Capítulo 4.1 - Barrim

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(O capítulo 4 foi dividido em 2 partes para melhor caber no "formato Wattpad")

A história até agora: Com a ajuda de seu amigo Clérigo Barrim, a aprendiz Tassadara conseguiu chegar a tempo na prova de luta, encarou mais da metade de seus colegas serem reprovados, mas conseguiu vencer seu oponente e passou a merecer o título de Clériga.

Tassadara sentiu uma energia quente e confortante envolver sua cabeça e descer pelo corpo, gerando uma redução quase imediata da sua dor. Estava sentada sobre uma pedra num canto do campo de luta, depois de o frenesi da comemoração ter cessado.

- Pronto, agora ficou ótima. Está enxergando bem? – perguntou Ana, a ainda aprendiz. Por ter sido reprovada na prova de luta, Ana não podia ser chamada oficialmente de clériga, mas isso não mudava o fato de que já dominava a canalização do poder daquela a quem seguiam: Jade, a deusa da cura e da paz.

A paciente abriu os olhos e, ao constatar que enxergava com ambos, confirmou com a cabeça. Um alívio, depois de não conseguir mais abrir um deles, de tão inchado que ficara com o espancamento que sofreu na prova de luta. Enxergou a colega com o cabelo escuro já solto, caindo em uma linda moldura ao redor do seu rosto.

Vinda do lado, a voz de Barrim perguntou:

- Já acabou? Sei não, acho que ficou torto. Ou será que já era assim mesmo?

Ana examinou preocupadamente o rosto de sua paciente. Deixar uma sequela estética em uma cura tão básica repercutiria terrivelmente entre seus colegas de trabalho da ala hospitalar da Igreja.

- Tenho certeza de que está ótimo. – disse Tassadara, segurando a mão de Ana, impedindo-a de continuar mexendo na sua cara. Conhecia bem as piadinhas do amigo. Agradecendo-a, a mais nova clériga da Igreja de Jade se levantou, colocou as mãos na cintura e encarou aquele que costumeiramente estava ao seu lado – E então?

Estava com a gola da camisa manchada pelo próprio sangue, a roupa toda suja de terra e o cabelo desbandalhado com vários pontos misturados de vermelho e terra. Barrim não podia estar mais orgulhoso! Deu um passo rápido a frente e agarrou a amiga em um abraço apertado, tirando-a momentaneamente do chão. Ana sorriu com aquele gesto, o qual durou mais que o tempo tradicional de um abraço entre amigos. Tassadara retribuía o aperto e ambos pareciam realmente sentir um ao outro. Além do orgulho, ali havia alegria e gratidão. O clérigo mais antigo sussurrou:

- Eu sabia que conseguiria.

Ela abriu os olhos. Manteve o sorriso, mas sussurrou de volta:

- Mentira.

Os dois finalmente se soltaram. Ele continuou olhando-a com o mesmo semblante carinhoso e confirmou:

- Mentira.

Tassadara riu. Confessou, um tanto sem graça:

- Enquanto lutávamos de pé, eu estava bem esperançosa de que iria ganhar. Mas quando ele me derrubou... foi como se meu mundo inteiro caísse. Cheguei a pensar que merecia aqueles socos.

Barrim colocou a mão no seu ombro.

- E merecia mesmo.

- Gente! – interpelou Ana, causando surpresa aos dois por ainda estar ali – Que linda a relação de vocês! Vocês dizem a verdade!

- Ele sempre me disse a verdade – confirmou Tassa, olhando de rabo de olho para o amigo. Ainda deixava transparecer a admiração que tinha por ele – desde o dia 1 da nossa amizade.

- Desde antes disso. – corrigiu-a – Lembra do seu primeiro dia lavando as louças do almoço, anos atrás? – virou-se para Ana – Ela empilhou todos os pratos ensaboados, todos, mais de cem, para só então começar a enxaguá-los. Eu cheguei perto e disse: "Vai cair". E caiu.

- Você veio sorrateiramente por trás e me deu um baita susto! Foi por isso que eu derrubei tudo!

