Capítulo [4]

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Amanhecia, manhã do dia 25. Não sendo pelo álcool, Emilly nem mesmo havia dormido. Depois da confissão, não viu sua amiga chorar, nem ela o fez, lamentou profundamente não poder ajudar bem mais. Apenas tentaram adormecer.

Ângela já estava de pé preparando um café como se fosse um café da manhã de um dia comum. Chovia fraco, ela já vestia uma calça e uma blusa branca com blazer, iria no presidio mesmo não sendo tão necessário.

- Bom dia... — ela respondeu quando viu Adriana ainda enrolada em cobertores, se mover na cama.

- Você vai trabalhar? É natal!
— Adriana quis reclamar mas estava sonolenta.

- Vou. — ela beijou sua testa e logo seus lábios. — Feche a porta quando sair.

- Ok então. Tchau.

Ao chegar no presidio, ela não estranhou o silêncio. Salvo pelo fato de que Emilly havia feito o que podia para conseguir um encontro com ela naquela manhã depois que soube que Ângela estava lá.

- Você tem certeza disso? — não escondeu o assombro.

- É sim! Diretora, eu não tenho a quem recorrer, não confio nesse advogado de Maria, parece empurrar o caso dela com a barriga, não é possível. Só a senhora pode ajudar, é injusto.

- Se acalme, sim? Preciso primeiro me certificar de tudo que me conta. E em segundo lugar, tente convence-la a mudar de advogado, existe uma chamada Marcella Soares, diga que você a conhece e confia nela.

- Certo! — Emilly estava nitidamente esperançosa.

- Emilly, não diga a ela que me contou.

- Nem pensar, ela me mata!

Ela disse sorrindo já levantando para ir-se. Como em raras vezes, Ângela de verdade se aprofundou como nunca em um caso, ainda estava sem acreditar em tudo que ouvia.

- Onde estava que me deixou trabalhando aqui sozinha? — Maria reclamou.

- Sabia que sentiria minha falta. — Emilly brincou, estava feliz mais pela amiga que por si.

Havia passado alguns dias desde o natal, mesmo temerosa, agora Maria tinha a tal doutora Marcela como advogada. Desde então, mesmo lembrando de seu rosto quase todos os dias, ela não voltou a ver a Ângela. Numa noite Emilly teve a impressão de ouvi-la chamar pela diretora em sonho.

- Maria, sua advogada. — a carcereira disse assim que apareceu, as duas colegas de cela se olharam.

- Anda, boba, vai lá! — Emilly a encorajou e ela levantou.

- Bom dia, Maria! — Marcela parecia empolgada.

- Bom dia, doutora.

- Te trouxe boas notícias. O amigo do seu marido já está sendo procurado para falar, isso pode aumentar a veracidade da sua versão. Dependendo do que ele disser. — Era a primeira vez que um brilho de esperança tomava de conta do rosto de Maria.

- Mesmo?

- Sim. Seus filhos estão no país ainda, vivem com a irmã do teu falecido esposo, estão bem. — Marcela tocou rapidamente as mãos da sua cliente. — Eu não sei se sabem que você está aqui.

- Eu pedi isso a ela. — sua voz quase desapareceu.

- Enfim, quero que saiba que por agora fica quase impossível você responder em liberdade mas acho que podemos conseguir um semi-aberto. Tiveram que reabrir seu caso.

- Sério?

- Sim, entrei com o pedido, entreguei provas depois do seu novo depoimento e a juíza parece está dando atenção devida agora.

Maria sequer pôde acreditar no que ouvia, parecia que estava sonhando. Marcela advertiu que não se enchesse de esperança, nem mesmo precisou, não era a primeira vez que tentavam esse pedido. Diferentemente dela, Emilly quase gritou de felicidade quando ouviu.

- Ângela, mas você sabe que isso pode não ser verdade, não é?

- Fernando, agora você me ofende!

- Mas olha essa história! Como acreditar que ela não matou o marido?

- Você é investigador e tá me dizendo isso mesmo? Te mostrei vários indícios de que esse caso estava todo manipulado pelo Diego e você diz assim? O cara é ex policial.

- O que não entendo é sua obsessão justamente por esse caso. — Ângela calou, quase se irritou.

- Quando se é mulher, precisa provar até o porquê se tem uma prova, não é assim? Mesmo que de fato exista.

- Eu não quis dizer isso, Ângela...

- Vou fazer a última ronda e vou embora, estou cansada e é tarde. Vá descansar também.

Ela despediu e saiu. Realmente era tarde, ela foi direto à biblioteca, só estava ali a Maria e Emilly, a amiga que quando a viu, foi para o outro lado.

- Ângela... — Maria sorriu.

- Como estamos por aqui?

- Bem, hoje recebi algumas notícias  que talvez me ajudem.

- Mesmo?

- Sim, ao mesmo tempo que talvez não dê em nada.

- Por que não quis me contar? Sabe que sou diretora daqui e saberia em qualquer momento. — agora ela lhe olhava nos olhos.

- Você não acreditaria em mim, tenho certeza.

- Está errada. — ela tocou em seu ombro e afastou rápido. — Terminei o livro que me deu. — Ângela entregou o livro em suas mãos.

- Gostou?

- Tanto que comprei a minha própria versão dele. Um dia quero ouvir você lê para mim aquele que mais gostou. — Maria sorriu, outra vez estavam próximas.

- "Ditosa que ao teu lado só por ti suspiro. Quem goza o prazer de te escutar, quem vê, às vezes, teu doce sorriso, nem os deuses felizes o podem igualar."

Ângela lhe olhava com carinho, estava com a cabeça quase deitada em seu próprio ombro encostada na parede. Maria lhe olhava com o mesmo carinho, ainda que nervosa, segurou o queixo de Ângela e lhe deu outro beijo curto.

- Boa noite, Ângela.

Ela disse já saindo do lugar deixando à diretora com uma expressão de surpresa no rosto, ainda que sorrisse. Não tardou para que saísse, precisava descansar.

Mesmo não sendo ao seu gosto, Adriana acabou ganhando pelo cansaço, estavam jantando em um restaurante discreto perto de casa.

- Seu celular anda tocando insistentemente, é o rapaz que andava paquerando você? — ela falava de uma forma natural, não parecia cobrança.

- E você nem de longe sente qualquer espécie de ciúme, não?

- Não, não sou uma mulher ciumenta, disse isso.

- Não é ou não gosta de mim o suficiente para isso?

- Não comece... vamos só jantar, por favor.

Era quase sempre assim quando saíam, Adriana era uma mulher jovem, muito bonita. Cabelos cacheados, sem nenhuma marca que seja no rosto, chamava atenção para onde ia.

Ângela havia tido um relacionamento antes dela que durou exatos quatro anos, foi ainda na sua faculdade de direito que se conheceram, não durou mais porque os pais da moça haviam separado e por própria escolha ela resolveu ir embora, amava a carreira e isso lhe importava mais que qualquer amor. A Ângela restou superar.

A número 43Onde histórias criam vida. Descubra agora