12 de agosto de 1793

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Querido diário,

Dois dias depois de cavalgar com Áurea, acordei indisposta, vomitando até as tripas. Mal conseguia me alimentar e a fraqueza me confinou à cama.

Meu primeiro pensamento foi o quanto era inconveniente adoecer agora. Eu tinha conseguido com que Ignus começasse a arranjar nosso casamento e talvez aquilo atrasaria tudo.

Geralmente as pessoas não morrem de indigestão. Iria passar. Sabia precisar me hidratar bastante e comer bem, na medida do possível.

Eu prostrada na cama e os outros me visitando, cuidando de mim.

Primeiro Ignus, me fazendo um carinho bem-vindo e me vendo em péssimo estado ao me providenciar um balde para que eu vomitasse de novo.

Depois sua mãe, com gestos habituados. Me trazia uma canja de galinha e água. Também raízes para mastigar, disse fazer bem ao estômago.

E me olhava com expressão estranha.

Encostou uma mão morena em minha testa.

- Você não está com febre. - assinalou.

- Acho que não. - concordei.

- Nem com desinteria.

- Não.

Deu uma pausa, respirando fundo ao pé da minha cama.

- Então, menina... Não sei o que você e meu filho andam fazendo juntos tarde da noite, pelos cantos, e não julgo, porque já fui jovem, já fui apaixonada. Também conheço o que significa um vômito sozinho, sem febre ou desinteria. Deve ser gravidez.

- Gravidez?!

Levantei sobre a cama com a perplexidade e minha visão embaçou como se eu fosse desmaiar. Me apoiei de volta no mesmo segundo.

- Isso foi vertigem? - emendou Amarílis, paciente. - Também faz parte. Gerar um filho, ou dois de uma vez, como foi comigo, tem seus desconfortos.

- Como pode ter certeza...?

- Eu tenho.

Seus olhos verdes e sábios brilhavam. Parecia bem feliz.

Não devia estar.

- Eu e Ignus logo vamos nos casar. - afirmei na defensiva, mesmo que ela soubesse.

- Sim... Não se preocupe. - esclareceu, adivinhando meus pensamentos. - Não posso negar como ciganos também têm suas regras, seus conservadorismos. Ainda assim, somos menos cruéis e rígidos. Ninguém vai falar em ilegitimidade ou te expulsar, Marie. Pelo contrário, fico felicíssima.

De fato, seu rosto se iluminava em um tipo raro e pleno de alegria.

- É mesmo? - Sorri de volta, ainda me sentindo mal. Pelo menos já não parecia prestes a desmaiar. - Minha mãe também ficaria. Na última vez em que a vi, me pediu netos. Claro que com meu primeiro marido, mas quem poderia prever? Eu sinto... Sinto falta dela.

- Acredito que a verá outra vez um dia. Ela é outra que acreditaria na sua inocência, não é?

- Com certeza... - murmurei. - Uma família muito amorosa, em particular meus irmãos. Mas... E Ignus? Serei eu a dar a notícia a ele?

- Acho adequado que dê quando estiver pronta, e se sentindo melhor.

- Talvez ele queira saber que isso que tenho não é doença, afinal, já que a senhora tem tanta certeza. - resmunguei, mordiscando o pão que acompanhava a sopa ao me recuperar do susto. Aquilo parecia algo que iria parar em meu estômago, eu esperava.

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