Cap. 9 - O Bispo do Rei, a Rainha Branca -

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Brasil, 2015.

- Não acredito que ele tenha sobrevivido a esse tiro. – Disse Kurt coçando a barba. – Digo, vi a cicatriz no peito do vô uma ou duas vezes, mas nunca imaginei que seria algo assim tão poderoso.

- De fato era, um revolver tão poderoso que atravessava lataria dos carros e...

O celular de Acqua tocou com a música suave. Kurt fez um gesto para que Yigal esperasse e foi até a sala. O celular estava ao lado da Beretta e, quando a viu, as memorias da noite passada lhe atingiram como um soco. Sentiu uma tontura e um aperto enorme no peito ao lembrar de Acqua girando e caindo com as costas no Mercedes, o sangue minando como a fonte de um rio.

Uma nota mais aguda no toque o tirou daquele transe, pegou o celular e o atendeu.

- Megami falando. – A voz disse em um ronronar característico que Kurt reconhecia. – Preciso falar com você Kurt, me encontre no Palazzo Del Re, você tem vinte minutos.

Antes mesmo que pudesse dizer algo, a ligação foi interrompida. Tentou retornar a ligação, mas Megami não atendeu o telefone. Pegou a Beretta e enfiou na parte da frente da calça, jogou a camisa para cobri-la e quando caminhou, sentiu o extremo desconforto que era leva-la daquela forma.

Saiu da casa nervoso, irritado profundamente com a atitude de Megami que, sem nenhuma explicação ou satisfação, pediu que o encontrasse e ainda havia estipulado um tempo. Voltou para dentro e olhou para os lados procurando a chave do carro, para se acalmar, passou as duas mãos no rosto, respirando profundamente.

Para piorar sua inquietação, seu celular tocou. Eram sete horas da manhã e o visor mostrava a foto da garota loira de cabelos ondulados e sorriso brincalhão, Emma, novamente em uma hora imprópria. Ignorou a chamada e enfiou o celular de volta ao bolso.

- O que foi Bispo?

- Megami. Depois de tudo que aconteceu ela ainda estipula um tempo para eu a encontrar. – Rosnou e finalmente encontrou as chaves, apertando-as com força e sentindo a dor na palma da mão. – Ela ainda tem coragem de me cobrar isso.

- Calma Bispo, ela é sua Rainha no final das contas. Vá e acate a ordem de sua Rainha. Não se preocupe com elas – sorriu e sentou em uma maca, com um pouco de dificuldade. – Elas ficarão bem, qualquer coisa, passa aqui depois. Assim que alguma delas acordar, peço que liguem para você, tudo bem?

Kurt só estendeu a mão e apertou a de Yigal com força, olhando em seus olhos. Yigal não tinha o brilho nos olhos que Kurt viu em Megami, nem o brilho diferenciado, febril de Acqua ou o centrado de Alessa. Era apenas uma fagulha, como uma estrela diminuta e apagada no céu noturno. Mas estava lá.

- Lhe agradeço amigo.

- Não precisa. – Yigal balançou a mão e deitou na maca. – Vá jovem.

E ele foi.

...

O carro baleado atraia atenção, Kurt evitava as ruas de maior movimento mas ainda assim, se dirigia ao Plazza com velocidade. Estava irritado e tinha medo de que Megami pudesse, de alguma forma, castiga-lo. As luvas de couro lhe davam uma sensação mais centrada, equalizava seus pensamentos, se tornava o Bispo que deveria ser. A realidade ao seu redor, a cidade, os carros e as pessoas indo para o trabalho agora não faziam mais nenhum sentido em sua mente. Tudo se tornava um borrão, não via pessoas, mas obstáculos a serem desviados. Não diferenciava um cachorro vira lata de um ser humano que esperava o ônibus passar.

Atravessou sinais vermelhos sem medo algum, desviava dos carros que frenavam e derrapavam no asfalto quente para não acertar o Mercedes que corria nervoso e agressivo. A raiva nublava seu pensamentos, sim, mas não seus sentidos. Pelo contrário, parecia apura-los, afiná-los.

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