Capítulo 29 - Sozinho Com o Inimigo

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O interior da tenda vibrava magia. A iluminação vinha de três globos de luz, como os que a Escola em Férigam fabricava. Mas, em vez de repousarem sobre algum suporte, flutuavam imóveis próximos ao teto, numa disposição em que cada canto do ambiente era iluminado por igual.

No meio da tenda, uma larga tábua trabalhada de madeira, imóvel no ar, sem hastes suspendendo-a do chão. Sobre ela, diversos livros e petrechos típicos de um laboratório de magia, em quantidade claramente maior do que caberia no singelo e único baú existente no local. Atrás, ocupando toda uma lateral, uma única folha gigante de babosa, aumentada magicamente de tamanho para servir de cama macia.

Mas foi aos poucos que Barrim identificou a presença de todos esses objetos mágicos, porque a primeira coisa que viu ao entrar foi o elfo a sua frente. Um elfo que apontou uma varinha na sua direção assim que o viu, as pupilas felinas totalmente dilatadas, a postura claramente agressiva.

- Não é todo dia que um meio humano consegue chegar até mim.

A voz do elfo era poderosa e limpa, e combinava com sua aparência esteticamente superior à dos demais kéleres. Não havia um grão de terra nos seus cabelos, que escorriam como uma cascata prateada pelas costas. Sua roupa também era limpa, sem remendos e exibia a mesma combinação de preto, dourado e púrpura que a do Clérigo Viserani.

Barrim estava estático. Agora identificava o formigamento que sentira ao passar pelo pesado tecido que servia de porta da tenda. Foi o mesmo formigamento que sentiu na floresta, quando o verdadeiro Clérigo Viserani dissipou suas ilusões. Não sabia dizer como, mas tinha certeza de que tinha voltado à sua aparência real.

- Ah, não esperava ser pego? Achou que uma magia básica de ilusão o ajudaria? Você não tem a menor ideia de onde se meteu. – sibilou.

Tremendo, sabendo que bastava uma intenção do mago para acionar a magia que estivesse armazenada na varinha, Barrim fez a primeira coisa que lhe veio à cabeça: ajoelhou-se no chão, em uma reverência.

- Senhor Mago Andrix. É uma honra finalmente conhecê-lo.

A reverência de Barrim não alterou a postura do elfo. Mas incutiu-lhe curiosidade suficiente para render mais uns instantes de vida.

- Você tem 1 chance para se explicar. Clérigo de Jade.

O desprezo na voz daquele que tinha sua vida na ponta da varinha levou Barrim a uma atitude drástica.

- Cl- clérigo? – perguntou assustado – Não, senhor, eu prometo, esta roupa não é minha! Peguei de um humano, na floresta, apenas porque era melhor que a que eu usava. Eu... nem sei usar este troço. – Barrim pegou o seu Foco, símbolo sagrado de sua deusa, e o arremessou de lado, como se fosse um objeto repugnante.

Esse ato manteve a curiosidade do mago. Já havia intimidado muitos clérigos humanos em sua vida, e nunca vira um que tratasse dessa forma o símbolo de sua religião.

- Não tente me enganar, meio humano. Se você não é um clérigo da paz, que de algum modo descobriu sobre o julgamento e veio tentar me dissuadir, então quem é você?

- Eu... não sou ninguém, senhor!... Eu... nem mereço estar na sua frente, ou entre vocês todos... eu sei disso, mas é tudo o que mais quero!

A varinha se mantinha firmemente apontada.

- Eu nem ao menos consegui salvá-lo... – Barrim fingiu que sentia uma dor na alma – Logo ele, logo o único elfo que me enxergou também como um elfo, que enxergou que eu desprezo o meu lado humano, que desprezo este sangue mais do que tudo! Eu não mereço...

- Ele... quem? – perguntou Andrix.

O meio-elfo ajoelhado não respondeu de imediato. Fez que reunia forças para enunciar o nome em voz alta.

Magia, Amores e GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora