Cap. 30 - Parte II

23 4 5
                                    

Cheguei em casa com a adrenalina ainda pulsando em minhas veias. Tentei ligar para Jeon, mas como Tae havia me alertado, não consegui. Droga, eu só queria poder ouvir a voz dele. Haru havia me mandado mensagens perguntando se eu estava bem e se eu queria ir para a casa dela. Eu respondi que que ligaria depois, assim que estivesse bem o suficiente para conversar. Tomei um banho e peguei uma garrafa de soju (bebida coreana). Eu quase virei a garrafa de uma vez só e peguei outra. Eu nem havia comido nada e não passava das dez da manhã ainda. Foda-se. Minha vida estava ruindo e eu estava na merda. Já devia ser noite em algum lugar do mundo... provavelmente no Brasil! Talvez eu devesse fugir pra lá? Nas areias quentes e no mar azul do Atlântico, com o sol sempre brilhando e o ar sem a maldita poeira fina que infestava Seul. Sem a porra da repressão dessa sociedade hipocrita asiática.

- MERDA DE COREIA!!! - gritei com todas as minhas forças. - MERDA DE FAMÍLIA!!!!! MERDA DE VIDA!!!!

Minha situação era tão lastimável que eu não pude me conter e comecei a rir. E ri tanto que comecei a chorar sozinha na sala do apartamento vazio.

-Não acredito que dei um soco na cara da Nari. - falei gargalhando enquanto chorava.

Eu finalmente enlouqueci. Isso é mesmo o fundo do poço. Tomei mais um gole do soju que estava amargo. Peguei meu celular e não pude deixar de ver os comentários nas notícias, a maioria dos haters me xingava e pedia para que eu me matasse ou ameçava me matar. Alguns falavam que eu era feia, gorda, uma vadia que não se dava ao respeito, que eu havia feito cirurgias plásticas, que havia seduzido Jeon, que queria ficar famosa às custas dele... mas a maioria só queria que eu morresse mesmo. Era a primeira vez que eu sofria hate e era assustador como receber mensagens anônimas, ou não, pela tela de um celular podia ser aterrorizante. Eu caminhei até a varanda e olhei para baixo, eu estava no 21° andar do prédio de luxo que meu tio morava e fui até o parapeito da varanda. Descalça eu sentia o chão frio sob meus pés, tomei outro gole do soju. Eu deveria me jogar?

-E acabar com toda a diversão do linxamento coletivo virtual? Nãã... fácil demais. - falei pra mim mesma.

Algumas horas e garrafas de soju depois, eu vi o sol se pôr dentre as nuvens escuras de chuva. A campainha do apartamento tocou e me assustou. Olhei pelo olho mágico, mas não vi ninguém. Abri a porta, mas realmente não havia ninguém lá. Apenas uma caixa preta com um cartão em cima com o meu nome foi deixada. Eu trouxe a caixa comigo até a sala e a abri com cuidado. Dentro estava uma boneca que se parecia comigo. Ela usava uma roupa parecida com a roupa que eu usava nas fotos do exposed. A boneca estava cheia de alfinetes e algo que parecia sangue. Escrito em vermelho vivo em um pedaço de papel na boca da boneca estava "MORRA VADIA HAJI".

Eu joguei a boneca no chão para longe e minha cabeça começou a girar. Sai correndo do apartamento e comecei a procurar por quem deixou a boneca. Eu desci pelo elevador até o hall de entrada que dava acesso a estrada que levava aos outros apartamentos do condomínio fechado. Sai andando como uma louca, na chuva gritando por alguém que eu não sabia quem era. O condomínio era considerado seguro, mas de alguma forma a boneca havia sido entregue na minha porta. Continuei andando cega pelo choque e pela chuva que caía incessantemente até tropeçar e cair. Eu fiquei sentada no chão sujo sentindo meus pés arderem e meu corpo congelar. Não sei realmente quanto tempo fiquei assim, totalmente inerte debaixo da chuva fria, até conseguir me levantar e voltar ao apartamento. Eu estava completamente ensopada e desnorteada. A boneca permanecia jogada no canto da sala e eu tremia de frio e de medo.

Sem pensar direito, eu comecei a procurar meu celular, mas não achava em lugar algum. Então, o telefone do apartamento tocou. Com um pulo eu corri para atender.

-ALÔ???? - gritei no telefone, mas só o que eu ouvia era uma respiração pesada. - ALÔ??? QUEM É?

Eu desliguei o telefone, mas um segundo depois ele voltou a tocar. Eu tapei os ouvidos e comecei a chorar. Corri pelo apartamento procurando o meu celular. O telefone não parava de tocar. Eu não conseguia parar de chorar. Fui até a cozinha e peguei uma faca. A maior que eu achei. Tentei respirar fundo e apaguei todas as luzes de todos os cômodos do apartamento. Eu soluçava de frio e de medo e minhas mãos tremiam ao segurar a faca. Me encolhi e me escondi atrás do sofá perto do acesso a sacada. Eu não tinha nenhum plano, mas eu não iria a lugar algum sem reagir e lutar. Quando o telefone finalmente parou de tocar eu continuei imóvel, encolhida e ensopada. E então, eu ouvi um barulho, alguém estava abrindo a porta e entrando... eu fiquei paralisada enquanto segurava a faca. Então, apenas fechei os olhos e comecei a chorar.

sunsets with you (Vol I - Vol II)Onde histórias criam vida. Descubra agora