ꕥ Anjo

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Nos fundos do La Tambouille, William e Rodrigues ocupavam uma mesa discreta. Passava um pouco do horário do almoço e já não havia muita gente no restaurante, especialmente nos fundos, uma área aberta e reservada.

Rodrigues não se sentia muito à vontade. Não sabia dizer se era a presença de William Salles ou o medo de ser visto com ele.

— Este carpaccio ao queijo é o melhor prato deste lugar. Não consigo pedir outra coisa toda vez que venho aqui. — William estava tranquilo como se almoçasse com um velho amigo. — Está gostando do seu polvo?

— É bem, interessante, sim. — Disse Rodrigues cutucando os tentáculos roxos cercados de cubos de legumes e um creme verde.

— Você se acostuma.

— Talvez não.

— Vai ter que engolir muitas coisas sem vontade alguma se estiver disposto a fazer qualquer coisa pra alcançar seus objetivos.

Rodrigues cortou a ponta do tentáculo e colocou na boca. A careta de nojo desapareceu quando sentiu o gosto.

— Está vendo? Às vezes o sabor tão terrível está apenas em sua mente. Algo que parece muito ruim, no fim das contas pode ser bom pra você.

— Ela vai me matar quando descobrir.

— Descobrir o quê?

— O que estamos fazendo.

— Não estamos fazendo nada. Você está. E quando ela tomar conhecimento, talvez até te agradeça. De certa forma está salvando a empresa.

— Você sabe que o que estamos fazendo não chega nem perto de ser considerado um salvamento, não sabe?

— Eu sei o que preciso saber. E no momento, o que sei é a razão de estarmos aqui, o que eu não sei é em que nível está a transferência das ações.

— Em alguns dias eu termino.

— Preciso que faça em menos tempo.

— Não é possível. Se eu transferir em quantia maior alguém vai notar.

— Tudo bem. Você tem no máximo uma semana. Os papéis já estão prontos, vou mandar entregar ainda hoje. Faça ela assinar...

— Ela nunca assina nada sem ler antes. E se ela ler o conteúdo não vai nem mesmo procurar uma caneta e sim a polícia.

— De vez em quando ela se distrai. Eu a conheço e sei muito bem. Você me parece um cara esperto, não estaria aqui agora comigo se não fosse, vai pensar em algo e fazer com que ela assine, tenho certeza. Quando o fizer, assine sua parte e depois entregue a mim pessoalmente.

— Que garantia eu tenho de que você vai cumprir sua parte?

— Não confia em mim? — William sorriu apenas com os lábios.

— Eu mal o conheço.

— Apenas tenha em mente que a única maneira de nos ferrarmos será se você ferrar com tudo. Então, não ferre com tudo, Rodrigues.


❃❃❃


Malú voltou do salão se sentindo humana novamente. Nunca admitiria em voz alta, mas estava grata por Bia ter aparecido naquela manhã. Sentia-se muito bem, mesmo que naquele momento todo o resto fosse um completo desastre.

Sentiu que seu coração explodiria de medo quando pisou na rua ao saírem do prédio. Queria correr de volta ao seu apartamento. Olhava desconfiada pra todas as pessoas que passavam por ela até conseguir entrar no carro de Bia.

QUERIDO MEDOOnde histórias criam vida. Descubra agora