Prólogo

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Presente
Rafa Kalimann


"O futuro é o lar dos nossos medos mais profundos e das nossas maiores esperanças. Mas uma coisa é certa: quando ele finalmente se revela, nunca é como imaginamos."

Já ouviu falar que o vazio pode ocupar um espaço imenso dentro da gente? Eu precisei sentir pra saber, só não imaginei que me sentiría assim pela ausência dela.

Queria dizer que sinto saudades da Rafa de antes, se eu ainda fosse daquele jeito sofreria menos, lidaria melhor com toda essa tormenta, mas não sobra saudade pra sentir de mim quando já sinto tanta saudade dela. Dos seus carinhos, dos seus sorrisos, do seu jeito doce de me olhar. Sinto saudade de me sentir acolhida, saudade do meu lar.

Sempre critiquei as pessoas que lidam com a situação de perder quem se ama nutrindo sentimentos ruins, mas acho que as entendo um pouco agora. Deve ser mais fácil sentir raiva e querer algum tipo de vingança do que só sentir esse vazio e assumir para si mesma que tem alguma coisa muito triste acontecendo em seu coração e não há nada que se possa fazer além de sofrer e viver o luto vendo quem amamos bem vivo, saudável, escolhendo ser feliz longe da gente.

Se não fosse pela estadia dela na minha vida eu talvez pudesse ter me transformado numa dessas pessoas que tentam se enganar pra não sofrer tanto com o desamor, acho que de certa forma eu já fui essa pessoa mesmo sem saber, mas tudo que tenho feito diante da perda é passar grande parte dos meus dias pensando em algum plano mirabolante e patético para tê-la ao meu lado de novo, para não precisar mais controlar essa necessidade tão visceral de ligar e falar que eu a amo, essa súbita maluquice de achar que ela pode voltar se eu publicar no Instagram uma declaração de amor dizendo o quanto a quero aqui.

A falta da presença dela me dói, muito, e nenhum remédio consegue aliviar o que é viver sem ela. A presença da sua ausência tem sido um fantasma, assombrando e paralisando a mim, a minha vida, a vida da minha família.

Aqui, sentada no sofá da minha sala enquanto eles me observam o tempo inteiro tentando disfarçar a nítida preocupação e curiosidade, eu me percebo surpreendentemente deslocada. Nunca imaginei que isso seria possível estando com eles, mas todos me analisam, eles querem respostas quando eu só tenho perguntas. Eles não precisam falar o que querem dizer, eu sabia, e é por saber que eu sinto como se as paredes desse apartamento gigantesco parecem fechar enquanto eles jogam conversa fora para amenizar o clima carregado, cinza e chuvoso dentro de mim.

A minha primavera havia passado?

-- Toma, filha! É de camomila, cê vai conseguir relaxar um pouquinho. - minha mãe estende a chícara com um sorriso terno e preocupado no rosto.

A porcelana está quente e eu a aperto mais forte entre os dedos. É bom sentir algo além de vazio às vezes, mesmo que queime.

-- Obrigada. - um fio de voz. Nem mesmo eu a reconheceria como minha. Irreconhecível. Estou um trapo, e tenho ciência disso.

-- Só tente ficar bem, minha filha...- sua voz é claramente abatida e eu reparo pela primeira vez no seu rosto. Cansaço, bolsas de inchaço abaixo dos olhos, olheiras que ela tentou esconder com uma base e corretivo mal aplicados. Estremeci e senti meus olhos inundarem de lágrimas vendo como os dela encheram em resposta.

Minha mãe estava sofrendo por mim? Pela Manu? Por nós? Eu não sabia ao certo, mas era inegável que sua imagem refletia a minha dor.

-- Ela tá assim porque QUER estar assim! - ouço a voz enfurecida de Dani e levanto os olhos em sua direção, percebendo todos prenderem a respiração com a nossa troca de olhar, o dela raivoso e o meu completamente opaco, sem vida. -- Tô mentindo? Cê tá aqui choramingando pelos cantos e sentindo pena de si mesma ao invés de fazer alguma coisa! - ela suspira exasperada. -- Cê precisa reagir, Rafa! Não pode ficar assim num eterno luto enquanto ela age como se não quisesse dar indicios pra ninguém que terminou um relacionamento!

Força do Destino [Ranu]Onde histórias criam vida. Descubra agora