Capítulo 17

29 6 0
                                    

Caio Barreto

Foi realmente uma sorte muito grande ter encontrado do David naquele exato momento. 

O meliante também teve sorte de ter conseguido fugir. Mas, naquele momento, para mim, mais importante do que colocar as mãos nele era ajudar o pobre rapaz de suéter preto.

Eu estava indo até a boate LGBT chamada Club da Noite, seria lá o meu encontro com o tal cara do app, aquele com o nome sugestivo.

Mas, quando cruzei com aquela cena na calçada, meu rumo mudou completamente. É como se todos os meus instintos fossem ativados e eles só queriam que eu salvasse o David daquela situação. Um milhão de coisas se passaram por minha cabeça naquela fração de segundos e, quando eu menos notei, estava com o rapaz dentro do meu carro.

* * * 

Enquanto eu limpo seu ferimento do rosto com uma gaze umidecida em soro fisiológico, reparo no olhar perdido de David Rabelo.

Ele está calado e evita me encarar, eu noto que é pura vergonha, medo.

- Tá doendo?

- Não - ele responde quase imediatamente - Eu só estou agoniado...

- Você não precisa ter vergonha, David!

Estamos sentados no sofá da sala do meu apartamento. Eu imagino que, em outras circunstâncias, isso não seria muito aceitável, mas, eu não sabia o que poderia fazer. O David se negou a ir até um pronto-socorro. Eu me lembrei daquela maletinha de primeiros-socorros que a Sheila tinha criado um tempo antes. "Vai ficar no armário da cozinha, porque, de longe, a cozinha é o ambiente mais perigoso de qualquer casa. Assim que for necessário, já sabe onde encontrar!". Ela sabe das coisas, apesar dos pesares.

- Vergonha?! - ele me questiona, como se não soubesse do que eu estou falando. 

- Eu imagino - falo enquanto seco o ferimento dele com uma gaze, tentando tirar o resto de soro fisiológico - Que você esteja se culpando. 

- Como?

- Sejamos honestos, David. Você acha que ser gay é um problema, não é? - respiro fundo - Mas, eu quero que saiba que não é.

- Ah, pronto! - ele se afasta um pouco de mim - Pra você é fácil falar. É muito fácil dar apoio moral quando não se passa pela mesma situação. Tudo se resolve num passe de mágica assim.

- Quem te disse que eu não passo pela mesma situação?!

Ele fica em silêncio. Seus olhos me fuzilam como se estivessem diante de uma aberração.

- É, David... Nós somos iguais! - eu me aproximo dele - Iguaizinhos. A diferença entre nós é que eu tentei me negar demais ser quem sou e acabei me envolvendo com uma mulher. Eu quase me casei com ela.

- E onde ela está? 

- Me traiu! - dou uma pausa, guardo o resto das gazes dentro da caixinha sobre a mesinha de centro - É nisso que dá, David! Quando algo não é verdadeiro, não dura. Não tem jeito. A gente pode até mentir para os outros, mas, de uma forma bem cruel, nunca vamos conseguir mentir pra nós mesmos.

- Eu não minto pra mim mesmo! - ele me diz, quase me repreendendo - Eu só não quero que ninguém saiba. É algo meu, não tem porque os outros saberem.

- Será que é por isso mesmo, David? Será que você se aceita tranquilamente, mas, não quer que os outros saibam só porque você não se importa com a opinião deles ou porque você não suporta sua opinião sobre si mesmo?!

Mais uma vez ele fica sem silêncio e eu sinto que ultrapassei os limites.

- Me perdoe! - eu falo, me levantando do sofá - Eu não tenho o direito de te falar merda nenhuma. Realmente, me perdoe.

Gay KillerOnde histórias criam vida. Descubra agora