Capítulo 9

3K 417 82
                                    

Cassian estava no jeito que eu lembrava. Os cabelos escuros na altura dos ombros, as asas membranosas enormes, a feição extremamente marcante, como se tivesse sido feito pelo fogo e terra. Os olhos cor de avelã estavam profundos e perdidos enquanto o guerreiro me analisava sentando lentamente ao meu lado, após ter me colocado no sofá.

O sofá afundou ao meu lado mediante o peso do macho. O mestre espião ficara encostado a janela rodeado pelas sombras, como se a qualquer momento fosse desaparecer.

Não conseguia descrever o clima que pairava sobre a sala. Havia muitas coisas a serem ditas, perguntas demais a serem proferidas, mas parecia que o que não havia demais era coragem para qualquer um sequer falar naquele momento.

A lenha crepitando na lareira era o único ruído que era possível ouvir no cômodo. Os illyrianos pareciam que não estavam nem respirando enquanto me olhavam. Dúvida, receio e desconfiança estavam presente nas marcantes orbitas amendoadas.

— Vou pegar algo para você. — Cassian finalmente disse quebrando aquele maldito silencio.

Analisei as costas do macho enquanto ele ia em direção a cozinha.

Quando era pequena minha mãe tinha me contado a história de Cassian. O filho bastardo de uma lavadeira que fora jogado no acampamento assim que aprendeu a andar. Como era bastardo não havia recebido nenhuma ajuda, e precisou arranjar por si só roupas, abrigo e alimento.

Quando Rhysand fora para o mesmo acampamento, por obra do destino ou do caldeirão, viu Cassian atravessando a lama para chegar as barracas fora do acampamento e o ofereceu ajuda, levando para a casa onde ele e minha mãe estavam morando. E mesmo recebendo abrigo e ajuda de Rhys, Cassian o surrava sempre que possível, o que me fez gostar instantaneamente do macho sem ao menos o conhecer.

Anos depois, em uma das visitas que fazíamos a Rhys no acampamento, conheci Cassian. E ele era tudo aquilo que já tinham me falado, e mais.

Extremamente poderoso e lindo.

Eu era nova e com os hormônios a flor da pele, e quando coloquei os olhos no illyriano pela primeira vez quase entrei em combustão. Mas havia limites que não se deve ultrapassar, e definitivamente um dos melhores amigos do meu irmão era um desses. E por fim nos conhecemos e nos tornamos amigos. Ele possuía um senso de humor incorrigível, mesmo depois de tudo o que lhe acontecera, não deixou que abalasse o seu espirito livre. Fora preciso apenas momentos para gostar, para amar Cassian e o havia tornado um dos meus amigos.

E com todas essas lembranças na mente um estalo me ocorreu.

— Você era o outro. — Disse me virando para o mestre espião. — Azriel. É claro, como não encaixei as peças? — A pergunta era mais para mim do que para ele.

Eu sabia que havia outro garoto que chegou no acampamento tempos depois que Rhys e Cassian se conheceram, e por causa dele tinham se tornado amigos. Ele era tão poderoso quantos os outros. E algo que nunca tinha esquecido da sua história era que o menino não sabia voar.

Quando ouvi pela primeira vez, pensei que fosse só para me assustar por algumas vezes escapar pela noite para voar livremente pelo céu noturno. Mas anos depois realmente soube que haviam lhe impedido de usufruir daquele maravilhoso e insubstituível que a raça illyriana possuía.

E apesar de saber sua história, nunca o havia encontrado antes.

— Como é possível que nunca tenhamos nos esbarrado antes? — Perguntei o encarando. A profundidade daqueles olhos fez com que um arrepio passasse por minha espinha.

— Porque mentiu? — Foi a única coisa que disse, sem sequer uma alteração na expressão dura.

— Teria acreditado? Teria acreditado se eu tivesse contado? — Sem resposta.

Corte de sombras e esperançaOnde histórias criam vida. Descubra agora