10 Capítulo

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“O que mata um jardim
Não é mesmo alguma ausência
nem o abandono…
O que mata um jardim
É esse olhar vazio
de quem por ele passa indiferente.”
Mário Quintana, Jardim Interior.

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                       Às escondidas

– Tem certeza de que ainda quer fazer isso? – perguntou Nia pela décima vez, enquanto pegava uma roupa para mim no guarda-roupa.

– Tenho – respondi, largando o pente em cima da cama. Ela me entregou um vestido e óculos de sol.

– Ligue assim que na chegar à igreja, e não esquece de me ligar quando sair de lá – instruiu, guardando o pente que deixei jogado.

– Eu mando – respondi sorrindo. Mas meu sorriso tinha um tempo contado de vida. – Agora vai ver se o perímetro está limpo.

Ela saiu de fininho pelo quarto e voltou depois de alguns momentos, gesticulando para eu andar logo. Dei um beijo em Nia e saí do apartamento.

Seriam quase nove horas de viagem e eu não pretendia parar nem se minha bexiga estourasse. Eu já tinha saído de casa tarde, se eu não me apressasse chegaria assim que a cerimônia começasse.

Fiz a viagem em oito horas. Estacionei o carro a duas quadras de distância da igreja e respirei fundo. Meu celular acabou ficando fora de área quase o caminho inteiro, então acabei desligando para economizar bateria, pois nem eu nem Nia pensamos na hipótese de ela acabar no meio da missão. Antes de sair do carro, resolvi ligar o aparelho para avisar Nia que eu estava bem.

Nia♡

Ferrouuuuu! Elas descobriram!
ABORTAR MISSÃO! 11:30 AM

Pelo amor de Deus, não conversamos sobre o celular desligado? Cadê você? 11:32 AM

Você contou para ela.
Sua bêbada burra, VOCÊ CONTOU! 11:40 AM

Merda. Será que eu realmente contei para a Lena ontem? Por que fui encher a cara? Era bem típico eu estragar tudo. Embora meu histórico de amizade fosse péssimo, eu duvidava que Nia tivesse aberto o bico. Eu, por outro lado, me achava muito capaz de ter chorado no ombro de Lena ontem.

Como eu era patética. Mas agora que já estava aqui não perderia a viagem. Mandei uma mensagem para a Nia, dizendo que estava bem e que já tinha chegado.

Quando cheguei, as portas da igreja já estavam fechadas, como imaginei que estariam, mas avistei o carro da noiva na esquina. Era minha chance, então acabei fazendo uma corridinha até a porta lateral da igreja e entrando em um salão anexo, com a esperança de não ser vista. Acabou que dali eu tinha uma
ótima visão da entrada e, acima de tudo, a salinha me esconderia dos olhos alheios, por ser bem atrás de onde os bancos começavam. Dei uma espiada no noivo, que já estava no altar.

Ele estava num smoking branco, tinha o olhar apreensivo e sorria para as pessoas da primeira fila. Seus pais eu supunha. Que, aliás, nunca foram com a minha cara, então obviamente não deviam ter se preocupado com seu filhinho arruinando minha vida.

A marcha nupcial começou a tocar e meus olhos marejaram. Era agora, eu não tinha mais para onde fugir. Se eu saísse, ela me veria, então aguentei firme atrás da porta, olhando pela pequena abertura, com as pernas bambas. De onde eu estava, tinha a visão do lado esquerdo da igreja, o lado por onde ela entraria.

A primeira lágrima escorreu pelo
meu rosto, e Imra fez sua grande entrada. Eu não podia negar, ela estava linda. Não era uma mulher propriamente bonita, mas tinha algo que chamava a atenção por onde passava. Seus cabelos Castanhos estavam soltos e repletos de cachos, e seu vestido era de uma tonalidade bege, dando-lhe um ar clássico. Ele era apertado no busto e solto na cintura… Oh. Meu. Deus! Sua barriga, ela estava…

Apertei bem os olhos, fazendo as lágrimas rolarem soltas pelo meu rosto e pingarem no decote do meu vestido. Tapei minha boca com a mão para não gritar e dei continuidade à minha tradição: olhei para o noivo. Ele sorria para ela, era o bastante. Virei-me para ir embora e vi Eve parada atrás de mim.

– Você já vai? – perguntou com os olhos marejados. – Não vai ficar para tentar impedir essa loucura? – Antes que pudesse responder, um vulto entrou na sala: Lena parecia em pânico e extremamente cansadola. Mas por sua expressão, ela tinha ouvido a pergunta e aguardava a resposta, me olhando intensamente. Me analisando, me sentindo, me apoiando… Eu sorri em meio às lágrimas e ela me estendeu a mão. Olhei para Eve uma última vez.

– Eu já vi o bastante – respondi, pegando a mão de Lena. Estava quente. – Eu só queria um fim, e parece que consegui. Agora é a vez de eles começarem… – Deixei um soluço escapar e Lena me puxou para um abraço, não sem antes beijar minha testa. Após alguns segundos, ela se afastou e me puxou pela mão, e saímos da igreja…

– Onde está seu carro? – perguntou ela, assim que ganhamos certa distância da igreja.

– A duas quadras, por ali – respondi. Ela continuava com a mão presa na minha. – Você não veio de carro?

– Não – respondeu me olhando feio. – Peguei um avião.

– Por quê? – Por que ela pegaria um avião para me encontrar?

– Para ter certeza de que você não faria nenhuma besteira. – Ah, claro. Ela não confiava em mim.

Chegamos ao carro e ela me pediu as chaves para poder conduzir,  ela ligou o GPS e não encontrou problema em se virar sozinha para sair de Metrópolis.

A Garota dos Olhos Verdes - SupercorpOnde histórias criam vida. Descubra agora