- Ainda assim, eu disse a verdade. Ai! – reclamou ao receber um soco no ombro – A prova já acabou!!

Ana riu alto. Trocou mais uma meia dúzia de frases com a dupla e se despediu, não sem antes defender Barrim, dizendo que o jeito como ele andava não era sorrateiro, e sim gracioso. Tassadara fez o seu melhor para engolir o riso. Tão logo ficaram sozinhos, destilou a ironia:

- E aí, gracioso, quando vai chamar ela pra sair?

- O dia em que ela ficar interessante.

- Ui... essa doeu até em mim. Ela claramente gosta de você, e eu achava que os homens quisessem as mulheres bonitas e disponíveis.

- Bom, primeiro deixa eu te dizer que ela acha que a gente namora.

- O quê?! – exclamou verdadeiramente surpresa.

Ele sorriu.

- Você sabe que não é proibido.

- Eu sei! – exclamou com obviedade – Mas por que ela acha isso? A gente nunca...

Ele olhou para a amiga enquanto ela deixava a frase inacabada no ar e virava o rosto encabulada. Então ele retomou o raciocínio, não querendo que Tassa sentisse qualquer desconforto nesse dia especial:

- Bom, talvez eu a chame, talvez não. Mas não será hoje, porque já tenho compromisso. Esta noite vou comemorar a aprovação de uma amiga extremamente competente, que desta vez vai poder beber sem medo de ser feliz.

- Eu passei, né? – perguntou sorrindo e em tom bobo.

- Passou sim. Clériga de Jade. Que título forte para aquela menininha do vilarejo distante, que chegou toda assustada à maior Igreja do Reino. – fez uma pausa, gostando de vê-la saborear o elogio. Sentiu vontade de chegar mais perto. O contato entre os olhos castanho-claros dele e os castanho-escuros dela estava intenso. Mas optou por se reprimir naquele momento, pois sabia que ela tinha outra coisa mais importante a fazer – Sabe quem vai gostar de ouvir isso antes de todo mundo?

O rosto dela resplandeceu.

- Eu vou lá contar pra ele agora! – e saiu correndo para dentro do vestiário.

Era claro que ambos se referiam a Jânus, o mentor de Tassadara. Por mais que ela quisesse encontrá-lo logo e pular no seu pescoço de tanta alegria, para contar que agora ela também era uma clériga, queria estar minimamente apresentável, e isso significava pelo menos tirar a camisa suja de sangue, recolocando o robe beje. Lavar pelo menos o rosto também era altamente recomendável.

Barrim olhou a amiga entrando no vestiário e afastou novamente o pensamento de ir atrás dela. Aquele não era o momento apropriado, preferiu respeitar o enorme amor que Tassa tinha por seu mentor. Ele compreendia bem esse elo, porque também teve um mentor que foi uma de suas figuras paternas. Talvez mais ainda que o mentor de Tassa, porque o de Barrim o criou praticamente desde o nascimento, quando foi abandonado pela mãe na ala hospitalar da Igreja. O Clérigo Franco se voluntariou para cuidar pessoalmente dele, desde bebê, mantendo-o a salvo do mundo.

"Franco..." seu coração ainda apertava quando pensava nele. Mesmo depois de anos, ressentia-se por não ter estado ao seu lado no momento de sua morte. Por incentivo do próprio Franco, Barrim tinha deixado Férigam para viver um tempo com sua outra figura paterna, fora da cidade. Anos se passaram, e ele ainda não tinha se perdoado por não ter voltado a tempo.

Quando Tassadara saiu do vestiário, Barrim não estava mais no campo de treinos.

- E lá se foi o gracioso...

xxx

Recado do Autor: "Barrim, o gracioso" mostrou zero interesse pela Ana, e todo interesse pela Tassadara. Interesse de amigo, com certeza, mas será que ele quer algo mais? E que história é essa de que ele viveu fora da cidade com sua outra figura paterna?
Para saber, não vai ter jeito, vai ter que clicar na estrela (só pra me dizer que está gostando mesmo) e avançar na leitura.

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