Areia

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Gizelly acordou ao compasso das marteladas que ecoavam em sua cabeça. As pontadas no pé obrigaram-na a tirar o curativo para comprovar como estava ferida.

- Merda! - disse, ao ver que inflamara -. Só me faltava isto!

Levantou-se, foi ao banheiro, mancando; abriu o armarinho, tirou a tampa da garrafa de antisséptico e colocou no calcanhar. A dor foi tão violenta, que soltou o frasco de álcool e este foi parar dentro da banheira. Ela sabia muito bem que assim nada conseguiria. Tinha que limpar o ferimento em toda sua profundidade e tomar antibióticos. Uma infecção de tal natureza podia ter terríveis consequências. Vestiu-se e chamou um Uber. Não era aconselhável dirigir em tal estado.

Dez minutos mais tarde chegou ao hospital.

- O que você faz aqui? - perguntou Flavia -. Se Thelma a vir...

- Meu pé.. dói horrores.

- Para que você reclame, tem que ser algo sério. Sente-se nesta cadeira de rodas.

- Não precisa exagerar, que cabine está livre?

- A três. E se apresse, estou aqui fazem vinte horas, nem sei como me aguento de pé.

- Você não pode descansar um pouco esta noite?

- Fiz uma pausa de alguns minutos ao amanhecer.

Flavia a fez sentar-se na maca e retirou o curativo para ver o ferimento.

- Como você fez para que infeccionasse tão depressa?

Preparou uma injeção de lidocaína. Enquanto a anestesia local tinha liberado Gizelly da dor, separou as bordas da cicatriz e limpou meticulosamente os tecidos infeccionados. Depois, preparou um novo kit de sutura.

- Você quer que eu faça ou você mesma o faz?

- Melhor você, mas primeiro faça-me uma drenagem, não quero correr qualquer risco.

- Sinto, mas vai ficar uma grande cicatriz.

- Uma a mais não faz mal.

Enquanto a enfermeira trabalhava, Gizelly pegou o lençol com os dedos. Quando Flavia lhe deu as costas, aproveitou para fazer-lhe uma pergunta que ardia em seus lábios.

- Como ela está?

- Acordou em plena forma. Esteve, a ponto de morrer durante a noite e a única coisa que lhe interessa saber é quando poderá sair daqui. Juro a você que neste serviço vemos de tudo!

- Não aperte muito o curativo.

- Estou fazendo o que posso, e proíbo-a de subir ao andar onde ela está.

- E se eu me perder nos corredores?

- Gizelly, não faça tolices! Você está brincando com fogo. Faltam apenas poucos meses para acabar o internato, não coloque tudo a perder, agora.

- Pensei muito nela, esta noite, e de uma forma bem estranha.

- Muito bem, pois continue pensando esta semana e você a verá no próximo domingo. A princípio, ela terá alta no sábado. Contrariamente a sua fantasma da Ópera, tem uma identidade, um endereço e um telefone. Se você quiser voltar a vê-la, chame-a quando ela sair.

- É a minha pessoa - replicou Gizelly com voz tímida.

Flavia levantou seu queixo e a olhou, enternecida.

- Diga-me uma coisa: você não está sofrendo um derrame sentimental? Nunca ouvi você pronunciar palavras tão doces.

Gizelly tirou a mão de Flavia.

E Se Fosse Verdade - GiRafaOnde histórias criam vida. Descubra agora