Capítulo 4

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Felina

Eu me sentia melhor de certa forma, depois de fazer as pazes com a Adora. Não sei ao certo o que me motivou a isso, tirando o sonho. Normalmente eu tenho pesadelos vividos, nos quais eu estou sozinha e abandonada, todo mundo aparece para me lembrar de como eu nunca sou suficiente. Entretanto, uma noite depois da briga, meu pesadelo repetitivo mudou. Eu acordei dentro do sonho e minha Adora, aquela de 15 anos, não tinha ido embora e ela falava que sempre estaria comigo. Essa bobagem de sonho fez eu repensar se não deveria dar uma segunda chance para a Adora.

Agora, minha guarda não precisava mais ficar 100% armada o tempo todo. Nossas conversas também se tornaram mais abrangentes, nunca sobre sentimentos ou vida pessoal. Normalmente, sobre bobagens como notícias ou dever de casa.

A Páscoa seria naquele fim de semana, não que eu me importasse muito. Eu não tinha atenção em casa, quem dirá religião, as únicas vezes que ganhei ovo foram durante o tempo que eu passei na casa da Adora.

Me lembro de comprar ovo para ela e seu irmão, enquanto ele ainda morava lá, os pais delas escondiam e a gente procurava no jardim. O Adam sempre achava primeiro, mas não deixava de ser divertido. Não me lembro exatamente quando chegamos naquela fase chata de isso é coisa de criança e paramos de fazer isso, se eu pudesse voltar no tempo faria até hoje. Como a família da Adora era católica, não estilo casa cheia de cruzes e família tradicional acima de tudo. Eles não eram "praticantes", mas seguiam algumas tradições, como comer peixe nessa data.

- Adora, a gente precisa comer bacalhau na sexta? - Reclamei ainda na quarta, nunca fui muito fã dessa comida.

- Não, mas seria melhor não comer carne de boi, a gente podia pedir um camarão. - Dei de ombros.

- Virou religiosa? - Perguntei.

- Não, acho que nem tenho religião direito. Nunca parei muito para pensar no assunto. - Murmurou. - Você vai pagar o camarão.

- Por que eu? - Fiz birra no sofá em que estava sentada.

- Primeiro, você é burguesa, segundo eu comprei um ovo gourmet para gente. - Fiz um "hmm" em concordância, deixando o assunto morrer.

O resto da semana passou até a sexta, quando teríamos camarão, eu simplesmente amo essa comida em um nível um pouco extremo. Então, fiquei muito ansiosa desde meio-dia para comer, a Adora percebendo isso tentou me distrair.

- Vamos ver uma série, relaxa alguma hora vai chegar.

- Não fale assim do meu camarão, ele tem que estar aqui agora. Eu vou surtar, tem meses que eu não como camarão. - Protestei.

- Você nunca muda, Felina. - Fez um riso de canto de boca. Algo me incomoda quando ela me lembra do passado é como se tivesse esfregando na minha cara que eu era melhor naquela época.

Me retrai um pouco, olhando para o interfone. Exatamente 13 horas ele toca, indicando que a comida chegou. Botei a máscara que a Adora me deu, calcei minha havaiana que estava do lado de fora e desci. Paguei pela refeição e quando eu subi Adora já tinha posto a mesa.

Botei a sacola no balcão da cozinha passando álcool 70⁰ nele, antes de abrir e levar para a mesa. Depois, lavei as mãos, já esperando meu camarão. Nem tive tempo de conversar, só comi, repeti quatro vezes o prato, parei quando senti que iria explodir.

- Você lava a louça, Adora. - Resmuguei, me deitando no sofá para fazer a digestão. - Eu paguei o almoço, faz a gentileza.

Ela não pareceu gostar muito da resposta, mas o fez mesmo assim.

- Vamos ver um filme. - Minha colega de quarto, disse quando terminou de lavar a louça

- Pode ser. - Dei de ombros, encolhendo as pernas para ela se sentar.

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