Medusa

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Dia 7

A noite anterior fora a pior até agora para Gizelly. A quantidade de bebida ingerida por ela em uma única noite teve seu recorde batido, deixando sua cabeça zonza e a boca seca. Os barulhos vindos da casa ao lado não ajudaram em nada seu estado, aguentou sons de móveis sendo arrastados a madrugada toda, e algumas vezes também ouviu sons de algo quebrando. Chegou até a ficar preocupada com seu mais novo vizinho, mas a irritação por sua decisão de mudar-se no pior horário possível foi maior. Alguns dias atrás, ela provavelmente teria checado seu bem-estar no primeiro objeto quebrado, mas ultimamente aquela Gizelly aparecia cada vez menos.

Saindo de seus pensamentos sobre o novo vizinho, a capixaba finalmente lembrou que mesmo não sabendo o que era um Domingo em casa, tem meses, precisava ir trabalhar. Como já estava virando rotina, estava atrasada, mas dessa vez não se importou tanto com isso, pois havia deixado claro sua posição para seus funcionários no dia anterior.

Ao chegar à empresa, surpreendeu-se ao ver que Manoela também estava lá. Pela lei, estagiários não poderiam fazer hora extra, e muito menos trabalhar nos fins de semana. Se o RH da empresa pegasse a jovem ali, ela, como gestora responsável pela estagiária, provavelmente tomaria uma advertência, pois eles pensariam que a garota estava ali por comando seu.

- Manu? O que você está fazendo aqui em um Domingo? – As boas maneiras foram esquecidas, pois sequer cumprimentou a menina antes de começar seu pequeno interrogatório.

- Ah, bom dia, Gizelly. Eu vim porque preciso organizar algumas coisas para amanhã, será um dia cheio e eu tenho que deixar tudo pronto para você... – Ela pareceu não perceber a indignação da Gerente com sua presença, e continuou com suas atividades. A mais velha queria contestá-la novamente, mas sua justificativa chamou-lhe a atenção.

- Por que amanhã será um dia cheio, Manu? Algo diferente do usual? – A mais nova encarou-a confusa, não entendendo o que se passava. A chefe era a principal responsável pelo que aconteceria e simplesmente agia como se não soubesse do que ela falava?

- Amanhã chega à especialista da qualidade que você pediu para o RH, ela fará a integração pela manhã e de tarde se juntará a nós aqui no setor – A engenheira estava surpresa com aquela notícia, e furiosa ao mesmo tempo. Como que até sua estagiária era informada de algo tão importante referente ao setor que ELA comandava, mas ninguém pensava em avisá-la? Teria uma conversa muito séria com o gestor da área responsável pelo ocorrido – Pela sua cara, você não leu o e-mail que mandaram anunciando isso, não é? – Ao ter seu descuido notado por Manoela, a capixaba sentiu as bochechas esquentando. Estava tão ocupada com sua onda de sofrimento e tendo pena de si mesma que tinha deixado seu trabalho em segundo plano, o que jamais havia feito. Sempre procurara ser a melhor profissional que conseguia, pois como sua mãe dizia, “as pessoas podem te tirar tudo, seu dinheiro, sua paz e até mesmo sua vida, mas o seu conhecimento é só seu, e inalcançável para elas. E é com seu conhecimento que você se torna a profissional que você tanto quer ser". Um sentimento de falha estava tomando conta dela naquele momento, mas não podia deixar-se ser mais afetada do que já estava, não antes de recuperar as rédeas de sua carreira. Pelo menos isso Thomaz não lhe tiraria.

- Eu confesso que esqueci isso, obrigada por me lembrar, Manu – A forma cordial que a mais velha usou para dirigir-se a ela tirou um sorriso rápido do rosto da jovem, que andará os últimos dias cabisbaixa pela empresa. Não queria acreditar que a mulher que achou que fosse ser sua mentora na verdade era como todos os outros gestores – Mas, por favor, vá embora. Não é certo que esteja aqui em um Domingo, e você sabe disso. Vá para casa e retome seus afazeres pela manhã – A estagiária estava prestes a retrucá-la, quando foi impedida – Isso é uma ordem, Manu.

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