14 de abril de 1793

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Querido diário,

Meu nome é Marie-Cleménce Chevalier. Por favor, me chame apenas de Marie. Não que um caderno possa falar. Todo caso.

Moro em Provença, na França. Vivo sozinha nessa casa gigantesca com meu pai e minha mãe desde que minha irmã Blanchefleur se casou e meu irmão François foi para o seminário (cafajeste como era, quem diria?!)

Tive outra irmã, Amélie. Ela faleceu criança e nunca a esqueci. Ainda sinto sua presença às vezes. Como uma mão invisível segurando a minha quando estou só.

Recém completei 18 anos.

Sinto que deveria registrar esse período da minha vida em algum tipo de diário, pois será um período importante.

Quando eu tinha 14 anos, meu pai começou a negociar minha união com um tal de Antoine, cujo pai é um bom amigo dele que vi pessoalmente algumas vezes ao longo da minha vida.

Mas seu filho, creio que jamais conheci. Em parte porque estudou por anos em um internato na Suíça.

A ninguém menos do que esse desconhecido fui prometida em casamento.

Nossa, como me revoltei na época. Cheguei a fugir de casa. Senti muito medo e voltei. Me deram um forte puxão de orelha.

Então decidi enterrar a ideia junto com o medalhão que abre para revelar um pequeno retrato de Antoine, a única imagem que tenho dele e que me foi dada de presente. Joguei no fundo de um baú e cobri de roupas por cima.

Ao completar 18 anos duas semanas atrás, puxei de volta esse medalhão.

Respirando fundo, abri e dei uma boa olhada.

Sua aparência deve estar um pouco diferente agora. Ele é quatro anos mais velho do que eu. Se tinha 18 anos na época (e parecia já um homem, fiquei tão assustada...) agora tem 22. Parece menos intimidante.

Confio na decisão de meu pai, é verdade. Sei que ele me ama e não faria uma má escolha para mim. Fez uma boa escolha para Blanche. Tão simpático e bem-apessoado o marido dela, mesmo que eu não os veja com frequência. São meio reclusos. Tenho quase certeza de que ela é feliz.

Também devo ser feliz com esse rapaz alourado, engomadinho e sério. Aposto como pessoalmente ele sorri. Em breve descobrirei.

Muito em breve. Que medo.

Passei, depois desse dia, a vestir o medalhão. Claro que meus pais repararam e ficaram contentes.

Bem... Preciso encontrar um jeito de desviar um pouco minha cabeça desse assunto ao longo do mês que falta para eu viajar para a cidade vizinha e conhecer, enfim, meu noivo.

Já tenho uma ideia.

Uma ideia ousada.

Uma caravana de ciganos acaba de chegar na cidade, rompendo nossa mesmice.

E que festa eles fazem! Dá para ouvir de longe os violões, pandeiros e alguns outros instrumentos que nem reconheço.

Eu e minha amiga Marianne planejamos ir até a praça principal ver a feira que eles ergueram por lá.

Tenho em mente uma desculpa que rezo para que funcione - ainda que seja pecado mentir. Amém.

Não conte a ninguém.

Cordialmente,

Marie.

Diário de MarieOnde histórias criam vida. Descubra agora