[39] O PRINCIPE

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< Os dois príncipes honrados >

No princípio, as trevas reinavam como um.

No começo, as calamidades e a loucura tinham lugar de direito sobre tudo e sobre o nada que ali havia. Então, a luz se erguia e seu portador era forte, invencível, imparável. Durante seis dias ele trabalhou com afinco e no sétimo, teve o merecido descanso.

A partir daquele momento, as trevas haviam perdido seu reino para a luz que era boa e acolhedora, mas não o seu domínio sobre as forças primordiais; entropia e caos. Ela continuava, com mãos de ferro, imersa no vazio, com os olhos fechados para a realidade, esperando para que o dia chegasse e as portas se abrissem para que a o preto suplantasse o branco e o branco fosse extinto, mergulhando em cinza para então retomar ao preto.

O preto representava a morte e a insanidade, a guerra travada contra a vida para que a morte vencesse no fim das contas. Quando sobre o domínio da morte, vida alguma perseverava.

E, à medida em aquele dia negro acentuou-se sobre a terra, arrastou-se através de outras terras. Horas afinco, as trevas rastejavam como um véu de morte sobre toda a vida que havia abaixo; plantas, animais, homens, tudo era consumido, tudo era transformado pelas incertezas do que havia após isso — a morte, a loucura ou a servidão compulsória dos mais fortes.

Cidade após cidade, reino após reino, metade das províncias já haviam consumidas pelo dia em que as trevas perseveraram, transformando a luz em trevas e a vida, em morte. Ela era silenciosa, perspicaz e certeira quanto quem atingia e a quem ela pertencia no momento em que se arrastava cada vez mais, esfomeada e incisiva.

Eram os dedos apontados ao céu para aquela densa nuvem que chegava, cobrindo pastos, lavouras, fazendas e campos; tudo morria por onde ela passava ou era entregue a loucura. Chapéus eram levados pelo vento, sangue gotejava sobre lençóis e pelas ruas, enquanto o exército da morte crescia e marchava, a passos desengonçados através da terra, rumo ao sul.

Seus príncipes, no entanto, galopavam o céu, montados nas trevas e na obsessão pela conquista, pelo poder, pelos reinos que levaram séculos para que se erguessem e que agora caiam diante do fogo e da desgraça que recaia sobre ela.

Nunca antes houve terror maior. Nem mesmo o advento da peste em várias daquelas terras puderam ser comedidos a aquele avanço célere.

E a princesa sorria, de mãos dadas ao príncipe untuoso que seguia o galope das sombras enquanto avançavam sobre a cidade fortificada de Roma, rumo ao centro da crença ocidental em um Deus que as trevas venceu naquele dia.

Os estados papais não tinham a menor chance contra aqueles guerreiros que não carregavam espadas, e sim, a praga.

Juntos, quando entraram na grande cidade de arquitetura barroca — construções pitorescas, casarões enfeitados, templos monumentais e colunas de barro —, seguiram por uma longa avenida movimentada que os deixou frente a uma conhecida praça; a praça de São Pedro, onde também vislumbraram a Basílica de São Pedro e os reverenciaram por sua beleza inegável.

Um espaço cercado por palácios apostólicos romanos e uma maravilha arquitetônica de vários andares com uma cúpula ovalada metros acima da construção que também contava com uma parede sustentada por diversos pilares onde eles eram observados por ídolos de barro; anjos, santos, mártires e homenagens aos Santos Padres anteriores.

Eles pararam diante da construção e marcharam no sentido oposto da população que corria para onde conseguia, mas que rapidamente era cercada pela nevoa que também havia profanado aquele lugar santo para tantos fieis e sobre qual tanto sangue derramado fora construída.

Sirus: Os Outros Vampiros (Vencedor #TheWattys2020)Onde histórias criam vida. Descubra agora