Gizelly tinha acordado cedo. Saíra da casa para não acordar Rafaella e estava frustrada por ser incapaz de cozinhar. Finalmente, reconheceu que se sentia agradecida porque no meio de toda aquele embrulho de situações e fatos absurdos, Rafa pudera tocá-la, senti-la e amá-la como a uma mulher em plena posse de sua vida. Estava acontecendo uma série de fenômenos que ela não entenderia nem tentaria entender jamais.
Tudo o que ela vivia e experimentava era ilógico, inexplicável, contrário a todas as bases de sua cultura científica, mas estava acontecendo. E os dois últimos dias havia feito amor com uma mulher, experimentado emoções e sensações desconhecidas para ela, inclusive quando estava viva, quando seu corpo e alma eram um só. O mais importante para ela, conquanto quisesse alçar-se àquela sublime bola de fogo sobre o horizonte, era que aquilo durasse.
Rafaella se levantou pouco depois, a procurou na cama, colocou um casacão e saiu. Tinha o cabelo bagunçado e passou a mão por cima, para ajeitá-lo. Foi até onde ela estava, nas rocas, e a abraçou de surpresa.
- É impressionante - disse.
- Creio que em vista do que não podemos imaginar no futuro, deveríamos fechar a maleta e viver o presente.
- Eu diria que é imprescindível. E você tem razão, vamos fechar as malas e viver o presente.
As duas, a cada hora e momento que passavam juntas curtiam o presente, o local, a companhia uma da outra. Rafaella cuidava do corpo de Gizelly, e ao mesmo alimentava sua alma, com carinho e amor.
A casa recobrava a vida, a presença daquelas mulheres mudou totalmente a atmosfera do local. Como crianças que coloriam, em desenhos animados, procurando não sair dos limites marcados, Rafaella e Gizelly entravam nos cômodos, abriam as janelas, retiravam os lençóis que cobriam os móveis, sacudiam o pó e abriam os armários. E, pouco a pouco, as lembranças da casa, transformavam-se em instantes presentes. A vida voltava a se impor.
Naquela quinta, o céu estava oculto e parecia que o mar queria romper os rochedos que o cercavam, na parte inferior do jardim. Ao final do dia, Gizelly instalou-se e contemplou o espetáculo. A água tornara-se cinza; arrastava pedaços de algas com ramas de espinhos. O céu ficou malva e a seguir, preto. Estava contente, gostava quando a natureza decidia se enfurecer.
Rafaella tinha acabado de arrumar o pequeno salão, a biblioteca e o escritório de sua mãe. No dia seguinte passariam para o andar superior, com seus três dormitórios.
Sentou-se sobre o parapeito da janela e olhou para Gizelly.
- Você sabe que é a nona vez que você troca de roupa desde a hora do almoço?
- Sim. A culpa é dessa revista que você comprou. Não consigo decidir-me, tudo é lindo.
- Sua maneira de comprar me deixa com inveja.
- Pois espere, você não viu o caderno central.
- O que diz o caderno central?
- Nada diz. É dedicado à roupa íntima feminina.
Rafaella presenciou o desfile mais sensual já visto por um ser humano. Mais tarde, envoltas na ternura de um amor satisfeito, o corpo e a alma acalmados, permaneciam abraçadas olhando o mar. Finalmente dormiram, embalados pelo ruído das ondas.
(...)
A detetive Vanessa chegou em Carmel ao anoitecer. Dirigiu-se ao hotel mais próximo. A recepcionista lhe deu as chaves de um grande lugar, com vista para o mar. Acabava de desfazer a mala, quando os primeiros relâmpagos rasgaram o céu; tomou consciência de que morava a três horas e meia de lá e nunca tivera ido ver o mesmo. Nesse instante, sentiu vontade de chamar Clara para compartilhar aquele momento, desistiu e foi dormir, afinal o dia seria longo.
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E Se Fosse Verdade - GiRafa
RomanceGizelly é uma médica empenhada, mas tudo muda após envolver-se em um acidente. Seis meses depois, ela se vê no seu apartamento conhecendo alguém que mudaria a sua vida. Adaptação do livro: E se fosse verdade de Marc Levy com o shipp Girafa (Gizelly...