira coisa que fez foi tapar as vistas e o rosto com a luz que ardia sobre sua cabeça como uma fonte venenosa de energia atribuladora a sua qualidade enquanto criatura da noite. Mal pode se concentrar no caminho porquanto a branquitude e a dificuldade de adaptação praticamente a cegaram por todo o caminho que deviam traçar até onde, lembrava ela, devia ser o lar de sua família.
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Sirus: Os Outros Vampiros (Vencedor #TheWattys2020)
Vampiri[VENCEDOR DO PRÊMIO #THEWATTYS2020 EM PARANORMAL!] Infeliz em vida e atormentada na morte, Innamabel Gertsner reencarnou, trazida por forças das trevas, após o seu fim precoce e misterioso que pode estar ligado a desavença com os homens da sua vida...