9. O LABIRINTO E O GATO.

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– O que te fez pensar isso, Hazel? – perguntou John, agora voltando a andar e parecendo mais casual.

Hazel se recompôs, corando um pouco. John realmente tinha uma presença impactante. Talvez fosse isso que alterasse a física ao seu redor.

Pensou um pouco no que responder. Talvez ele fosse um daqueles fãs fervorosos. Bom, o melhor a fazer era concluir seu raciocínio, gostasse ele ou não.

– Bom... Pra começar, essas astros do rock nem devem beber leite no café da manhã – tentou, descontraidamente. – Eles devem beber cerveja com pílulas de cafeína, no mínimo. No geral podem ser gênios na música, mas normalmente são narcisistas demais para se importar com os motivos pelos quais as garotas estão com eles – concluiu.

Quando olhou de volta para John, sondando sua reação, ele parecia... Triste?

Ele pensou um pouco, e por fim, abriu um sorriso descontraído.

– Hazel, você parece tão segura de estar certa sobre isso que eu quase desisti de discordar. Mas agora eu me prometi que, um dia ou outro, vou mudar essa sua ideia ruim sobre astros de rock.

Agora ela riu. Ele realmente era aquele tipo de fã que defende seus ídolos a todo custo.

Seguiram andando e Hazel falou brevemente sobre sua apresentação ao emprego logo depois do almoço, mas preferiu chamar de "entrevista de emprego." John a desejou boa sorte, elogiou o serviço do depósito com seus instrumentos musicais e logo os dois chegaram à porta da cantina.

Convidou-o a juntar-se a ela e seus amigos para almoçar, mas ele titubeou.

– Seus amigos? Eu... Eu adoraria conhecê-los um dia mas eu, bem... Preciso ir encontrar um amigo. Eu já havia combinado com ele, então...

– Ah, não se preocupe, John. Nos vemos por aí, então – despediu-se.

Ele definitivamente tinha uma aura esquisita. Parecia ter picos de bom humor, divertimento, muita curiosidade e interesse no que ela dizia, mas ficava nervoso e desconfortável facilmente com algumas coisas que ela não entendia como poderiam afetá-lo.

Também parecia um pouco galanteador. Talvez fosse seu jeito de ser, mas Hazel sentiu que algo em seus trejeitos denotavam uma atenção que ia além do "amigável". Mas pensar nisso a deixava um pouco nervosa.

Ele era bonito e pelo visto, meio popular até. Mesmo sendo novo por lá também, talvez já estivesse na cidade há mais tempo e tivesse ido a mais festas. E esse provavelmente era o modo como agia com garotas em geral, caras charmosos assim tendem a ser galantes.

Também teve a impressão de que ele estava tentando evitar conhecer seus amigos.

O almoço foi basicamente escutar Lily e Max discutindo sobre o temperamento de Greg Mitchell, o que estava começando a assustá-la.

Max havia informado que, por insistência de Greg, haveria uma entrevista feita por ele mesmo no horário do intervalo dele.

Apesar das duas serem as únicas que estavam sabendo sobre as vagas sobrando e a vontade do Sr. Fred Mitchell era de ceder apenas dois contratos, Greg queria averiguar se as moças eram responsáveis e competentes. Ele também havia reclamado que duas garotas não dariam conta de carregar caixas pesadas e só serviriam para fazer fichamentos e atender ao público.

– Mas que porco machista! – disparou Lily.

– Lily, entenda. Ele ainda não conhece você e o seu dito "incrível porte atlético" – Max zombou.

– Eu aposto que eu e a Hazel carregamos caixas muito mais pesadas do que as dele, certo? – encorajou Lily, olhando para a amiga.

Hazel admitiu que seu condicionamento físico não era dos melhores, que detestava esportes e que suas únicas atividades físicas eram passeios à cavalo na fazenda da família.

Lily insistiu que ela parecia forte pois carregava aqueles livros extra na mochila sem a mínima necessidade. Ela gesticulava bastante enquanto falava e acabou virando seu refrigerante na própria camisa.

