capítulo 10

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Dia 15: melhor, pior e talvez melhor.

O sol ainda brilha com objetividade e
claridade implacáveis. Os meus colegas de turma ainda são arrumadinhos e de algum modo as garotas ainda parecem mais maduras do que eu, mais confiantes.
Como se 16 anos fossem mais aqui do que no lugar de onde eu venho.
A humilhação começa cedo, na aula. Meu Deus, penso. Vamos acabar logo
com isso. Talvez eu seja mesmo filha do meu pai, afinal de contas. Uma otimista.

– A marca Gap é tão pleb, né? – comenta Gem com a sua gêmea prodígio, claro que em referência aos meus jeans, mesmo eu não tendo ideia do que ela quer dizer.
Será que é abreviação de "plebeia" e isso significa que a minha calça é de
gente pobre? Bom, é, é sim. Assim como as calcinhas de supermercado, que estou tentada a baixar para essa vaca entender que estou cagando e andando para ela.

A raiva aguça a minha vontade, me faz querer avançar, em vez de recuar.
Não vou enfrentar essas garotas. Não sou forte o suficiente para isso. Mas vou procurar Allysson, que está sentada ao meu lado, porque, dane-se, não há momento melhor do que este para conseguir uma aliada. Ignoro o rubor no meu rosto, me recuso a me virar para ver se a batgirl escutou alguma coisa e finjo que não noto que alguém estava falando de mim.

– Gosto dos seus óculos – digo, em um volume um pouco mais alto do que o
de um sussurro.

Allysson pisca algumas vezes, como se estivesse se decidindo a meu
respeito, e depois sorri.

– Obrigada. Comprei pela internet, por isso fiquei meio nervosa enquanto não chegavam.

Há alguma coisa na voz dela, discreta como a minha, que é convidativa. Não
é explicitamente volumosa nem aquela voz de adolescente que todas as outras parecem usar para chamar atenção. Ela tem cabelo castanho, preso num coque que parece propositalmente desgrenhado, olhos castanhos delineados com lápis preto e lábios pintados com batom vermelho-vivo. Bonita no geral, com o resultado sendo, de algum modo, bem maior do que a soma das partes.

– Gosta mesmo deles?

– Gosto. São da Warby Parker, né? Eles fazem uns negócios bem legais.

Ouço a Gem e a Crystal darem risinhos à minha frente, talvez porque eu tinha usado a palavra "legais". Dane-se.

– É. – Ela sorri e me dá um olhar tipo ignore as duas. – Vacas – diz sem emitir som.

Sorrio e digo de volta, igualmente sem som: – Também acho.

Depois da aula crio coragem para dizer a Batgirl que teremos que desfazer a dupla, já que não estou disposta a correr o risco de violar o código de honra do Wood Valley só porque ela não sabe lidar com outras pessoas. Estou me sentindo
uma guerreira, poderosa por ter me apresentado a Allysson e não ter me
encolhido diante do esquadrão de vagabas louras. Ou talvez porque, pela primeira vez desde que me mudei para Los Angeles, comi algo diferente de creme de amendoim com torrada no café da manhã. De qualquer modo, estarei imune ao vodu de garota bonitinha da Batgirl.
Não faz o meu tipo, repito para mim mesma logo antes de ir até o lugar em
que ela fica sempre, perto do Karrinho de Kafé.
Não faz o meu tipo, repito para mim mesma quando a vejo em toda a sua
glória preta e azul.
Não faz o meu tipo mesmo, digo mais uma vez quando por acaso tenho que
esperar na fila atrás de um grupo de cinco garotas que andam como leoas; uma é a líder óbvia, as outras são as suas lacaias vestidas de modo semelhante. Todas do tipo capaz de esfolar você viva e chupar os seus ossos.

– Lauren, você vai no sábado, né? – diz a líder, uma garota chamada Heather, nem um pouco consternada com o abraço superficial da Batgirl ou o fato de ela continuar olhando para o livro que está lendo.

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