Cap.4 - CxT ?! -

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Já havia uma semana que Kurt não recebia notícias de seus novos “amigos”. Uma semana que serviu para que todas as informações e fatos daqueles dois dias se assentassem e fossem absorvidos em sua mente. Na mala dada por Acqua, havia roupas caras, de grife, ternos, dois relógios que valiam mais que o aluguel de seu apartamento, um prateado e um dourado, e dois óculos escuros, Raybans, estilo aviador. Além de é claro o envelope com três mil reais em notas de cem e cinquenta. Aquilo lhe rendeu um lindo sorriso e uma fisgada no coração, medo e receio. Ganhara tudo aquilo e um carro que valia umas cem vezes mais, mas o que tinha dado em troca?

Evitava usar as roupas para não chamar atenção, mas carregava o relógio prateado e os Raybans para onde quer que ia, além de é claro, o Mercedes. Teve vontade de ir no final de semana a sua terra natal, ver sua namorada, Emma, mas não saberia explicar o Mercedes, nem a ela, nem a família. Teria que ver seu pai, claro, além disso, seu avô poderia estar na cidade e seria mais um caso complicado a ser explicado. Afinal, Megami sabia da capacidade dos homens da família, a incrível facilidade com carros velozes, também sabia do passado do avô e sua relação com a máfia. Como explicaria ao seu avô o carro? Ele entenderia na hora.

Decidiu passar a semana o mais discreto que podia. Estacionava o Mercedes uma quadra antes da faculdade, ao entrar na sala o Rayban já estava no estojo e o estojo enfiado na mochila. Era estranho viver daquela forma, era como se tudo aquilo que via agora não passasse de uma tela irreal. A realidade dele havia mudado, não era mais aquela de salas de aula, lições monótonas e perguntas como “Porque Voltaire não acreditava em nosso senhor Jesus Cristo?” ou “Sócrates então era pedófilo?” Não, sua realidade era outra.

Na sua realidade, era o súdito de uma Rainha conhecida como Megami. Era considerado o Bispo em seu tabuleiro de xadrez. Era considerado uma peça importante e, afinal, tinha um Mercedes o esperando assim que saísse da aula.

...

No termino da aula de sexta-feira, quando discutiam sobre a frase de Voltaire, “O homem só será livre quando o último rei for enforcado nas tripas do último padre”, os alunos digladiavam entre si, uns dizendo que esta frase pertencia na verdade à Jean Meslier, o outro (justamente o que perguntou porque Voltaire não acreditava em nosso senhor Jesus Cristo) levantava a voz, dizendo que nenhum sacerdote católico seria capaz de dizer uma abominação dessas, outros, de boinas e bigodes preparados, camisas xadrez armadas como escudo da contracultura e iPads como suas espadas, diziam que era de Denis Diderot sua autoria.

Kurt não podia se importar menos com quem disse aquilo, sabia apenas que foi dito e que no final, não fazia diferença alguma a autoria. Palavras eram como flechas que nunca paravam depois de acertar seu alvo, trespassavam obstáculos e continuavam atingindo a todos que tivessem ouvidos para ouvi-la ou olhos para lê-las, não importava quem disparou a flecha e sim o dano causado.   

Voltaire era famoso, Denis era aquele camarada francês e Jean... Quem era mesmo Jean? Fato cientifico provará de quem é a frase, e de acordo com a sabedoria superiora, o professor que se gaba imensamente do seu PHD, acaba a aula simplesmente dizendo que é de Jean Meslier, encontrado no livro “Extrait des sentiments de Jean Meslier”.

Se ele falou tá falado. Ele é o Rei aqui nesta sala. Onde está agora o sacerdote?

...

Caminhava até o Mercedes, atravessando pela calçada movimentada de alunos que saiam as onze da noite, boa parte já se abraçando e gritando, brincando e correndo como crianças do ensino médio. O bar piscava a quase uma quadra de distância, próximo onde havia estacionado o carro. O Amanhecer convidava toda aquela geração de alunos a “aliviarem a canseira” de estudarem, enchendo suas caras, inebriando seus sentidos e os induzindo a uma sensacional ilusão de que a cerveja era recompensa pela árdua provação, o calvário que enfrentaram que se chama sala de aula, como se estudar fosse uma obrigação, e não uma escolha que fizeram.

SúditoOnde histórias criam vida. Descubra agora