XVIII

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– E o que você é?

Eu havia apoiado minha cabeça em seu peito quando disse isso. Noah sorriu. Eu não podia ver, mas sabia que ele estava sorrindo.

Afastou-me de novo. Não muito, os seus braços ainda estavam ao redor do meu corpo. Foi só o suficiente para ele ficar meio sentado, olhando para meu rosto.

— Sou o cara do quarto ao lado, extremamente inteligente e generoso — falou, com um sorriso torto, fazendo-me gargalhar alto em resposta. — E que tem exatamente o remédio para a sua doença.

Sentindo-me leve e bem como não me sentia há um minuto, nem me aprofundei no estranho fato de me sentir cômoda e momentaneamente feliz nos braços de Noah. Aspirei seu cheiro de balas de canela e calor, sabendo que eu não devia achá-lo tão apelativo, mas não conseguindo evitar. Não queria pensar no porquê parecia bom, só queria aproveitar enquanto era bom.

— Certo, e que remédio seria esse?

Noah de soltou rapidamente de mim e se levantou, o que me fez sentir estranhamente sozinha. Ele me mandou esperar e saiu do quarto. Não demorou muito para voltar, mas os segundos que eu passei sem vê-lo e com apenas o fantasma das suas mãos quentes em minha pele foram, de algum modo, longos.

— Não precisa agradecer, eu disse que era generoso — falou ao aparecer sorridente na porta do meu quarto. Em uma de suas mãos havia duas garrafas de cerveja e na outra, o seu tão precioso binóculo. — E acho que já deixamos nossos vizinhos sozinhos por tempo demais.

Eu não tinha nem palavras para descrever o quanto a perspectiva de passar a noite bebendo e vendo os dramas do prédio da frente eram atraentes para mim. Definitivamente, havia algo de errado comigo. Comigo e com Noah. Aquilo não podia ser normal, certo?

Mas por que ser normal e triste quando podíamos ser felizes stalkers?

Levantei-me, secando os últimos vestígios das lágrimas que pareciam ter sido derramadas há séculos. Sorri e me apoiei na cabeceira da cama, enrolando uma mecha do meu cabelo curto no dedo, fazendo o sorriso de Noah hesitar um pouquinho.

— Eu poderia pedir você em casamento agora mesmo — falei sem pensar e foi a vez dele soltar uma gargalhada alta.

Entrou no quarto e me entregou uma cerveja, seus dedos roçando levemente nos meus.

— Eu poderia aceitar.

Ainda rindo, pegamos um cobertor e fomos para a sala escura, exceto pela luz da TV, que Noah desligou. Então nos encolhemos perto da janela, bebendo e revezando o tempo com o binóculo. Oh, que saudade da Joker, a adolescente mais rebelde do bairro!

A noite parecia interminável, mas não de um jeito ruim. Como aqueles momentos que são tão bons que, por um segundo, parece que a vida vai ser generosa e não deixar que acabem. Eu estava sentada de frente para Noah no chão, nossos joelhos dobrados um do lado do outro. O álcool me fazia perder a atenção entre a noite tranquila no prédio da frente e o rosto de Noah. Esse último parecia mais interessante naquela noite. Eu piscava por um momento mais longo e tentava reconstruir sua face em minhas pálpebras fechadas. Seus olhos pareciam escuros com aquela pouca luz, seus cílios escuros faziam sombras neles. Sua pele era muito pálida e, quando ele apoiou uma mão em seu joelho, eu pude ver, mesmo com pouca luz, os fios azuis de suas veias sob a pele.

Ele sorria depois de ver algo engraçado — como o Sr. Tweed escorregando num tubo de corretivo da filha no meio do corredor — e se virava para me olhar. Eu percebi que adorava aquele sorriso. Era meio espontâneo, meio malvado, meio proibido. E eu sorria para ele também.

Talvez, em algum momento entre a sexta e a sétima cerveja, eu tenha pedido para Noah me acompanhar no casamento de Heyoon e Josh.

— E o que eu vou ganhar com isso? — ele perguntou, parecendo bem melhor do que eu. Sua resistência para bebida era lendária, então quando ele ficava tão porre quanto na noite anterior, era porquê já havia bebido um terço do álcool do planeta.

Perfectly Wrong | NoartOnde histórias criam vida. Descubra agora