Capítulo 12

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David Rabelo

Minha mãe está com a TV ligada no telejornal da manhã. Eu vejo uma grande bandeira do movimento LGBT sendo segurada nas mãos por uma Drag Queen meio desajustada, deve estar em início de carreira.

Minha mãe parece atônita, impactada em frente ao aparelho, segura um pano de prato meio úmido com as duas mãos - como ela consegue acordar tão cedo e ainda por cima lavar louça nesse frio São Paulo.

- ... A polícia prendeu um suspeito pelos assassinatos em série que vêm ocorrendo na capital paulista nas últimas semanas - falava a jornalista - Mas, mesmo com o suspeito preso, outro assassinato ocorreu essa madrugada. O Corpo de Lélio Castro, um estilista de 29 anos foi encontrado num matagal perto de uma das áreas mais nobres de São Paulo, onde ele morava. o corpo Lélio, assim como as outras vítimas do Serial Killer, foi encontrado com um corte na artéria femoral e os lábios costurados. A polícia já divulgou nota, informando que o suspeito que está preso, cuja identidade não foi revelada à imprensa, terá a prisão preventiva revogada, mas, que continuará fazento parte das investigações do caso.

- Misericórdia! - minha mãe diz - Deus me livre uma coisa dessas. Mas, você sabe o que é isso, David?!

- O que?

- Falta de Deus no coração! - ela fala e isso soa como a coisa mais imbecil que ela poderia dizer - Esse pessoal aí é todo alternativo, todo diferente, curte umas coisas estranhas...

- Eles são homossexuais!

- É... - ela pensa um pouco - Isso não agrada ao Senhor. É por isso que estão tendo esse fim. Pobres almas!

Eu não digo nada. Tenho medo da reação dela. Talvez até ela faça uma ligação entra a minha fala e meus segredos.

Ela não está pronta para saber, eu não estou pronto para falar.

Me despeço, apanho minha mochila e saio de casa.


* * * 

O colégio parece uma câmara mortuária, todo mundo está com a cabeça pra baixo e eu sinto que aquilo não é por acaso.

Tem uma TV no corredor central, que nos leva às salas. 

Tem um pessoal formando um bolo bem abaixo dela, estão vendo um telejornal também. Em outro canal.

Eu me aproximo e reconheço a figura exuberante que está na tela: uma das Drag Queens mais famosas do mundo, que é brasileira. Isso explica a aglomeração em frente à TV.

Ela está usando uma peruca loira super grande, com um vestido feito de tiras de alumínio, uma gargantilha chamativa e luvas azuis que vão até acima dos cotovelos. Eu reconheci logo: é a roupa de um dos clipes dela, um que ela sai de um bolo de aniversário.

Mas, a Drag Queen não está feliz agora. Parece abatida. Eu me aproximo para ouvir.

-...Parem de nos matar! O Brasil ainda é o país que mais mata LGBTQI+ no mundo inteiro! Isso é um absurdo! Nós somos seres humanos, merecemos respeito. Nós merecemos viver! Esse psicopata que está por aí nos matanto precisa ser encontrado e parado o mais rápido possível! Ninguém está a salvo com ele nas ruas.

Ela deixava lágrimas saírem do rosto. 

- Sinistro, né?! - sussurrou o João Victor ao meu ouvido.

- Muito... - eu abaixo a cabeça.

Depois do que aconteceu na festa do Arthur-Fedobinha, eu não sei se conseguiria encarar o João Victor de novo.

- Como você se sente, David?

- O quê?

- Estando na linha do Assassino Gay!

Eu olho ao redor, para me certificar de que ninguém ali ouviu. Parece que ninguém ouviu realmente. Volto a olhar para o João Victor e ele está me encarando com deboche. 

- Você tá ligado que ninguém tá nem aí pra sua vida sexual, né?! - ele sorri - Relaxa, David.. A gente não tá vivendo mais na idade média não. Todo mundo aqui curte, curtiu ou vai curtir o mesmo sexo uma hora ou outra. Você é a gay mais ultrapassada que eu já vi.

- Eu não estou na linha dele! - eu digo, ignorando todo o resto.

- Claro que tá! - ele sorri - É um padrão, David: gays! E você é gay...

Eu o puxo para longe das pessoas que estão na frente da Televisão, quero evitar que alguém ouça aquela conversa.

- Deixa de ser imbecil - eu sussurro - Eu não quero que ninguém aqui saiba disso e você não tem o direito de falar pra ninguém algo que é só meu, entendeu?!

Ele fica calado um instante, depois, vai se aproximando de mim, os olhos em chamas.

- Você pode ser a próxima vítima, veadinho! - ele sorri - Já pensou que terrível?! Além de morrer, todo mundo ia saber que você é gay! 

- Para, caralho! - eu berro. Ninguém parece ter ouvido.

- Que porra é essa aqui? - indaga a Lisa, se aproximando de nós.

- Nada não, Arlequina! É só o seu amiguinho aí que é covarde demais. Até mais tarde, Veadinhos!

Ele sai sem olhar pra trás. A Lisa mostra o dedo do meio pra ele, junto com a língua. 

- Que foi? - ela questiona - O que ele quer? Comer seu rabo?!

Eu fico tenso.

- Ah, vai me dizer que você nunca entendeu que o João Victor é doidinho por você, David?!

- Eu... - eu gaguejo - Eu não... Eu nunca notei. 

- Pois note! E ele curte garotos, todo mundo sabe. É tipo o lado descolado dele. E, sabe de uma coisa?! Apesar de o João Victor ser um saco, ele é gato. Eu acho que você deveria dar uma chance, quem sabe você não gosta?! Eu mesma já peguei várias meninas... Tudo bem que todas foram sob efeito abusivo de alcool, mas... Foda-se! Foio bem legal!

Eu me sinto tomado por um impulso que vem não sei de onde.

- Eu sou gay!


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