SOZINHA

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Sinto o abraço do Henrique me envolver carinhosamente, enquanto sua boca se aproxima e sussurra no meu ouvido:

-Promete pra mim que nunca vai esquecer o quanto eu amo você?

Sorrio e me aninho no seu abraço, mas como em um passe de mágica, somos transportados para um quarto onde ele, em vez de me abraçar, agora está deitado sobre a Dayana e a beija fervorosamente. Eu grito, enquanto varias lágrimas escorrem pelo meu rosto, mas parece que nenhum dos dois me escuta e continuam absortos em se satisfazerem.

Me encolho no chão, enquanto tapo meus ouvidos e fecho os olhos com força, desejando do fundo da minha alma, sair desse pesadelo.

Mocinha? Mocinha? - abro meus olhos devagar e encontro o motorista me encarando preocupado - chegamos, você está bem?

Seco minhas lagrimas, enquanto me ajeito no banco, repetindo que foi apenas um pesadelo, mas meu coração não se deixa enganar e lateja a dor que pulsa nele.

Está tudo bem - tento parecer o mais normal que consigo - tive um sonho ruim.

Ele me analisa, mas parece acreditar nas minhas palavras, então sorri, se vira e volta para seu assento, enquanto eu recolho minhas coisas e caminho para fora do ônibus.

Estar em casa sempre foi algo especial pra mim, apesar de amar viajar, voltar era o que mais me deixava feliz, mas agora, pela primeira vez na minha vida, estar de volta é doloroso.

-Gatinha - escuto a voz da Mel e me viro na direção que ela veio, me deparando com seu semblante preocupado.

Digo oi e tento soar o menos deplorável possível, mas ela me conhece bem e antes que possa falar ou fazer coisa, sinto-a me abraçar forte e permito o choro sair livre. Ficamos assim por longos minutos, até que eu consiga me recompor e só então ela me encara, passa a mão no meu rosto e me pergunta como estou.

-Ai, amiga, to isso aqui que você está vendo - respiro fundo - um caco.

- Quer ajuda com a mochila, Ly? - olho instintivamente para o lado e encontro o Felipe me encarando um pouco assustado.

Até esse segundo não o havia notado e isso só me faz constatar que estou mais dispersa do que imaginei. Entrego minha mochila e ele me abraça forte, me fazendo sentir acolhida mais uma vez.

- Obrigada, Fe - digo e encaro os dois, que parecem muito preocupados - vamos?

Caminhamos até o estacionamento e apesar de ainda me sentir péssima, tê-los aqui me deu força para suportar tudo isso de forma menos pior. Durante o trajeto até em casa, ambos ficam em silêncio e eu apenas consigo divagar em como vou resolver essa bagunça toda. Penso na Lulu, em como isso vai afeta-la e me sinto uma péssima mãe, por não perceber onde estava nos enfiando. Mais lágrimas começam a escapar dos meus olhos, quando penso em quão difícil será entrar no meu apartamento, com a montanha de lembranças que me aguardam la. Lembro do João, de como fiquei quando cheguei em casa sozinha, depois que ele se foi e tudo era absurdamente doloroso como agora, mas não tivemos como evitar. Os dias eram incrivelmente longos e pareciam tão vazios, exceto pela pequena Lucia, que foi a grande razão de não ter me afundado em uma tristeza sem fim.

-Ly? - sinto a mão do Felipe sacudir de leve meu ombro - você não prefere ir pra casa da Mel?

Levo alguns segundos para entender o que ele disse e até penso que talvez essa realmente fosse a melhor opção, mas preciso encarar isso de frente e a melhor forma de fazê-lo, é ir pra casa e lidar com tudo o quanto antes.

-Ta tudo bem, gente! - tento acalmá-los, enquanto seco meu rosto - eu vou ficar bem, só preciso de um tempo e da minha casa.

Os dois se encaram, nada convencidos, mas não dizem nada e eu volto a me encostar na lateral do carro, olhando a paisagem que tanto conheço e que agora parece que vai me engolir. Na verdade, não importa o lugar que eu esteja, nenhum deles me faria sentir menos pior.

RECOMEÇAROnde histórias criam vida. Descubra agora