16 🍁 Filha metade

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– SENHORA Fraser! Senhora Fraser!

Escuto batidas fortes na porta da frente, verdadeiros socos na madeira,a voz que me chama é aguda e urgente,forço as pálpebras a se abrirem rapidamente e abandono o conforto da cama,fito de esguelha as frestas da janela – o dia ainda não nasceu,é madrugada enquanto apresso os passos,ponho um lenço no cabelo e um xale de tecido grosso por cima dos ombros.

Abro a porta e levanto o candeeiro com a mão direita,a fim de iluminar a face de quem me visita.

– Boa noite eu..Mada Victia? Mada Vera?

Encaro as duas surpreendida,ambas estão nervosas e pálidas.

– O que aconteceu? – pergunto alarmada.

– Senhora Fraser,há um..um.. – Mada Vera se esforça para não tremer – um bando de caras-de-noite na entrada da vila..querem passar por Prudente .

Sinto o estômago congelar,há mais de cinco anos não se vê um cara-de-noite tão próximo a uma vila fundadora,quem dirá um grupo deles.

Engulo a seco,mantendo a voz estável.

– Certo..as senhoras já falaram com os homens?

Obviamente,os abençoados mais fortes partiram para a guerra,mas há aqueles que ficaram e ainda são de grande força apesar da juventude perdida ou enfermidades.

– É claro que falamos,estão a postos,Reverendo Pedro mandou que todos tranquem as suas casas.

– Então.. – uno as sobrancelhas – com todo respeito,não entendo a minha utilidade em tal assunto,juro que ficarei trancada aqui com Astra e vou obedecer as ordens.

– O reverendo Pedro mandou chamá-la..para que diga aos caras-de-noite que podem passar.

– Mas Mada Victia porque eu..

Não termino a frase,seguindo o olhar delas para a pele escura exposta do meu antebraço, imediatamente entendo a ordem recebida.

– Nós a conhecemos senhora Fraser,sabemos de sua boa índole,não é como esses forasteiros.. – começa Mada Vera,percebendo o desconforto mútuo – ..é um infortúnio que...

– ..que eu tenha igual aparência. – completo,a voz obediente e ríspida. – entendo,eu entendo.

– É apenas uma medida preventiva, talvez encontrar um semelhante pacifique os ânimos deles para atravessar a vila sem cometer nenhum ato selvagem.

Ato selvagem,as sílabas borbulham ácidas quando percorrem a garganta,mesmo a disciplina exaustiva que uso para absorver costumes não abranda a ferida profunda sobre certas palavras.

– Soubemos através dos Reverendos que a senhora fala um pouco da língua primitiva deles,já que sua mãe..

– Sim,é muito pouco,mas falo. – a interrompo,antes que comece a falar das minhas origens – se o Grande Céu me incumbiu de colaborar neste sentido,é o que farei,um instante,preciso me trocar.

Mada Vera está constrangida,já Mada Victia parece irritada com a minha irritação,afinal de contas sou uma serva do Grande Céu e obedecer às ordens de Madas é parte de obedecer ao divino.
Trinco os dentes assim que dou as costas para elas,ando até o quarto e visto uma saia e um corpete simples,ponho um casaco grosso de lã para esconder grande parte do corpo e me aquecer da brisa gelada.

Peço a Mada Vera que fique aqui velando o sono de Astra,ela não se opõe.

– Vamos senhora Fraser! Não há tempo a perder – Mada Victia inclina o queixo para o lado de fora.

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