2 🍁 Abençoado

102 8 0
                                    

SEMANAS depois,os boatos sobre Ivy Island continuaram se espalhando em Prudente.

Seu nome migrou de boca em boca pelas esquinas e casas,cada Nova Mãe, viúva ou padeiro narrando uma história diferente sobre ela. A única coisa que permanece inalterada é a promiscuidade,motivo pela qual foi expulsa de sua antiga vila.

Todas aquelas cores e andar,nada em Ivy Island me lembrou uma mulher decente.

Durante a Semana do Trigo,enquanto eu sovava massas intermináveis de pão,ouvi rumores de Claira - uma Nova Mãe - que Ivy Island vivia em uma casa de madeira dentro do bosque. A casa ficava próxima ao Lago dos Poetas,longe de qualquer humanidade.

"Aquela devassa ruiva se acha melhor do que nós senhora Fraser - disse a Nova Mãe para mim - andando por aí de queixo erguido como as mulheres dos Litorais"

Assenti, mesmo não fazendo idéia de como eram os Litorais e as mulheres deles.

Quando voltei para casa,tentei apagar a todo custo o vestido florido de Ivy Island da minha cabeça,como o pesado cabelo ruivo se debruçava pelas costas,nenhum sermão me ensinou que o impróprio poderia ser tão bonito.

Mesmo consumida por tal idéia,cumpri os afazeres do dia,mas Daniel chegaria apenas depois do cair da noite,eu estava entendiada e tinha tempo.

Mas tempo para o que? Jogar o tempo fora é um tipo de pecado leve,eu deveria fazer algo útil.

Desenhar não parecia útil,contudo,cedi aquele prazer egocêntrico,já que não havia ninguém para julga-lo.

Apoiei as costas na cabeceira da cama e encolhi os joelhos, o papel e a caneta pressionados contra as coxas,a imagem de um vestido sendo desmembrada em traços e curvas.

Comecei pelas mangas até o cotovelo,o tule branco pregado no final do tecido,as flores minúsculas e a seda brilhante,reluzindo sob o sol da manhã.
O busto formava um decote em V,mostrando todo o pescoço longo de Ivy Island,desenhei seus dedos finos e as pontas encaracoladas do cabelo até a cintura.

Fiquei tentada a desenhar seu rosto,mas me detive,eu não deveria ter o rosto de uma prostituta pintado em minha casa,como se ela fosse uma musa para um artista.

Eu jamais seria um artista e ela muito menos uma musa.

Amassei o papel com força,mas não tive coragem de jogar fora,guardei na última gaveta da penteadeira,eu poderia olhar para o vestido sozinha,desse jeito não seria vergonhoso.

Daniel chutou a porta e entrou,a chuva estava castigando suas botas,ele disse que o trabalho havia terminado mais cedo.

Levantei para colocar as roupas molhadas para secar e separar as peças sujas,sua expressão séria ficou intrigada de repente: ele fitava o caderno de desenho em cima da cama,cheio de rabiscos.

- O que é isso? - murmurrou.

- Um caderno..de desenhos. - arrisquei a verdade,temendo uma represália.

- Hum.

E assim meu marido deu de ombros e se jogou na cama,exausto de mais um dia de trabalho.

Soltei a respiração.

- Vou terminar de fazer a janta..posso acorda-lo quando estiver pronta?

Suas costas largas expiraram,mas pude ver pelo couro cabeludo que ele assentiu.

E agora estou eu na beira do fogão,suando feito uma porca e cheirando a fumaça,meu deus esse homem adora uma carne de cervo,a mais trabalhosa para mim.

Solto uma risada cansada,que ele e Ast encham a barriga,porque eu preciso dormir.

Solto uma risada cansada,que ele e Ast encham a barriga,porque eu preciso dormir

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
IvyOnde histórias criam vida. Descubra agora