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-Então, você precisa falar com o seu pai – diz Theo enquanto me joga um suco

verde da geladeira, antes de irmos para a escola.

Passei a gostar dessas poções, ainda que não tenha virado fanática por sucos e
não os tenha adotado como estilo de vida. Diferentemente do Theo, ainda preciso
de comida, motivo pelo qual isso não é o meu café da manhã, mas um aperitivo.

– Por quê?

Estamos sozinhos na cozinha enorme, as únicas pessoas em casa. A Rachel e

o meu pai saíram há horas. A Rachel faz pilates antes de trabalhar e o meu pai
está no turno da manhã. Logo ele vai fazer a prova e ser promovido para o posto
que ocupava em Chicago.

– Porque ele é o seu pai.

– E daí?

– Quantos anos você tem?

– Quem está falando isso é o Sr. Chilique?

Theo deixou mesmo uma mancha de molho shoyu na cadeira de jantar
quando jogou o garfo. Não importa: ela está sendo estofada de novo.

– Uma vez, garota. Não lido bem com mudanças.

– Por que você se importa comigo e o meu pai?

Tomo um gole de suco, imagino-o limpando as minhas entranhas, como um
desinfetante de intestino.

– Você está trazendo energia negativa pra esta casa. Não precisamos de mais
um vodu pra cima da gente.

– Falo sério.

– Você não sabe o dia de amanhã. Quanto tempo eles vão durar juntos. Só é
possível ter dois pais, e nós só temos um. É melhor sermos bons com eles
enquanto podemos.

Theo pega uma colher de pau e batuca na bancada. Ele tem ritmo. Me
pergunto se existe algo em que ele não seja bom.

– Quem se importa...

– Sério, você está começando a parecer um de nós, um moleque do Wood
Valley.

– Ótimo.

Claro, o Theo está certo, como a Dinah estava. Preciso ser melhor, mais forte, mais corajosa. Uma ninja, mas não de verdade, já que precisamos conversar, e
não lutar.

– Ótimo o quê?

– Ótimo, vou falar com ele.

– Que bom! Fico feliz por termos tido essa conversa.

Ele aperta o meu queixo, como se estivéssemos na década de 1950 e eu fosse
o filho dele que tivesse feito pontos num jogo da liga infantil.

– Você é um ser humano ridículo, sabia? – digo.

– Já fui chamado de coisas piores.

Eu: Ótimo. Vamos conversar. Usar o Theo foi uma bela jogada.

Pai: Não usei o Theo, mas fico feliz por querer falar. Isso tem sido uma

TORTURA. SINTO A SUA FALTA.

Eu: Agora você é que está sendo meio melodramático.

Pai: Li um livro sobre criação de filhos, esperando que pudesse ajudar. Uma

bela porcaria.

Eu: O que dizia?

Pai: Para dar espaço a você.

Eu: Humm. Provavelmente não levou em conta o tamanho da casa.

Pai: Quando podemos conversar? Onde?

E a coisa chegou a esse ponto: o meu pai e eu precisamos marcar a nossa
conversa. Eu me lembro de como as coisas eram normais entre nós. Não
somente normais, mas naturais. Antes, sabe, antes, a minha mãe fazia o jantar

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