11: Os Valores de um Rosier.

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JANEIRO, 1977

Insuficiente.

Evan sentia como se o título estivesse estampado em sua testa: você não é o suficiente. Não importava o quanto ele se esforçasse, o quanto ele tentasse se mostrar capaz, Marcus nunca iria olhá-lo como suficiente. Ele conhecia todos os valores que um Rosier deveria ter, e ele tentava, como ele tentava. Afinal, sua infância não foi muito diferente de qualquer infância de um garoto de classe alta no mundo bruxo. Evan sempre teve tudo do bom e do melhor, morando numa casa enorme, com todos os privilégios possíveis. No entanto, junto com esses luxos, veio uma carga de expectativas quase impossíveis de serem cumpridas.

Evan foi o verdadeiro aluno de seu pai, que lhe ensinou que este era superior a todos por ter um "sangue-puro", um "sangue-limpo", pais e familiares bruxos, e também foi ensinado que qualquer um que não fosse igual, era inferior e repulsivo. Marcus também ensinou como deveria agir com as pessoas, como deveria agir se quisesse demonstrar o seu valor: os valores de um Rosier.

Seu pai, usando como exemplo a sua mãe, ensinou que em uma relação homem-mulher era Evan quem deveria mandar, era Evan quem deveria criar as regras, e se fosse necessário, era Evan quem deveria punir. Além de tudo, seu pai ensinou que os feitiços eram bons, eles poderiam machucar e punir, mas nada era melhor que usar os punhos, onde ele poderia sentir tudo com mais intensidade.

Seu pai também lhe ensinou como lidar com a dor, como segurar as lágrimas, e ser forte apesar de qualquer circunstância. Seu pai brigou com sua mãe, todas as vezes que ela limpou o sangue de Evan, chorou junto dele ou limpou suas lágrimas. Seu pai xingou sua mãe, todas as vezes que ela tentou intervir em cada um dos "ensinamentos" sobre agressão, acusando-a de tentar tornar Evan fraco como uma menina.

"Você está se tornando o garotinho da mamãe, Evan".

Conforme Evan crescia, um ódio fervente pelo pai se enraizava em seu coração. Cada vez que ouvia a voz de Marcus, sentia um arrepio de repulsa. Cada toque, cada ato de agressividade, fosse direcionado a ele ou à mãe, só aumentava o fogo dessa aversão. Mas, o que mais o aterrorizava era a percepção de que estava se transformando em uma nova versão de seu próprio pai.

A semelhança em gestos, olhares, até mesmo na maneira de falar, era uma realidade que o assombrava. Cada vez que se reconhecia em um traço do pai, sentia um misto de nojo e desespero. A ideia de se tornar o que tanto odiava era uma angústia que o consumia por dentro. Mas não havia nada que ele pudesse fazer para mudar isso.

Evan encarava seu próprio reflexo no espelho do banheiro com uma mistura de desespero e raiva. Cada traço de seu rosto, cada detalhe, parecia um cruel lembrete de seu pai. Os olhos, a boca, o nariz, tudo era uma cópia quase perfeita. Era como se estivesse carregando o fardo de sua herança, uma marca indelével de sua linhagem. A raiva incontrolável o atingia novamente, fazendo seus punhos se cerrarem com força. A imagem refletida no espelho parecia desafiá-lo, como se estivesse zombando dele por estar preso a essa realidade. Era difícil conter a vontade quase infantil de desferir um golpe contra o espelho, como se assim pudesse quebrar essa conexão indesejada.

Enquanto estava imerso nesses pensamentos turbulentos, uma batida na porta do banheiro o tirou de seu transe momentaneamente. Ele bufou, irritado pela interrupção. A última coisa que precisava era de alguém incomodando-o naquele momento.

— O que é, caralho? — respondeu com a voz carregada de frustração, sem abrir a porta.

— Não quero atrapalhar seu momento de auto-prazer, mas eu preciso mijar.

BLACK BEAUTY / JAMES POTTEROnde histórias criam vida. Descubra agora