Força do Destino [Ranu]

Turbulência

Manu Gavassi
Presente

Aqui, olhando para a Lua, pergunto-me se realmente quem não acredita em magia jamais a encontrará. Eu sempre acreditei. De um jeito ou de outro. Às vezes querendo esconder do mundo e de mim mesma que eu acreditava, ainda assim sempre esteve lá, aquela sensação de que a vida reservava algo gigante para mim, sempre esteve lá.

Vendo a silhueta completamente desejável e exuberante da mulher que eu amo sob a luz do luar algo preenche meu coração, minha alma, meu espírito. Me pergunto se esse algo gigante pelo qual sempre esperei era Rafa na minha vida, talvez fosse o amor que eu sinto por ela. Se eu tivesse que apostar, apostaria nesse amor.

Rafa certamente mudou tudo pra mim, mas esse amor que eu sinto é que verdadeiramente tem me transformado no tipo de pessoa capaz de só sentar perto dela, sabendo que seu coração está quebrado e, ainda assim, não querer consertar.

Pode ser difícil entender se você nunca sentiu esse tipo de amor antes, mas quando você ama do jeito que eu amo, então você sabe que o melhor que pode fazer nos piores momentos é só estar.

Acredite em mim, o seu grande amor não quer ser consertado, ele quer ser acolhido. As pessoas no geral pensam desejar alguém que resolva seus problemas e dores, mas elas estão erradas, é muito mais simples e mais difícil do que isso. Todos queremos, lá no fundo, alguém para sentir junto, alguém que nos permita ser e sentir o que for, até a mais dolorosa e solitária das tristezas.

Nossos últimos dias têm sido assim. Minha namorada se abriu, fez com que eu falasse sobre meus próprios sentimentos, está tentando ser resiliente diante da frustração e das inúmeras dúvidas que o resultado negativo do teste de gravidez nos causou, mas há momentos como esse que revelam sutilmente toda a sua angústia.

Seu semblante muda, Rafa fica contemplativa, desatenta, se afasta um pouco como se dissesse sem dizer que precisa de um tempo sozinha, então ela senta distante e seu olhar se perde em algum lugar dentro dela mesma.

Talvez há meses esse liga e desliga da parte dela me causasse incômodo, mas hoje não, eu sei que todo ser humano no fundo tem muito em comum com essa Lua, às vezes fraca e pálida, às vezes forte e cheia de luz. Os ciclos fazem parte da vida.

Por isso não me senti implodir quando um bebê passou por nós há três dias e Rafa começou a chorar sem parar por cerca de duas horas. Por isso não discuti quando ela me informou que não queria voltar imediatamente para São Paulo. Por isso não questionei quando ela decidiu que queria esperar mais do que o tempo necessário para uma segunda tentativa.

Mesmo a noite mais escura vai acabar e o Sol vai nascer. Às vezes a melhor forma de superar algo é sentir o que esse algo te faz sentir. Rafa precisa curar essa ferida e encerrar esse ciclo antes de estar pronta para outro.

Acho que pela primeira vez na vida eu estou bem sabendo que ela está sofrendo. Longe de não me importar, mas é o que ela precisa. Rafa não precisa que eu conserte nada, ela precisa chorar e se lamentar por esse primeiro fracasso.

-- Não tá irritada de estarmos aqui há tanto tempo? - balancei a cabeça, tentando sair dos meus pensamentos. Meu olhar mudando da Lua para minha namorada.

-- Hm? Porque me irritaria?

-- Sei que cê sempre sente muito frio aqui. - deu de ombros. -- Seu corpo sempre tá gelado quando vamos embora, mas hoje cê não reclamou...- seu tom era curioso, uma pergunta subentendida.

-- Talvez eu tenha criado uma certa resistência? - ela soltou uma pequena risada, caminhando com um sorriso na minha direção, seu olhar de incredulidade era gritante.