26: priorem

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Assim como as mais fortes árvores nascem de sementes tão pequenas que chegam a ser insignificantes, a maior reviravolta dos países lorianos nasceu de um funeral

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Assim como as mais fortes árvores nascem de sementes tão pequenas que chegam a ser insignificantes, a maior reviravolta dos países lorianos nasceu de um funeral.

Não levem-me a mal. Não estou afirmando que a morte de uma pessoa é insignificante – aliás, afirmar isto seria irônico, em minhas circunstâncias. Mas é preciso se lembrar de que, em um país como Irbena, a partida da alma de um ser humano era algo tão comum que os moradores das vilas tendiam a achar esquisito, quando se passava mais de um mês sem uma ocorrência dessa.

Mas, como dizia, a semente deste problema começou a crescer debaixo da terra. Quando o corpo de Bóris Prior foi enterrado nos campos aos arredores da casa de seus dois irmãos mais velhos, Pitra e Tom.

O céu daquela tarde estava pintado de um azul forte. A grama ao redor do túmulo, que era acolchoado por uma camada de terra fresca e acompanhado de uma lápide grossa, estava verde e  brilhante. Os passarinhos aos arredores cantavam incessantemente. As árvores davam frutos. Era como se nada houvesse acontecido. Com exceção das almas pesarosas de Tom e Pitra, que encaravam o túmulo com olhos vermelhos e inchados, o mundo estava completamente feliz.

Pitra olhava para a terra à sua frente como se fosse capaz de trazer o garoto de volta à vida a qualquer momento. Seus lábios arroxeados tremiam e seus olhos castanhos pareciam ter secado, após tantas lágrimas expulsadas de si. Os cabelos escuros voavam sobre seu rosto, mas ela não movia um fio sequer. Era como se estivesse morta.

— Ele havia acabado de fazer amigos — comentou, com a voz rouca e amarga. — Trouxe para casa algumas das artes que havia feito. Estavam intactas, sem um borrão sequer, sabia? Ele estava feliz.

Tom balançou a cabeça em negação. Também olhava para o chão frio que cobria o corpo de seu irmão, mas seus olhos estavam mais vivos – ou menos mortos – do que os de Pitra.

— Não — disse, simplório, após um longo tempo em silêncio. — Não é o momento para falar disto.

A irmã trouxe um tom de vivacidade para seu rosto ao franzir o cenho para o irmão. Ele continuava a evitar seu olhar. Então, ela levou sua mão ao braço dele.

— Ele está morto, Tom — afirmou, como se tal fato precisasse de lembretes. Seus olhos secos pareciam prestes a encontrar a umidade novamente. — Ele morreu.

A face do irmão não mudou perante a constatação. Talvez, isso funcionasse para mover o coração de outras pessoas. Mas Tom não precisava acordar para a realidade. Ele já estava ciente dela.

— Maldita doença dos infernos — foi tudo o que fez: xingou. Depois disso, deu as costas ao amontoado de terra que, um dia, havia sido Bóris Prior e saiu andando em direção à casa.

Pitra engoliu em seco, surpresa com a atitude fria do irmão. Ela virou-se para ele, com o rosto suplicando por alguma demonstração de que não sofria sozinha. De que podia chorar nos ombros de alguém da família.

— Tom — exclamou às suas costas, com a voz tremulando. — Por favor, Tom. Não faça isso. Não deixe-me sozinha da mesma forma que fez quando mamãe morreu. Eu imploro.

O homem parou sua caminhada. Encarava o horizonte à sua frente, ainda de costas para ela.

— O que quer que eu faça? — murmurou, tão baixo que Pitra mal pôde ouvir sua voz sair. Depois, virou-se para ela, com a face cheia de raiva. — Quer que eu o traga de volta? Hein? Quer que diga que nosso irmão de doze anos morreu, mas que está tudo bem, porque ele teve uma vida feliz? Que está tudo bem, porque temos memórias boas? Porque ele está com nossos pais? Hein!? — Tom maltratou a figura fragilizada da irmã com o olhar irritado, mas seu rosto também começava a molhar de lágrimas. — Diga, mulher!

— Apenas quero que esteja aqui! — ela berrou, em prantos. — Ao menos uma vez!

Tom bufou para si mesmo, em negação.

— Como se isso resolvesse algo.

Pitra encarava-o como se sua vida dependesse disso. Mas, ao perceber a falta de conexão que havia entre os dois, seu olhar vazio caiu para o chão, em desalento.

O irmão, então, respirou fundo e virou-se para sua direção anterior, pronto para entrar em casa e continuar com a próxima luta diária, como se nada houvesse acontecido. Mas algo o fez parar.

Do outro lado dos campos, na estrada que dava para o portão de madeira da residência, aproximavam-se dali dois cavalheiros montados a cavalo. Eles vestiam suas armaduras prateadas de guerreiros, mas as mantas de tecido vermelho sobre as montarias indicavam ação do solo real. Eram cavalheiros da coroa de Irbena.

— Pitra — chamou Tom, com o maxilar endurecido. — Olhe.

Com a postura cabisbaixa, a irmã levantou a visão para o ponto indicado. Mas, ao ver o que se aproximava deles, seus olhos arregalaram-se no mesmo momento. Ela andou até encostar-se no ombro do irmão, amedrontada.

— São os homens do rei — disse, com a voz ainda mais altiva do que antes. — Será que...

— Provavelmente. — Tom fez que sim. Sua respiração acelerava. — Prepare-se.

Ansiosos, os irmãos esqueceram-se da tristeza que carregavam, por um só minuto, e caminharam até o destino que os esperava após o portão de madeira.

Tudo parecia se tratar de um simples funeral. Mas a história desses dois será deixada para mais tarde.

Mas não se preocupe, eles voltarão no tempo certo.

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Muito obrigada pelos 1.400 votos! Fico muito feliz que estejam apoiando Vossa Alteza desse jeito.

O próximo capítulo será grandão, já deixo avisado! Hahaha

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