18 de junho de 1793

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Querido diário,

Não estou grávida, ainda não.

Minhas regras chegaram, mensais como sempre, e ao menos sobre o que isso significa, não tenho dúvidas.

E Antoine... está agindo estranho.

Me sinto um pouco culpada. Não teria estranhado tanto suas carícias e declarações de amor se soubesse como poderiam desaparecer do dia para noite.

Durante toda a nossa estadia em Veneza ele foi o marido apaixonado de sempre. Nunca faltava um brilho em seu olhar ou sorriso em seus lábios, em tudo o que dizia respeito a mim.

Eu estava feliz... Quem não estaria feliz se sentindo amada, mesmo que sem corresponder - ainda?

Guardo com cuidado a pilha de Maries - desenhos e mais desenhos do meu rosto, meus olhos, meu maneirismo enquanto olho pela janela ou cuido das plantas no jardim. Foi como apelidei: uma pilha de Maries.

Faz um bom tempo que não o vejo desenhando a mim ou a qualquer outro modelo. Vem deixando de lado tudo o que o distraía e alegrava.

Está perigosamente próximo de ser o rapaz que seu pai sempre quis que ele fosse.

Sério, dedicado somente aos estudos dos temas mais chatos do mundo. Trabalhando, editando documentos, debatendo política.

Não reconheço o jovem alegre, encabulado, meio bobo que beijou minha mão no primeiro dia. Não reconheço. Desapareceu num passe mágica.

Então faço a única coisa que poderia fazer: investigo. Onde aconteceu aquela mudança?

Seu afeto visível por mim e bom humor terminaram junto com nossa lua de mel.

Lua de mel... Inícios.

O casamento amargou assim tão rápido? Não sei, com certeza nunca fui casada antes. É possível que algo assim aconteça.

Talvez aquilo que eu - e ele - julgávamos como amor fosse apenas empolgação inicial.

E aqui estou, como prenda de feira popular. Como boneca esquecida no fundo do baú de uma garotinha, de Genevieve.

Abandonada depois do encantamento breve de quando foi presenteada, impecável, em uma caixa forrada em cetim com laçarote.

Por quê...?

Não sei.

Avançando um pouco da fase de me culpar, fui perguntar a alguém que o conhece muito bem. Alguém que lhe deu a vida. Sua mãe. A mesma que eu não suportava, tão fútil...

Bem, eu iria descobrir como aquela futilidade era ela no seu melhor.

Havia o pior.

Encontrei-a sentada, bordando ponto-cruz.

- Olá, belle-mère. - saudei, procurando soar simpática e não transparecer a apreensão que sentia.

A madame ergueu o olhar para mim por aproximadamente meio segundo.

- Olá, Marie-Cleménce. Tudo bem? - indagou espetando agulhas e puxando linhas, muito atenta outra vez.

- Sendo sincera, não muito. - retruquei sentando-me próxima a ela.

- Ah é? Por quê? - Ergueu uma sobrancelha, ainda soando um bocado indiferente.

- Antoine. Ele está agindo estranho.

- Notei. - replicou.

Uma onda de esperança me invadiu. Não iria durar. Durou o tempo em que levei para perguntar, ingênua, qual ela imaginava ser a razão.

Diário de MarieOnde histórias criam vida. Descubra agora