ꕥ Em Casa

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Pela manhã, Leonardo saiu atordoado do prédio de Malú.

Parou na calçada, inspirou profunda e lentamente.

Fechou os olhos sentindo que um trem bala vinha em sua direção e que precisava sair do caminho, no entanto, não tinha a menor vontade de desviar dele. Ao contrário. Desde que este trem cruzou seu caminho pela primeira vez há alguns dias em uma festa em um apartamento ele não conseguiu nem mesmo dar um passo atrás, tudo o que conseguiu fazer foi seguir em sua direção.

Estava confuso. Não tinha certeza do que estava fazendo, na verdade não estava pensando muito. Não estava em seus planos se interessar por alguém, muito menos pela namorada de seu amigo, mesmo que não fosse mais tão amigo assim e que os dois provavelmente nem voltassem a ficar juntos.

Quando conheceu Ellen nos tempos da faculdade tinha certeza de que nunca mais olharia para outra mulher em sua vida. Não foi diferente quando ela morreu naquele acidente. Tinha certeza de que nunca mais se sentiria atraído por mulher alguma.

Como era possível que sua convicção fosse por água abaixo tão facilmente apenas por causa de um olhar e um sorriso? Se perguntava.

Passar a noite no apartamento de Malú também não estava em seus planos, mas não conseguiria deixá-la sozinha sabendo que William poderia aparecer e o conhecia bem o suficiente pra saber que cedo ou tarde ele daria as caras. Porém, no final das contas, ter ficado foi algo bom. Malú precisava se sentir segura e também conversar e esta foi a parte que ele mais gostou. Detestava o fato de que aquela era uma situação triste, mas gostou de conhecê-la um pouco melhor.

Quando chegou ao apartamento dela e a viu naquele estado, tão diferente de toda a exuberância que ela exibia na festa no outro dia, tão frágil e amedrontada, seu coração se partiu. Achava Malú linda e atraente de qualquer maneira, porém a tristeza que viu nos olhos dela parecia ter se espalhado para todo o resto. Não a conhecia bem, mas estava certo de que ela não era aquilo. Ela era muito mais, porém a vida parecia estar esmagando Malú aos poucos e sugando todas as coisas boas que ela era.

William. Pensou Leonardo. É William quem tem sugado a vida dela.

Leonardo cerrou o punho ao pensar nele.

Alguém passou atrás dele na calçada e sem querer parecer um maluco, começou a andar.

Quando Malú disse que queria ficar sozinha, um sinal zumbiu em sua mente, em seu coração. Teve certeza de que nunca mais a veria se fosse embora naquele momento, mas foi salvo pelos donuts.

No fundo sabia que não haviam sido os donuts. Malú precisava dele. Precisava de alguém. Se sentia só. E ele não podia negar que também precisava... não sabia dizer exatamente do quê. Sabia apenas que precisava estar lá, com ela. Qualquer que fosse a razão pela qual tudo o conduzia na direção dela, ele não questionaria, apenas seguia seus instintos, mesmo que certa culpa lhe cutucasse a consciência fazendo com que pensasse em Ellen o tempo todo, como se lhe devesse alguma explicação.

Quando mais jovem, às vezes, Leonardo se questionava se não devia se meter em mais problemas na vida para conseguir entender quando alguns de seus amigos usavam seu ombro para chorar os erros cometidos. Ou mesmo para entender quando seus amigos cometiam erros e não se arrependiam, como William. Não se lembrava de uma única vez em que ele se arrependera de ser um canalha e Leonardo nunca o julgava, sempre tentava entender.

Seus pais nunca tiveram trabalho com o filho. Talvez não apenas o fato de ter tido pais não tão perfeitos, porém atentos e preocupados, mas também por ter crescido em uma igreja Batista e aprendido certas regras para a vida o tenham ajudado a se manter longe de encrencas.

QUERIDO MEDOOnde histórias criam vida. Descubra agora