– Ah, merda! Temos vinte minutos para a entrevista com o "Sr. Pastel" e a minha blusa está nesse estado. Vou correr até o dormitório para me trocar. Vá na frente Hazel, se ele te entrevistar primeiro talvez nem note que me atrasei.

Hazel seguiu na direção do depósito, que lhe foi previamente indicada em um mapa do campus por Max. Ele não pôde acompanhá-la pois precisava fazer um transporte para o depósito e o caminhão chegaria em poucos minutos, mas a encontraria logo em seguida por lá.

O depósito se localizava além do labirinto de cercas vivas à esquerda da entrada do campus. As duas laterais do labirinto lhe dariam acesso à trilha onde ficavam alguns estabelecimentos comerciais, a biblioteca do curso de Literatura e o depósito. Quando se encaminhou para entrar em uma das laterais, ouviu um som característico.

"Miau."

Será que havia ouvido direito?

"Miau!"

Sim, ouviu outra e outra vez.

Havia algum gato por perto e pelo jeito, era filhote e parecia estar precisando de ajuda.

Olhou para o relógio, faltavam oito minutos para ter que se apresentar ao "Sr. Mitchell", mas o gatinho seguia miando.

– Ah, por favor, gatinho. Apareça! – gritou nervosa.

Ele pareceu responder ao seu chamado, pois miou longamente e seguiu miando, chamando-a. Pelo som, parecia estar dentro do labirinto.

"Droga!" pensou.

Ela havia lido no manual de boas vindas algo sobre o labirinto ser um projeto de um renomado botanista francês que presenteou Vallert com sua construção ao redor de uma fonte um pouco menor que a da entrada, encimada pela estátua de um dos fundadores da universidade montado em um cavalo.

Uma baboseira narcisista de homens ricos de meia idade, basicamente.

Lembrava de Lily ter dito que era fácil aprender o caminho do labirinto, mas era melhor tentar aprendê-lo acompanhada e durante o dia, pois à noite ou desacompanhada era sempre perigoso cair nas garras de algum pervertido.

Naquele momento era difícil escolher se temia mais pelo seu próprio rabo, por seu pretenso novo emprego ou pela vida do pobre gatinho que a chamava desesperadamente.

Hazel resolveu encarar o labirinto.

Andou desbaratada por algum tempo. Passou por alguns casais de amassos, professores fumando cigarro, góticos cochichando em grupos e maconheiros solitários... Era um labirinto bem grande, afinal.

Depois de um tempo ela foi memorizando o padrão, pois cada esquina possuía um busto de pedra diferente que ela diferenciava pela curvatura de seus narizes e formatos de seus bigodes.

Ela apenas encontrou o gatinho quando chegou ao centro. Estava lá: pequeno, magro e brasino, deveria ter seus 2 ou 3 meses de vida. A encarava suplicante.

Animais não eram permitidos nos dormitórios, talvez por isso tenham-no jogado fora daquela maneira. Mas Hazel revoltou-se com a crueldade do ato, pois o bichinho estava acuado, preso no alto do lombo do cavalo da estátua da fonte.

Deveria estar a mais de dois metros do chão. Talvez algum filho-de-uma-égua tenha visto ele perdido pelo labirinto e o colocou na estátua de propósito. Quem se daria o trabalho de escalar aquilo?

Respirou fundo e olhou para o relógio: já estava 5 minutos atrasada para a entrevista.

"Agora já estou aqui", pensou. Não deixaria o pobre gatinho desamparado.

Então entrou na fonte, sentindo a água gelada chegar até seus joelhos.

Sorte a sua que usava, naquele dia, sua saia godê um palmo acima do joelho. Ela escalou a estátua primeiro encaixando seu pé direito na base, depois o esquerdo no joelho do tal de Professor Hans Frollo e logo estava com o gatinho em seus braços.

Foi uma descida difícil com as mãos ocupadas, mas logo estava na porta do depósito, encharcada do joelho para baixo e com um gatinho nas mãos.

Pelo menos agora seus sapatos estavam limpos.

Além das AveleirasOnde histórias criam vida. Descubra agora