A atmosfera no pequeno quarto parecia opaca. Havia dois adolescentes discutindo, Ketlyn reconheceu com facilidade Philip, apesar de parecer mais jovem o seu comportamento arredio era o mesmo. Se aproximou a fim de perguntar como havia parado ali, mas antes que pudesse um baque no corredor fez os meninos pararem a discussão se separando: o mais esguio de cabelos pretos ficou próximo a porta, enquanto o conhecido mexia em uma antiga moldura jogando um frasco nela.
A garota conteve o grito ao ver a parede translúcida se formando no objeto.
- O portal está pronto. - sussurrou Philip, fazendo a menina se voltar confusa.
- Portal? Que portal? Como assim? - tentava com esforço manter a voz baixa.
Apesar de suas perguntas não houve resposta, um arrepio lhe acertou com a ideia de não estar sendo ouvida. Ketlyn não sabia como havia parado ali, mal sabia onde estava, o que havia acontecido? Respirou fundo tentando manter a calma.
Aproximou-se de Philip para tocar seu ombro a fim de lhe chamar a atenção, por mais que soubesse que ele odiaria o contato, contudo para seu pavor sua mão acabou passando por ele não encontrando apoio algum. Um arrepio gélido voltou a sua espinha.
Ela havia morrido? O que...? Por que ela não podia...?
O som vindo da entrada cortou sua linha de raciocínio.
Algo definitivamente estava errado ali.
Quando a porta se abriu revelou um rapaz ruivo a qual Ketlyn também conhecia, o que apenas a deixou mais confusa. Douglas estudava na mesma escola que eles, apesar de não ser do mesmo ano. O rapaz mais velho também estava diferente, não levava seu costumeiro sorriso convidativo ou sua postura leve, na verdade parecia tenso e com uma expressão impassível no rosto.
Ketlyn tremeu com tal visão.
Afinal, o que Douglas estava fazendo naquele lugar? Teriam sido todos eles teletransportados de alguma maneira? Ela havia se esquecido de algo?
Philip demonstrou reconhecê-lo, apesar de ser visível que isso o desagradava, o que não era surpresa, era fato que o garoto detestava o ruivo. Por que? Ketlyn não fazia ideia.
Ainda assim, Philip o chamou de outra maneira e quando lhe deu as costas, foi acertado por uma adaga lançada pelo rapaz. O garoto urrou de dor, buscando arrancar a arma com todas as suas forças.
Ketlyn congelou com a visão, até que percebeu o sangue que começava a escorrer do ferimento. Ela se apressou a se aproximar dele, tentando tirar a arma apenas para ver suas mãos passarem por ela novamente. Apesar do frio que começava a tomá-la, tentou mais uma vez buscando estancar ao menos o sangue com o tecido de sua camiseta, todavia o resultado foi o mesmo. Ela não conseguia tocá-lo.
Segundos depois de Douglas lançar a arma, uma garota de cabelos pretos com uma mecha rosa lhe empurrou, em seguida lhe dando um golpe que o levou ao chão. Seu olhar, da mesma cor da mecha, era feroz enquanto lhe prendia com algemas e repreendia por não ter feito da maneira correta. Ela havia tentado impedi-lo? Mas, calma, Ketlyn podia ouvi-la repreendendo por outro motivo, então ela estava envolvida?
A garota estava apavorada, apesar das tentativas falhas se empenhava a fim de ajudar o amigo, mantinha vez após vez o esforço para estancar seu sangramento mesmo que sempre fosse inútil. Ela gritava a plenos pulmões, até sua garganta doer, mas ninguém a ouvia ou parecia notá-la naquela sala.
Afinal, o que estava acontecendo? Ela havia se tornado um fantasma? Havia morrido e não se lembrava?
