No Words - Girafa

Ângela

Música do capítulo = Sign of the times

Enquanto falava com Rafa ao telefone, Gizelly posicionou-se na poltrona de seu escritório, como fazia toda vez que tinha alguma reunião importante referente ao Bicalho's. Sua situação atual não era tão diferente disso, uma vez que ela definiria uma parte importantíssima de seu futuro. Passou a ligação inteira balançando a perna, como uma criança ansiosa para ganhar um presente, e quando enfim a encerrou sentiu o nó que tomava conta de sua garganta há dias desfazer-se e jogou-se no encosto do assento, deixando o alívio tomar conta de seu corpo. Rafaella ainda a queria, e isso já era o suficiente para deixá-la muito mais tranquila quanto à conversa que teriam.

Estava prestes a levantar quando notou duas figuras de bronze sobre sua mesa. Lembrava-se de tê-las trazido de seu escritório no restaurante, mas não havia tido tempo de encontrar um local apropriado para elas, e por isso as duas miniaturas presenteadas por Roberta descansavam ao lado de seu porta canetas, no canto esquerdo da mesa. Pegou ambas em suas mãos e começou a revirá-las, admirando os mínimos detalhes que as tornavam réplicas tão perfeitas. E foi assim, manuseando figuras de bronze, que memórias há muito não visitadas tomaram conta da mente da chefe.

*

FLASHBACK ON

5 ANOS ATRÁS - BÚZIOS

- Você realmente está fascinada por essas estátuas de bronze, não é, meu elefantinho? Daqui a pouco passará para o banco de trás para ganhar alguns segundos de observação - A jovem, que até então estava perdida admirando a paisagem que a cidade proporcionava, finalmente percebeu sua postura. O tronco torcido, as pernas sobre o assento e o pescoço esticado eram consequências de sua súbita admiração pela beleza de Búzios, mas ela sabia que não deveria estar assim dentro de um carro em movimento, e logo ajeitou-se.

- Desculpe, é que as coisas são diferentes aqui. Não sei, temos praias no Rio de Janeiro, mas a daqui me parece diferente, até as pessoas me fazem sentir isso. Por que será, papai? - Conhecera algumas das melhores praias do mundo, mas aquela ali, dentro do estado onde crescera lhe chamava atenção. Não sabia explicar o porquê de tamanha atração, mas o local despertava na aspirante a chefe uma estranha curiosidade, como se ali existisse algo a ser descoberto.

- Cada lugar é diferente, querida, provavelmente está sentindo isso porque nunca esteve aqui. O mais velho não desviava seu olhar do trânsito um minuto sequer, era um pregador assíduo de direção consciente, e tentava ensinar isso às suas meninas diariamente, para que elas adotassem as medidas seguras toda vez que pegavam no volante. Em situações como a atual, onde uma delas era sua passageira no carro, redobrava a atenção, não se perdoaria caso uma de suas garotinhas se machucassem por falta de atenção de sua parte - Se você quiser, podemos parar ali na volta, e você pode tirar fotos delas. Você trouxe sua câmera, não trouxe? - A vontade de Gizelly era abraçar seu pai o mais forte que conseguisse, mas sabia que isso não seria bem aceito enquanto o automóvel estava em movimento, e por isso se conteve a deixar um beijo estalado em sua bochecha.

- SIM! Está na minha bolsa, quando você for procurar os documentos que precisa, eu vou aproveitar para ficar configurando ela - A animação da capixaba era notável, e fazia o coração de Antônio bater mais forte. Sua filha era uma menina de ouro, e se orgulhava mais dela a cada dia que passava - Mamãe e Bia ficarão tão felizes ao ver as fotos que tiraremos, vai ser uma maneira de incluí-las no nosso passeio. Você é demais, papai - Achava muito bonita a maneira com que Gizelly se tornava uma criança animada em questão de segundos. A cena ao seu lado lembrava as incontáveis vezes em que recebera uma chamada de vídeo da universitária, onde ela contava a mais nova receita a ser adicionada em seu portfólio. O amor da filha pela gastronomia era admirável, assim como sua determinação em tornar-se uma profissional exemplar, e era por isso que sempre a havia apoiado nesse sonho.