trinta e cinco

13.1K 1.5K 254
                                    

Não fui castigada

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Não fui castigada. Parece que levaram esse lance de perdão muito a sério, porque nenhuma varada foi depositada sobre a palma das minhas mãos, apesar de eu ter sofrido tais ameaças. "Saia da linha novamente e eu não vou poder passar a mão na sua cabeça da próxima vez", disse o padre. É errado odiar um servo de Deus? 

Levei um baita de um sermão, e apesar de não ter machucado minhas mãos, não escapei do castigo. Preciso ajudar na limpeza da Igreja, nos afazeres da cozinha e até mesmo limpar os banheiros, caso necessário. É uma espécie de aviso. Mas não reclamo; vai ser bom manter a mente ocupada, longe de San Diego e daquele que eu me proibi pensar no nome. 

Os dias passam lentamente e se tornam cada vez mais cinzas. Ainda choro à noite quando todas as noviças vão dormir, bem baixinho para não acordá-las. A cura é um processo lento e doloroso, mas parece que o destino não está aliviando a pressão para mim. Pensei que um dia seria melhor que o outro, mas toda vez que acordo e um novo dia começa, me sinto pior do que antes. 

Sinto saudade de casa. Não a casa da minha mãe a poucos quilômetros da Igreja, mas da casa que construí em San Diego. Aquele pequeno apartamento onde eu e meu irmão passávamos espremidos lado a lado para chegar até o quarto. Sinto saudade de trabalhar na lanchonete, e até mesmo de limpar a bagunça deixada pelas crianças no chão por causa do sorvete derretido. Sinto falta das piadas insinuativas de Agnes, do abraço apertado do meu irmão e… sinto falta dele. 

Ryan, de alguma forma, faz parte de mim. Ficar sem ele, sem falar com ele, é como ter um dos meus órgãos retirado à força. Fico me perguntando se ele sente falta de mim, dos nossos momentos juntos, ou se apenas está seguindo a vida dele como se eu nunca tivesse existido. Se encontrou outra pessoa… esses pensamentos me matam por dentro; é pior do que qualquer método de tortura medieval. 

Estou em uma mesa isolada no refeitório. Não quero papo. Desde que cheguei, as meninas querem saber o que eu fiz, e muitos boatos correram durante minha ausência. Algumas garotas falaram por aí que eu tinha entrado no mundo das drogas. Quanta bobagem. Não forneço nenhuma informação com finalidade de fofocas. Essas meninas não são minhas amigas; ninguém aqui é. Então eu apenas acordo, faço meus afazeres até a exaustão e desabo na cama na hora de dormir. Então eu acordo e a rotina se repete. É um ciclo. 

— Posso sentar aqui? 

Ergo o olhar do meu prato de comida intocável e vejo uma garota de olhos azuis cintilantes me encarando, segurando uma bandeja com a comida do dia, suco e uma laranja. Não a reconheço. Deve ser nova. 

Apenas dou de ombros. Ela leva isso como uma afirmativa, e se acomoda à minha frente. Baixo o olhar para o meu prato novamente e continuo cutucando o purê de batata sem graça com o garfo. 

— Não vai comer? 

— Não. — Digo secamente, sem erguer o olhar do prato. 

— Reparei que não tomou café da manhã. Se continuar sem se alimentar, vai acabar desmaiando pela fraqueza. 

Indecente • COMPLETO Onde histórias criam vida. Descubra agora