UM PACTO DE SILÊNCIO

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Acho que é muito difícil encontrar um par de irmãos, de idade próxima, que nunca tenha trocado uns tabefes. As meninas, na sua maioria são mais dóceis e amigáveis, mas mesmo assim também têm lá suas rusgas.

Eu me lembro de algumas brigas memoráveis que tive com um de meus irmãos, que é dois anos mais velho. Logicamente isso só aconteceu na infância.

Os motivos das brigas eram tão insignificantes que não ficaram gravados na memória.

Lembro de uma vez em que começamos a trocar uns, tapas do lado de fora do portão de casa e ele me acertou um pescoção tão forte que eu fui ao chão, mas ainda meio zonzo apanhei um pedaço de tijolo e quando ele se virou para correr eu arremessei o projétil que o atingiu na nuca e derrubou.

Meu primeiro pensamento foi que tinha matado o po-bre e só pensei em correr e me esconder.

Para meu azar, minha irmã mais velha estava chegan-do do trabalho e tinha acabado de virar a esquina quando eu joguei o pedaço de tijolo, de modo que ela só viu o que eu fiz, não viu o que tinha sofrido.

Ela socorreu o que levara a pedrada e que só havia ficado meio grogue e contou pra Mãe o que vira. Então quem acabou levando umas palmadas e ouvindo um sermão fui eu.

De outra vez, eu e meu irmão chegamos juntos em casa, mas não havia ninguém. Naquele tempo, maioria das casas, pelo menos as mais modestas, não dispunham de fe-chaduras, as portas e janelas eram fechadas somente com taramelas de madeira. Era o caso da nossa.

Entramos e, como já disse, não me lembro porque, começamos a brigar no quarto. Era um quarto grande, onde além da cama de casal, havia mais três camas de solteiro e um guarda-roupa. As camas eram daquelas de molas (com colchões de capim) e o guarda-roupa tinha um espelho em uma das portas, pelo lado de fora.

No decorrer da refrega, naquele empurra-empurra, fomos em direção ao guarda-roupa e pimba! Lá se foi o espelho em cacos para o chão. A briga acabou na hora e sem trocar uma palavra nem combinar nada, fechamos a casa e saímos. Foi um pacto de silêncio, bem silencioso.

Só voltamos bem a tardinha, quando sabíamos que nossa Mãe já estaria em casa, entramos com cara de anjinhos e ela logo perguntou:

- Vocês estiveram aqui depois que eu saí?

- Não, mãe, tivemos não...! – respondemos em uníssono.

Ela nos olhou com cara de quem não acreditava e disse com certa ironia:

- É...então deve ter sido um fantasma!

- Que fantasma mãe? – perguntamos

- Que quebrou o espelho do guarda-roupa...! – ela respondeu.

Então achamos melhor não dizer mais nada.

Muitos anos depois, já crescidos resolvemos contar a ela a nossa proeza, achando que a tínhamos enganado e ela, mostrando que se lembrava muito bem do episódio, disse sorrindo:

Então vocês pensaram que eu acreditei, não é? Pois eu só não castiguei porque não tinha provas, mas eu sabia que aquilo só podia ter sido arte de vocês dois.

Mãe sempre sabe das coisas.

* * *

Por um AcausoOnde histórias criam vida. Descubra agora