20 de maio de 1793

63 6 14
                                    

Querido diário,

Foi divertido.

Mesmo que eu sempre termine carregando alguma coisa pesada nesses passeios. Dessa vez carreguei, para cima e para baixo, uma menina.

Nunca estive tão feliz de ter uma ruivinha agarrada com firmeza no meu pescoço. Ou uma amiga ao meu lado, hoje sorrindo um pouco mais.

Marianne não parecia completamente bem. Parecia melhor, o que já era um alívio. Talvez minhas palavras tenham ajudado.

- Sou tão grata por vocês estarem comigo. - comentei.

- Ah, Marie, é um prazer. - replicou alegre.

A peste tinha adormecido no meu colo e isso a deixava ainda mais pesada. Um anjinho bochechudo, quase igual à boneca que trazia de tiracolo e a irmã agora carregava. Quem vê nem imagina.

Caminhávamos pelas rústicas ruas da comuna. Até que tinha suas belezas e distinções. Produtos à venda que eu não via em Provença. Novos rostos, novos cães e gatos de rua roçando contra nossas pernas.

Novas crianças indomáveis correndo por aí para a pequena Genevieve fazer amizade.

E o mar... É uma região costeira. O vento fresco, rejuvenescedor do mar está sempre agitando nossos cabelos.

Adoro campos e jardins, adoro ainda mais o oceano.

Me lembra liberdade.

Genevieve começou a se agitar em meus braços.

- Parece que alguém acordou. - assinalei afetuosa, colocando-a de volta no chão.

Marianne entregou a ela sua boneca e voltou a segurá-la pela mão. Ainda sonolenta, não parecia disposta a fazer grandes confusões.

- Bonita cidade. - reparou Marianne, olhando ao redor distraída. - E seu noivo, Marie?

- Ah... - Não era meu assunto preferido e eu estava grata por afastá-lo da mente, mas não poderia durar. - É um ótimo rapaz. Boa personalidade, me trata muito bem. Acho que serei... feliz com ele. Ontem ele até me deu um beijo.

Marianne ergueu as sobrancelhas.

- Eca... - interveio a garotinha. Nós duas rimos. Estávamos chegando em uma pracinha cheia de outras crianças, ali poderíamos deixá-la por um momento, sentando perto para conversar.

- Um beijo? - implicou minha amiga.

Ah, por que eu disse isso? Ela não me deixaria escapar. Assim como não deixou naquele dia, você sabe a respeito do quê.

- Um beijinho seco sem graça quando estávamos sozinhos no jardim. Mas... Antoine é um amor, de verdade. Tenho sorte. - Encarei o vazio.

Agora era sua vez de notar algo de errado na minha expressão.

- Você gosta dele. Não o ama. - disse com objetividade.

- Bem... Se fosse você, amiga, você conseguiria amar um homem que mal conhece? - repliquei sem disfarçar os sentimentos na minha voz, olhando para ela.

- Não... Tem algo a mais aí, Marie. - ponderou suave. - Sei que tem. Mas você guarda meus segredos e também guardarei os seus. Não precisa me dizer.

Sorri emocionada e a abracei sobre o banco onde estávamos.

- Uma sorte que sem dúvida tenho é a de ter na minha vida você e a pestinha. - complementei. - E você não está errada. Imagino que seja comum, quando nosso destino não é nossa escolha, alguns assuntos pendentes por resolver.

Diário de MarieOnde histórias criam vida. Descubra agora