Ketlyn notou o menino atrás da porta saindo ainda abalado, tentando um ataque contra a garota de cabelos negros mesmo sem nenhuma arma. Ele correu veloz e preparou as mãos como se algo fosse aparecer dali, Ketlyn gritou em advertência, ainda com esperança de ser ouvida, todavia, antes que ele conseguisse atacar caiu sob o próprio sangue.
A garota engasgou com a cena.
A menina que o acertou nem o tinha visto, apenas girou seu braço com a adaga cortando seu pescoço. Contudo, assim que viu o corpo ficou estática, o semblante em completo terror como se não pudesse acreditar no que havia feito, o ruivo recuperado do susto começou a gritar a chamando de assassina.
Enquanto discutiam, Philip tentando retirar a adaga rolou tocando no chamado "portal", Ketlyn tentou impedi-lo e segurá-lo, todavia assim que ele tocou no objeto foi levado por ele, deixando a moldura caída onde havia estado segundos atrás. A garota largou Douglas de pronto o fazendo bater com o rosto no chão, xingando e batendo onde o garoto deveria estar, logo se voltando furiosa perguntando para onde aquilo levava.
Ao fundo uma voz masculina começava a chamar pelo nome da garota, era...
Ketlyn acordou suando frio.
Ela tocou o rosto o sentindo molhado pelas lágrimas, olhou ao redor e se deixou cair na cama ao perceber que continuava em seu próprio quarto. Detestava esses sonhos, o pior é que estavam cada vez mais frequentes. Há cerca de dois anos tinham começado, pouco depois de conhecer Philip e sempre estavam relacionados a ele.
Talvez fosse apenas um mecanismo do seu cérebro confuso? Devido ao seu desconforto por conhecê-lo a tanto tempo e não saber nada dele ainda. Era algo incomum para ela, já que mantinha uma amizade com quase toda a escola, a verdade é que gostava de ajudar e as pessoas se abriam a ela com facilidade. Era difícil pensar que Philip nunca havia dito nada, apesar de ser visível que possuía problemas.
Decerto o sonho era apenas uma projeção da realidade. Philip odiava Douglas, apesar de que o ruivo nunca faria algo do tipo. A garota nunca conheceu alguém tão carismático como ele, fora que se preocupava com o amigo. Mas podia representar as discussões que sempre tinham? A desculpa não a convencia, até porque ela não conhecia os outros dois que viu no sonho.
- Está quase na hora. - avisou sua mãe a tirando de seus pensamentos e a fazendo se levantar da sua cama - Não vai sair hoje com Jessie? Alex pensou em encontrar com você depois da escola.
- Não, compramos ontem o presente pro Douglas. - a amiga tinha mesmo uma queda pelo menino, porém isso a lembrou de algo - Hoje não dá, vou ter o trabalho na casa do Philip, lembra?
Ketlyn não podia negar que estava feliz pela confiança do amigo por convidá-la, entretanto também sabia que ele só o fez por não querer treinar com Douglas a tarde, e inventou na hora que eles fariam o trabalho na casa dele, diferente do normal que era na dela. Isso era desgastante às vezes, o menino não sabia ficar sem cutucar Douglas.
Isso deveria estar visível, já que sua mãe perguntou preocupada se ela estava bem com isso.
- Claro! - falou animada - Pode deixar que ligo se algo acontecer. - repetiu o que a mulher sempre lhe dizia ao sair.
Era provável que Douglas ignorasse as provocações e olhares de assassinato de Philip por vê-lo como uma criança emburrada, afinal era 4 anos mais velho que eles. Tinha recém feito 19 e logo se formaria, assim não possuía motivos para dar trela a essas coisas. Ao mesmo tempo não se afastava do garoto, como se aproveitasse da companhia. Esses meninos eram muito estranhos.
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Líber vol. 1
Fantasy"A garota estava apavorada, apesar das tentativas falhas se empenhava a fim de ajudar o amigo, mantinha vez após vez o esforço para estancar seu sangramento mesmo que sempre fosse inútil. Ela gritava a plenos pulmões, até sua garganta doer, mas ning...