Capítulo 25

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Foi o silêncio que despertou Lauren.

De olhos abertos no escuro, os únicos sons que ouvia eram o ressoar de Camila e o pipocar ocasional da lenha na lareira.

Surpresa, percebeu que o vento parara totalmente e que a paisagem do lado de fora da janela revelava um céu azul-marinho polvilhado de estrelas. Ao olhar para o mostrador luminoso do relógio, percebeu que eram quatro horas.

Virando-se, olhou para Camila, que dormia de lado, o rosto apoiado na mão, e o outro braço protetoramente colocado sobre Lissy, que se aninhava contra ela.

Sentiu uma emoção estranha invadi-la. Não a amava, disse a si mesma, mas gostava dela. Mais do que jamais gostara de qualquer mulher. Aliás, mais do que jamais gostara de alguém, além da filha. Gostava da independência dela, do senso de humor, da coragem, da integridade e da evidente feminilidade. Também sabia que Camila lhe fazia bem, trazendo equilíbrio para sua vida.

E se tivesse um pingo de juízo, casaria com ela.

No instante em que o pensamento veio, Lauren o afastou. Ainda assim, continuou deitada, fitando-a enquanto dormia, e o pensamento voltou.

Por que não casar com ela?

Sabia que Camila amava Lissy. E que também sentia algo por Lauren. E não era apenas uma intensa afinidade sexual. Do mesmo modo que Lauren gostava dela, pensou, consigo mesma.

A união das duas seria boa para todos. Lissy teria uma outra mãe que adorava. Ela ficaria tranquila, sabendo que a casa e a filha estavam em boas mãos. E também poderia cuidar de Camila. Para ela, seria bom ter alguém para ampará-la e protegê-la, como o avô fizera. Poderia comprar roupas bonitas, dirigir um carro novo, fazer tudo que o salário de babá não permitia.

Havia coisas piores nas quais basear um casamento.

Não esperava que durasse para sempre. Um dia, ela acabaria indo embora. Mas, quando o fizesse, Lauren estaria pronta. O fogo sensual que ardia entre elas teria diminuído, ou desaparecido, talvez. A necessidade inaplicável que tinha de ficar com ela, de tocá-la, de falar com ela, de protegê-la, teria desaparecido também. E Lissy estaria mais crescida...

Enquanto isso, os prós superavam largamente os contras.

Quieta, continuou a pensar no assunto, ponderando as vantagens e desvantagens.

Por fim, tomou a decisão. E ao fazê-lo, uma paz intensa a invadiu, substituindo a frustração que a acompanhara nos últimos dias. Acomodando melhor a cabeça no travesseiro, adormeceu, sabendo que finalmente estava fazendo o que era certo.

O sol da manhã brilhava, iluminando a neve, que parecia um cobertor imaculadamente branco, cobrindo toda a paisagem.

Tentando ignorar a dor que o ar frio provocava em seus pulmões, Camila observou Lauren erguer Lissy nos braços, ajudando-a a colocar a cabeça no boneco de neve. Quando a bola focou presa no lugar, ela colocou a menina no chão e deu um passo para trás, observando a criação de ambas.

- Está perfeito - disse Lissy, com expressão séria. - Só que...

- O que foi?

- Ele não tem rosto.

- Tem razão.

- Acho que posso ajudar - sorriu Camila.

- Pode mesmo? - perguntou Lissy, ansiosa.

- Sim - respondeu, pegando nos bolsos do casaco as coisas que trouxera de casa. - Acho que os olhos já estão ajeitados - declarou, entregando a Lissy dois biscoitos redondos. - E também trouxe uma cenoura para o nariz, e... - Camila pegou um saquinho plástico, entregando-o a Lissy. - Podemos fazer a boca com lascas de chocolate.

- Perfeito - disse Lissy. - Mas, e os botões do casaco?

- Podemos usar algumas pedrinhas da enteada - sugeriu Camila, sorrindo docemente para Lauren. - Sua mãe pode apanhá-las.

- Tenho que ir? - perguntou Lauren, tentando ficar séria, enquanto os olhos verdes brilhavam com bom humor.

Lauren estivera de bom humor toda a manhã, pensou Camila, vendo-a cavar a neve da entrada, á procura de pedrinhas. Desde o momento em que Lissy as despertara, dizendo que o sol estava brilhando, parecia estranhamente serena e feliz. E, embora não soubesse o motivo, o bom humor a fazia parecer mais jovem e ainda mais atraente.

Lissy puxou o casaco de Camila.

- Pode me levantar para que eu possa fazer o rosto? - pediu.

- É claro - respondeu, afastando o olhar de Lauren. E quando voltou, tinham quase terminado.

Lauren não parecia impressionada com o resultado, e, franzindo a testa, tomou Lissy dos braços de Camila.

- Não devia carregá-la. É muito pesada - disse, enquanto a menina colocava o último pedaço de chocolate.

- Sou mais forte do pareço - respondeu Camila

Lauren não disse mais nada e entregou as pedrinhas a Lissy. As duas observaram a menina, que as usou para decorar o boneco, colocando-as como botões.

- Está contente? - Ela perguntou, fitando Lissy.

- Sim... Só que...

- O que é, agora?

- Ele ainda parece estar nu.

- É um boneco de neve, Lis.

- Eu sei. Mas mesmo assim...

- Tem razão - concordou Camila, sorrindo, enquanto tirava o cachecol. Com gestos precisos, colocou-o ao redor do pescoço do boneco. - E agora?

- Você não vai ficar com frio? - perguntou a menina mordendo o lábio.

Antes que ela pudesse responder, Lauren surpreendeu as duas, tirando o chapéu e colocando-o na cabeça de Camila.

- Não enquanto eu estiver por perto - declarou. - Isto vai ajudar. E isto também. - Sem avisar, pegou Camila no colo e beijou-a.

- Mamãe! - Lissy deu um gritinho.

Com gestos exagerados, ela interrompeu o beijo e olhou para a filha, com as sobrancelhas franzidas.

- O que foi?

- Você beijou Camz!

- Eu sei.

- Por quê?

- Porque gosto dela.

- Gosta?

- Sim. Você não gosta?

- É claro que sim!

Inclinando-se, ela puxou a menina para perto, até as três ficarem abraçadas.

- É porque você é uma Jauregui - sussurrou. - E olhando para Camila, sorriu. - As Jauregui têm muito bom gosto.

Camila olhou-a surpresa, sentindo o coração cheio de ternura, ao perceber, pela primeira vez, a covinha que ela tinha ao sorrir.

- Não vou discordar - retrucou Camila, sorrindo também. E porque não podia mais controlar-se, passou os braços ao redor do pescoço dela e beijou-a mais uma vez.

O toque dos lábios cálidos, diante do ar frio, era delicioso. E o modo possessivo como ela se comportava naquele dia quase a impedia de respirar. Apertando-se contra o corpo forte, entregou-se ao beijo, acariciando os cabelos negros.

- Puxa! - A voz de Lissy expressava surpresa. - Vocês não precisam respirar?

Lauren afastou os lábios da boca de Camila e riu. Era primeira vez que ela a ouvia rir, e o som teve o efeito do champanhe, deixando-a zonza.

Olhando para o rosto sorridente, entregou-se aos sentimentos que não podia mais conter.

Ela a amava. E já era tempo de dizer isso a Lauren.

Continua...

Louco amor (Camren)Onde histórias criam vida. Descubra agora