CAPÍTULO 6 - A Parada Negra.

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Ele não parava de gritar e aquele sentimento me deixava desesperada. Onde eu estava com a cabeça de levar essa conexão adiante? Tínhamos uma casa destruída, uma nova moradora, um cadáver e Gaspar surtando no chão ensaguentado que ele acabara de se atirar de joelhos. Uma lembrança veio a minha cabeça: "Minha mãe costumava fazer isso quando eu estava machucado ou triste".

- Gaspar, olha pra mim. - Puxei o queixo dele para frente e o fiz me fitar. - Vai ficar tudo bem...

- SAI DE PERTO DE MIM, SEU MONSTRO! - Ele gritou para mim. De alguma forma, aquilo doeu... doeu pra caramba. Ele chorava, levava as mãos sujas de sangue aos cabelos. "Tem que doer como nunca, que é pra não doer nunca mais". Lembrei desta frase, ela me manteve forte para estar ali. De certa forma, ele estava certo. Eu era um monstro egoísta... O fiz ficar quando ele quis ir embora. O convenci que talvez eu fosse uma boa companhia, quando na verdade eu era a bomba nuclear que dizimou Hiroshima e Nagasaki. Em vez de recuar, Eu o abracei. Um abraço bem apertado.

- "Tem que doer como nunca pra não doer nunca mais..." - Falei para ele. Senti ele me apertando contra o seu corpo, escondendo o rosto em meu pescoço. A sua barba em crescimento, fazia um pouco de cócegas quando ele mexia a cabeça.

- Me desculpa... - Ele dizia em meio ás lágrimas. Eu respirei fundo, precisava me controlar. - Por favor, não me deixa... não me deixa de novo.

- Ahn? - Perguntei confusa. - Gaspar, porque eu te deixaria?

De repente, o choro dele cessou e ele me encarou. Seu olhar estava distante, mas ele me encarava.

- Me perdoe, mas preciso fazer isso. - Ele disse, me puxou ao seu encontro e me beijou. Seus lábios estavam salgados pelas lágrimas, mas não me importei. Foi como se não estivéssemos numa sala destruída. Foi como se ambos não estivéssemos como aquela sala. Foi como se não tivesse mais ninguém naquela sala, além de nós fazendo um "trisal". Ele, o silêncio e eu. Seus lábios se misturavam aos meus de forma gentil e se tornava profundo quando ele respirava. Eu retribui. Era como estar num momento puro, como aquele com as crianças. É como se algo estivesse certo, embora tudo estivesse errado. Era como um beijo de saudade.

E então, a situação me trouxe a tona. Aquilo não deveria estar acontecendo. Flashes cruzaram minha visão. Eu via jardins, via grades, paredes de pedra, ouvia risadas. Via uma porta branca trancada, ouvia alguém gritar lá dentro. Senti a cobra em meu braço arder, vi sua luz se misturar com a que estava no braço de Gaspar. Olhei em direção ao brilho que emanava da porta da frente e minha visão embaçou. Podia jurar que vi um enorme par de asas brancas se abrir quando eu enfim despenquei no chão com Gaspar inconsciente.

***

Me levantei de supetão. Era um chão frio e uma sala vazia. A minha frente, havia grades. A única iluminação era das tochas no corredor. Eu estava num lugar feito de pedra e muito frio. Meus lábios estavam ressecados e minha garganta seca. Um homem de armadura parou em frente às grades.

- Está com sede minha criança? - Ele perguntou. Eu acenei que sim com a cabeça. - Vai ter que beber minha urina se quiser se hidratar.

- Eu quero minha mamãe... - Eu falei.

- Sua mãe disse que foi uma garota muito malvada. Você sabe o que acontece com garotas malvadas, não sabe Pequena Lux?

- São castigadas... - Sussurrei.

- Isso mesmo, mas você não quer ser castigada... quer?

- Não, senhor...

Eu o ouvi abrir a cela, enquanto eu encarava o chão.

- Tire suas roupas. - Ele mandou.

- Não...

- Eu mandei tirar suas roupas!

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