— Deise, acalme-se e me conte exatamente o que aconteceu.
Sunahara ajudo-a a se sentar, enquanto eu me contorcia para tentar ficar de pé. Fiquei tão nervosa que não aguentei ficar parada no mesmo lugar. Deise deixou-se cair em uma raiz e esforçou-se para se acalmar e falar.
— N-Nós estávamos colhendo as folhas para a perna de Anabel quando uma... coisa saltou de uma árvore e me agarrou. Era grande, maior que um homem e tinha... asas. Lily tentou me ajudar, mas aparentemente ela não conseguia controlar aquele mórfico, então saltou sobre ele começou a socá-lo.
— Ela tinha uma faca — comentei. — Por que não a usou?
— Sabe, como ela é com mórficos, prefere não machucá-los a menos que não tenha escolha.
Suna estava certa, Lilyan já tinha comentado sobre a ligação que mantinha toda vez que entrava na cabeça de um mórfico. Deise continuou:
— O bicho me soltou, mas pegou Lily pela cintura e voou para as árvores. Tentei derrubá-lo com tiros, eu juro que tentei.
— Tudo bem, Deise. — Suna levantou-se. — Eu vou atrás dela.
Se um titã tinha levado Lily eu não sabia ao certo, mas algo em mim dizia que ela ainda estava viva. Eu prometi que ninguém ficaria para trás.
— Deise, fique com Anabel e aplique o remédio. Me esperem aqui até eu voltar se eu não voltar até o anoitecer vocês continuam sozinhas.
— Nada disso! — Eu berrei. — Não vamos nos separar.
— Vamos, sim. Não podemos é ficar paradas por muito tempo, estamos sendo caçadas. As naves do Diretor podem aparecer aqui a qualquer momento. Vou achar Lily e alcançar vocês depois.
O capacete de Suna não tinha o mapa. Ela pretendia guiar-se apenas pela memória. Lembrei que Olho no Céu poderia entrar em contato com ela quando anoitecesse e desejei que o capacete de Lily não tivesse sido danificado na queda. Só me restou concordar com Suna. Ela era a mais forte entre nós e mais experiente também, se alguém era capaz de andar sozinha por aquela floresta e sobreviver era ela.
Ela não perdeu mais tempo com explicações e disparou mata adentro com o fuzil em mãos. Era nosso segundo dia ali fora e as coisas estavam começando a desandar, mas ninguém achou que seria fácil.
Eu me sentei de novo. Deise, com as mãos trêmulas, tirou a mochila das costas e procurou um punhado de folhas redondas e azuladas. Aquilo, supostamente, deveria curar a inflamação da minha perna.
— Fica calma — eu disse, enquanto ela enfileirava as folhas na minha coxa. — Vamos achá-la. Não é qualquer mórfico que vai derrotar nossa Lily.
— Eu deveria ter feito alguma coisa — ela lamentou. — Quando atirei a criatura já estava voando alto e eu fiquei com medo de acertá-la e Lily cair. Acho que errei de propósito e agora ela pode estar morta.
Não soube o que dizer. Deise era uma boa atiradora, talvez ela pudesse mesmo ter acertado o mórfico, mas e depois? E se Lily morresse na queda por causa dessa decisão? Era uma situação difícil. Entretanto, ainda haviam chances de Lily estar viva, não poderíamos esquecer do fato de que ela era uma domadora, não desistiria tão facilmente.
Deise tirou as luvas e colocou as mãos sobre as tiras de folhas na minha perna e com um suspiro de concentração disse:
— Vai esquentar um pouco antes de esfriar. A planta reage ao calor e libera um gel para controlar a temperatura. Isso vai ajudar a diminuir o inchaço.
Seus dedos apertavam de leve minha pele e começaram a esquentar como se ela tivesse acabado de tocar em algo quente. Não chegou a me queimar, mas eu me encolhi e fechei os olhos. O calor, entretanto, durou apenas alguns segundos. Logo as folhas murcharam e expeliram uma gosma sem cor realmente muito gelada, uma defesa daquela planta estranha à temperatura. Deise pareceu aliviada por ter dado certo.
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Os Dons do M
Science FictionAnabel Luz de Castro é uma universitária rica, inteligente e bem sucedida em sua vida independente. Cresceu cerdada de tudo o que precisava e mais. Tendo como pai um dos mais influentes e adorados estudiosos da nanotecnologia, que salvou a humanidad...