Yep

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Dia 14

Aquela era uma manhã de Domingo excelente para fazer hora extra na cama e tirar todo o sono atrasado de seu organismo, mas Gizelly foi impedida de fazer isso pelo toque insistente de seu celular. Ponderou sobre quem poderia ser o responsável por aquela ligação, e chegou à conclusão de que, não sendo cobrança, provavelmente era alguém importante para ela. Foi isso que a fez esticar o braço e pegar o aparelho, atendendo a chamada ainda meio grogue devido ao sono.

- Alô.

- Até que enfim, bunduda! Achei que teria que ir aí na sua casa te arrancar da cama – Era Marcela, espalhafatosa como sempre, e falando infernalmente alto com alguém que sequer estava acordada direito.

- Bom dia para você também, Marcela.

- Iiii, tá mal humorada? Achei que estaria com saudades de mim, da próxima vez fico mais tempo longe – A loira era extremamente dramática quando queria, o que sempre causava a mesma reação na capixaba: um revirar de olhos e um sorriso incrédulo.

- É claro que eu estou com saudades, você me abandonou aqui – E estava mesmo. A médica era uma de suas poucas amigas, e com certeza a mais próxima delas, tê-la longe durante um mês inteiro a deixava pateticamente solitária. A presença súbita de Rafaella em sua vida havia ajudado muito nesse tempo, isso é verdade, mas não era a mesma coisa. Com Marcela, ela desabafava e despejava suas inseguranças, tendo um ombro amigo para lhe dar suporte. Já com Rafa era completamente diferente, pois a cupido ao invés de lhe ouvir seus problemas e aconselhá-la, simplesmente a tirava deles, fazendo com que os esquecesse, como se a vida com Rafaella Kalimann não comportasse tristeza.

- Ô, bichinho, eu também tô mordendo de saudades de você. Eu e a Lu não vemos à hora de te contar tudo e mostrar o tanto de foto que a gente tirou – Já podia imaginar o tanto de tempo que gastariam só nessa tarefa, pois sabia que a amiga não era nada acanhada e amava tirar fotos de cada passo que dava. Teria que reservar uma noite toda para o casal em sua agenda- e é por isso que a senhora está sendo convocada para um drink no “Spoiler”, e não aceito “não” como resposta.

A engenheira pensou naquele convite, mesmo sabendo que a amiga não a permitiria recusá-lo. Todas as suas últimas saídas haviam sido com Thomaz, o que trazia lembranças nada agradáveis para ela. Mas ao mesmo tempo, se via cada vez mais livre de pensamentos relacionados a ele, às vezes era até como se ele sequer existisse. E, se ela for honesta consigo mesma, ela sabia muito bem o motivo dessa “amnésia de Thomaz”, só doía um pouco admitir.

- Eu vou – Palminhas podiam ser ouvidas do outros lado da linha, provavelmente Marcela sendo eufórica e comemorando exageradamente – Mas com uma condição – Sabia que talvez não devesse fazer o que faria a seguir, mas era mais forte que ela. Depois de tantos dias, e dos gestos tão afáveis, ela precisava agradecer de alguma forma, e essa era a única que encontrara até agora. Pelo menos é o que ela tentava vender para sua mente, que insistia em lembrar as caronas, da escolha do carro e dos diversos jantares que dividiu com sua vizinha.

- Qual condição? – A voz da médica era carregada de curiosidade, pois sabia que Gizelly não era de fazer exigências, pelo menos não na vida pessoal. Se a baixinha fazia tanta questão de algo, era porque esse algo era importante.

- Que eu leve uma amiga – Usou o termo “amiga” livremente, pois sequer sabia se ela e Rafaella já estavam nesse nível, às vezes chegava a pensar que já o tinham até ultrapassado, mas seu cérebro a traía e fazia com que recuasse.

“PELO MENOS amigas nós somos, não é? Somos próximas demais para sermos meras colegas.”

Aquele seria o momento em que ela pensaria nos olhares trocados, e no quanto a cor verde tornara-se sua favorita. Lembraria dos arrepios que seguiam qualquer toque, por mais breve que fossem. Reviveria a imagem de Rafa limpando-se do café no banheiro da empresa, alheia à sua admiração, e o momento em que os lábios tão belos beijaram sua testa, causando um terremoto em seu corpo. Ou pelo menos deveria ser.

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