Para aqueles que se importam com a informação, Enrico ficou bem. Sua alma foi acolhida graciosamente pelo frescor da eternidade, enviada a um plano em que a carne humana não tem poder de interferência.
Já o que restou de si na Terra – digo, suas memórias na mente dos que ficaram –, permaneceu em estado obscuro e hostil por um longo tempo.
Naquela manhã, Margareth se sentava sobre o acolchoado de seu quarto, observando a cortina escura que cobria a porta da varanda e impedia qualquer luz forte de adentrar entre as quatro paredes. Já havia se passado uma semana completa desde que ela voltou de sua viagem a Irbena. E ainda não havia arriscado sair de seus aposentos.Naquela manhã, ela pensava sobre Eleanor. A mulher havia passado metade dos dias ao lado de Marga, na esperança de que pudessem se curar com a ajuda uma da outra. Mas a dama não parecia disposta a passar por esse processo tão cedo. Era doloroso demais, dar as costas à última imagem que teve de seu irmão.
Então, Eleanor se foi para sua casa. A nova, aquela que costumava pertencer a Rosa Allboire. Disse que escreveria, já que não possuía muito a se fazer em uma vizinhança nova. Margareth estava tão absorta em sua própria dor que mal pareceu notar o momento em que ela foi embora. Agora, que se encontrava um pouco mais acordada para a realidade ao seu redor, não queria ter deixado ela ir. Pensou na possibilidade de ir visitá-la, quando pudesse.
Ela parou os pensamentos para amaciar suas têmporas, que começaram a doer incessavelmente, a partir do terceiro dia de choro. Ela já havia chorado naquele começo de dia, quando acordou de um sonho em que Enrico fazia seu café da manhã.
Parecia que, quanto mais o tempo passava, mais ela sentia os sintomas de ter metade de quem era arrancado de si à força. Agora, enfrentava o estágio da dor física. O que significava que, ao menos, não teria que focar tanto na emocional.
Desencostou os dedos de sua cabeça quando ouvir alguém bater três vezes à porta do quarto. Ela esperou, ainda prostrada em sua cama, até que abrissem. Não estava em condições algumas de gritar para que entrassem. Esperava que quem quer que estivesse do lado de fora soubesse disso.
Quando a porta foi empurrada para dentro, a cabeça loira e branca de Anastácia surgiu no vão, junto com a luz do lado de fora.
— Margareth — ela disse, com a voz baixa. Pela primeira vez, não havia tanta animosidade em seu semblante. Parecia absorver a depressão que assolava o clima daquele espaço sombrio.
A dama abriu um sorriso entediado para a mais nova. Ela entendeu que podia entrar e se aproximou da cama.
Vivian surgiu logo atrás de si, fechando a porta após adentrar o quarto. Era apenas elas duas, sem o terceiro membro de seu trio clássico.
— Isso virou uma caverna — brincou a loira, enquanto caminhava para abrir as cortinas do quarto. — Não se importa? — indagou, com as mãos sobre o tecido ainda fechado.
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Vossa Alteza | ⚢
Fiction HistoriqueLIVRO UM. Em meio a uma guerra civil inabalável, a camponesa Margareth Allboire é vítima de um misterioso ataque em sua vila, situada no leste de Irbena, e precisa lidar com o novo lar que passa a habitar contra sua vontade. Certa de que o castelo d...