Cap. 13 - A Noite da Rainha -

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O manto estrelado da noite começava a cobrir o céu quando saíram do Playground após discutir durante horas a estratégia de vigia e ataque. Kurt estava cansado e com dores nas costas por ficar tanto tempo em pé, olhando mapas desenhados a pincel atômico sobre uma mesa de vidro branca, apagados, redesenhados, rabiscados e desenhados mais uma vez. Não havia como ficar sentado e ver os desenhos sobre a mesa ao mesmo tempo, então o grupo se reuniu ao redor da mesa, todos de pé.

Megami o tocou suavemente no ombro e se afastou do grupo, Kurt a acompanhou em um suspiro de alivio. Saíram do hangar e se distanciaram até a BMW, Megami se encostou na porta do passageiro e Kurt ficou a sua frente, mãos enfiadas nos bolsos, o olhar cansado de safiras brilhantes a fitando.

- Estou cansada Kurt. – Respirou fundo e prendeu o ar por dois segundos, exalando devagar. – Preciso de um bom banho e tirar um pouco a coroa da cabeça.

- Quer voltar a ser Megami e conversar coisas simples como antropologia? – Brincou.

- Você se lembra? – Sorriu, o arco fino se formando na pele lisa iluminada pelo crepúsculo. – O que mais se lembra?

- O que se tem para esquecer? – Suspirou e encostou ao seu lado. – Caipirinha e salame, dedos lambuzados de limão. Há uma Megami que não é uma Rainha?

- Não. – Deu de ombros e cruzou os braços. – Houve, certa vez, mas aquela Megami morreu. Todos nós morremos. Não há como conciliar o Reino com as outras pessoas que não fazem parte dele. Não há como conciliar a realeza com a plebe.

- Entendo. Eu também morri, foi assim que me senti. Como se o amadurecimento fosse tão rápido, tão abrupto, - estalou os dedos – que simplesmente um Kurt deixasse de existir e outro tomasse o lugar.

Ao longe, uma explosão de gargalhadas. Alguém soltou uma piada, provavelmente Filipo com seu jeito descontraído ou Cortez, ou os dois.  Alguns se dispersaram depois dos risos, mas as peças principais ainda permaneciam ali, Cortez apontando alguns detalhes na mesa, Acqua de braços cruzados meneando a cabeça em negação e contra argumentando, rabiscando vários círculos. Filipo coçou a cabeça sem entender, Cortez bateu a mão na testa.

- Eu sei o que estou fazendo Kurt. – Resmungou Megami. Limpou a garganta em um pigarro e continuou. – Mas não quero falar sobre isso, quero mesmo é uma caipirinha e um salame. – Sorriu e o cutucou com o cotovelo. – O que acha?

Acho que o salame eu tenho, mas preferiu não fazer essa piada de mal gosto.

- Acho uma boa ideia, agora?

- Sim. – Abriu a porta da BMW e continuou. – Vamos para casa para que eu e você possamos tomar um banho merecido, deixe que Cortez leve os dois para o Palazzo quando acabarem de discutir. Acho que nossa participação ali já terminou...

Megami entrou e fechou a porta com a suavidade de um gato. Antes de Kurt entrar, deu uma última olhada no hangar procurando os olhos de Acqua. Não os encontrou, ela estava entretida com a discussão, apontando várias e várias vezes para a mesa. Quando Kurt entrou e finalmente ligou a BMW em um ronronar silencioso, Acqua desviou os olhos para o carro, mas continuou discutindo.

Em seu coração ela sentia algo, sabia que sentia, foi ensinada a sentir. Mas assim como Kurt, sentia que ainda havia uma peça fora do quebra cabeça, ou em uma metáfora mais assertiva, uma última pincelada no quadro para terminar a obra de arte.

...

Kurt detestava esperar, mas havia uma lei no universo irrevogável e inquebrável. Mulheres se atrasam, demoram mais do que deveriam e sempre, sempre irão fazer os homens esperarem. E ele nem ao menos estava empolgado com isso.

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