8 Capítulo

3.7K 426 84
                                    

“Um amigo me chamou pra cuidar da dor dele, guardei a minha no bolso e fui.”

Caio Fernando Abreu, Pálpebras de neblina.

               **************************
Uma gentileza conserta qualquer  
                  coração partido

Acordei de sobressalto e afundei novamente na cama ao me lembrar da cena de ontem. Um casamento. Será que eu receberia um convite? Senti-me enrubescer, não acreditava que tinha pedido a Lena que ficasse comigo. Na verdade, não acreditava que ela tivesse aceitado. Mas sou grata por isso, teria sido pior enfrentar a notícia sozinha. Meu coração doía de forma tão violenta que eu podia senti-lo subindo pela minha garganta e tentando me sufocar. Caí no choro novamente abraçando Krypton,
que a essa altura já tinha vindo dormir comigo na cama. Afundei o rosto no pelo sedoso do meu cachorro, sentindo seu cheiro conhecido, o cheiro de casa. Algo se mexeu no pé da cama e eu levantei o tronco para olhar, imaginando que fosse o gato. Ou a gata (na verdade para mim ela era “o gato”, mesmo). Mas tomei um grande susto ao ver uma pessoa sentada aos meus pés.

A garota parecia uma boneca. Pisquei algumas vezes só para ter certeza de que estava acordada, estava quase beliscando meu próprio braço quando ela sorriu. Duas lindas covinhas apareceram em suas bochechas rosadas. Ela era branca do cabelos pretos, e dona de um par de olhos lindos. Eu conhecia aqueles olhos… Ela era realmente linda e suas feições eram doces, mas nada disso vinha ao caso. O que ela estava fazendo na minha cama?

– Bom dia – cumprimentou alargando o sorriso. – Eu sou Nia, sou irmã da Lena. – Estava explicada a fonte da beleza, que pelo visto, deveria ser de família.

– Bom dia – respondi, mas bom só se fosse o dela. – Onde ela está? – questionei. Não que eu tivesse imaginado que ainda o encontraria no meu quarto.

– Ela teve que trabalhar, surgiu uma emergência com um de seus pacientes – respondeu.

– Então agora eu tenho uma babá? – perguntei sarcasticamente enquanto me sentava. Parte de mim estava arrependida de ser tão grosseira com uma moça de aparência tão gentil, mas definitivamente estava ficando cansada da piedade das pessoas.

– Na verdade você tem uma acompanhante. Estou ganhando por hora. Então o que vai ser? – perguntou, fingindo desabotoar a blusa e, percebendo minha cara de assustada, ela caiu na risada. – É brincadeira. Bom, pelo menos a parte do pagamento e dos serviços extras. – Continuei calada. – Ok,
eu decido por você, vamos à praia.

– Só pode ser brincadeira. A idiota foi trabalhar e me deixou sob a guarda da irmã.
Rindo alto ela se levantou.

– Vamos?

– Não vai dar não, me desculpa. Eu cheguei há dois dias e ainda não faço ideia de onde estão meus biquínis.

Parte da história era verdadeira, afinal, no dia do restaurante, eu tinha demorado horas para acha uma calcinha (como se ela pudesse ser descrita desse modo). Quanto tempo demoraria até achar um biquíni? E a outra parte era pura falta de vontade mesmo. Na verdade, esperava encontrar Lena em
casa e pedir um vidro inteiro daquele comprimido.

– Seus biquínis estão na terceira gaveta do guarda-roupa.

– O quê? – Eu tinha entendido, só não entendi o contexto.

– Você dormiu por um longo tempo. Já é quase meio-dia e eu fiquei meio entediada – justificou-se, levantando meio envergonhada e abrindo as portas do guarda-roupa, antes vazio.

Tudo o que eu tinha estava arrumado, dobrado ou pendurado.
O quê? Definido por cor e estação do ano?
É isso mesmo, produção?
Eu estava horrorizada. Como ela conseguiu fazer tudo isso, sem ninguém obriga-la e em tão pouco tempo?

A Garota dos Olhos Verdes - SupercorpOnde histórias criam vida. Descubra agora