Parte 41

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Resolvi deixar a minha mala no corredor, sobre um banco. Não queria ter que me despedir do Nanami. Era demais.

A enfermeira me deixou entrar no quarto. Ele estava deitado, tentando ler um livro, segurando-o no ar com dificuldade.

- S/N, por favor me ajude a segurar o livro! Eu preciso terminar essa página, mas está difícil! - ele comentou rabugento quando percebeu que era eu entrando.

Me aproximei e segurei o livro para ele. Fiquei atrás do livro e notei que sua barriga estava enfaixada do peitoral para baixo. Acho que nem o peso do livro ele conseguia suportar. Tinha sido grave mesmo.

- E ... pronto! - ele disse retirando os óculos. - Me desculpe, eu tinha que concluir a leitura, está fantástica, você tinha que ler ... - ele fez um gesto com a mão para que eu removesse o livro da frente dele.

Quando ele me olhou, seus olhos se arregalaram.

- S/N, o que aconteceu? - ele pegou no meu pulso com a força que conseguia. - Me conte agora o que aconteceu? - ele estava alterado.

Eu me aproximei mais e o beijei na boca. Meu beijo pedia colo. Queria que a dor passasse. Senti um pouco de alívio quando reconheci aquele beijo na minha boca. Fiquei ali alguns segundos. Lágrimas escorreram.

- Do que você está falando? - eu fui desencostando - Não aconteceu nada! - eu menti descaradamente, enxugando as lágrimas.

- Como não aconteceu nada, S/N? Seus olhos estão inchados de tanto chorar! Você está triste! Me conta, por favor! - ele suplicou docemente.

- Você dizia do livro. - eu mudei de assunto - O que tinha de tão interessante nele? - a última coisa que eu tinha era interesse no livro, minha voz denunciou isso.

Mas eu não queria falar nada. Nanami percebeu que eu não estava bem.

- Vem aqui, me dê outro beijo, por favor! - ele pediu com a voz doce. - Seu beijo, eu senti muito a falta dele!

Me aproximei e o beijei. Dessa vez meu beijo estava mais calmo. Que beijo doce!

- Você vai ficar bem, Nanami? Como você está? - eu o olhei nos olhos pela primeira vez naquele dia.

Fiquei com vontade de chorar só de pensar que não ia mais vê-lo.

- Eu estou bem! Eu só preciso de tempo para me recuperar! Mas logo eu estarei na ativa de novo! - ele sorriu - Não vejo a hora de comer meu sanduíche preferido! Você poderia trazê-lo quando a enfermeira permitir? - ele tentou deixar o clima leve.

Devido a perfuração no intestino, ele estava sendo alimentado por sonda ainda. Não podia comer nada que fosse sólido. Era necessário um tempo de recuperação.

- Com certeza! - eu concordei, entrando na dele.

- Senta aqui, pertinho de mim! - aquela voz sedutora dele me aconchegava. - Vou te contar sobre o livro. Mas por favor, finja interesse pelo menos! - ele fez uma cara indignada.

Eu puxei a cadeira e comecei a folhear o livro, enquanto ele me falava deslumbrado sobre a história. Tomando cuidado para não revelar mais do que devia. Ele queria mesmo que eu lesse. Me alegrei um pouco com ele.

Depois de um tempo, a enfermeira bateu na porta. O tempo havia acabado.

- Tenho que ir! - me aproximei e dei um longo beijo nele, sem nenhuma pressa.

Tentei registrar o máximo que eu conseguia daquele beijo. Do cheiro dele. Da voz dele.

- Você vai voltar amanhã, não vai? - a voz dele tinha preocupação.

- Com certeza! - eu me esforcei para mentir de novo, tentei dar o meu melhor sorriso. - Vou trazer o seu lanche e comer na sua frente! - eu ri debochada.

O humor era minha melhor arma para esconder a dor. Eu torci em silêncio para ele não me desmascarar, como daquela outra vez.

- Não diga isto, sua mal-criada! Você vai ver quando eu me recuperar! Espera só! - ele riu maliciosamente - S/N, fica bem! Eu estou aqui, você sabe! - ele pegou em minha mão e apertou com firmeza. - Qualquer coisa, me liga!

- Eu estou bem! - dei um beijo na testa dele. - É você quem precisa ficar bem! Até amanhã! - fui em direção à porta e dei um tchau com a mão, sem olhar para trás.

Adeus Nanami. As lágrimas começaram a escorrer.

O vazio da morteOnde histórias criam vida. Descubra agora