Prelúdio às Visões

Margem das Margens

Sou o marginal dos marginais,
O pária dos párias…
 
Porque muitas vezes tive que calar,
Aderi a mordaça de um silêncio perene…
Nunca fui bom demais 
Para falar na altura dos que dizem verdades…
Apenas quis um canto sossegado para enconder-me 
Onde suas vozes não chegassem…
 
O estranho, que era posto de lado,
Tão a margem que ficava o tempo todo de fora…
 
E lá fora havia tantos como eu,
Tidos por loucos,
Tidos por crípticos, lunáticos e mágicos,
Que viviam no impulso dos próprios sentidos…
 
Andávamos solitários na bruma,
Dançávamos na chuva.
Toda a alegria era recusa
E não havia nenhuma busca.
 
Mas essa não era minha estrada,
No mundo dos loucos não havia nada.
 
E também eles
Riam de meu riso tímido, 
Da minha mordaça,
E da minha fala entrecortada de abismos…
E eles riam porque eram de riso,
Eram loucos e fiéis a sua loucura…
 
E eu era fiel apenas a minha busca!
 
E eu estava à margem deles também
E meu riso era sóbrio,
E meu riso era lúcido.
 
Caí para margem da margens,
Para as coisas etéreas e voláteis,
Sempre sempre esquecido…
E quando me deparava com um velho conhecido…
Esse já se não lembrava
E meu cumprimento sequer era respondido…
 
E quando alguém 
Tinha por bem que eu voltasse ao mundo…
E me introduzia numa conversa 
Ou falava a alguma moçoila de meu suposto interesse,
A recusa dela vinha com esgar de repulsa. 
 
Apresentavam-me como louco
E minha aparência só confirmava.
Acostumei de parecer-me com eles.
Tinham-me por ébrio,
Tinham-me por drogado,
Tinham-me por quem não era afeito ao trabalho. 
 
Mas eu trabalhava à margem da margens
Na minha própria busca,
Para onde seus olhos débeis
Não conseguiam ver nada nos pontos cegos
De dimensões incompreensíveis 
E demasiado interiores. 
 
E quando pude andar no meio de seu tumulto,
Eu era demasiado translúcido para que me vissem…
E e eu não me importava.
Na minha invisibilidade, eu enfim via tudo.
 
Na margem de todas as margens,
Eu encontrei a Verdade.