Arrastando o carrinho de mão com o computador enorme em cima, Daniel me levou até o fim da rua de nossa casa, virando para a direita e chegando na garagem de alguém. Eu e Daniel olhamos por volta. Ao contrário de mim, Daniel parecia saber exatamente o que procurava. Ou quem procurava, eu percebi quando o vi acenar para um rapaz, de cabelos acastanhados e pele morena.
"E aí, Breno. Como vai os estudos?"
"E aí, Daniel. Eu faço o que posso. Quem é o pirralho?"
"Meu irmão mais novo, Ariel. Eu vim aqui porque ele tava chorando em casa por causa que o computador antigo da gente deu pau de vez, e ele não quer que ela jogue fora. Tem como tu dar uma olhada?"
"Entra, deixa eu ver."
A gente entrou na garagem bagunçada dele. Tive que seguir Daniel pra ter certeza de que não pisaria em nenhuma das quinquilharias que via espalhadas pelo espaço. Televisões, máquinas de escrever velhas, celulares, tudo desmontado e deixado no chão as mostras.
Senti meu coração acelerar quando vi partes de um computador separadas em uma mesa no canto socado da garagem, onde a gente se aproximava para colocar o meu. Será que ele iria despedaçar o meu também? Me senti incerto. Mas Daniel assegurou que o tal Breno iria só ver o que havia acontecido de errado.
Deixei que Breno tentasse ligar o computador, utilizando a energia da garagem dele. Ligou, mas não carregava a abertura que eu já estava acostumado a ver. Ficava sempre reiniciando em loop, fazendo com que eu sentisse que talvez não tivesse jeito.
Breno tentou apertar algumas teclas, que eu não havia prestado atenção, e nada. Tentou outras e então, uma tela totalmente diferente que eu nunca tinha visto apareceu. Meus olhos brilharam e eu saltei para mais perto dele, sem entender como ele fizera isso.
Novas opções da tela apareceram, como um menu secreto de um game que eu nunca tinha visto. Breno percebeu minha curiosidade e soltou uma risadinha.
"Gostou?"
Eu mal havia prestado atenção enquanto ele mudava algumas configurações e mensagens que nunca havia visto nesse novo menu e apertava enter. O computador ligou normalmente depois, mas eu ainda estava chocado com essa tela misteriosa que nunca tinha acessado.
"Como você fez isso?"
"Apenas disse para o computador ligar com gentileza, sem chororô."
Frustrei-me com sua resposta. Eu queria acessar aquele menu misterioso eu mesmo. Explorar o que dava pra fazer nele.
"Você brinca muito nesse computador, né? Eu vi que mudou um bocado das configurações dele, e a área de trabalho, e baixou várias coisas também. Tá tudo uma bagunça."
Eu olho pra ele. Aceno com a cabeça.
"Eu tenho muito tempo livre em casa."
"E tantas coisas que você poderia fazer, você passa o tempo usando essa velharia?"
"É a única coisa que minha mãe não briga comigo quando eu faço."
"Hmm... Sua mãe briga muito com você, é?"
Aceno a cabeça.
"Me diz o que foi que você fez."
"Não digo. Quem sabe se você não vier mais vezes aqui, talvez um dia você descubra?"
Olhei bem pra ele. Tinha raiva do fato de ele manter seus truques em segredo, da mesma forma que tinha raiva do fato de minha mãe me odiar por motivos que nunca entendi.
Breno ajudou Daniel a colocar o computador no carrinho de mão, e puxou até fora da garagem, quando saiu, olhou pra mim, que ainda encarava Breno.
"Eu ainda vou voltar. E eu vou descobrir como você fez pra consertar o computador."
"Quero ver você tentar, Ariel chorão."
Breno me deu um peteleco na testa, mas o desafio já tinha sido feito.
***
Nos meses seguintes, comecei a visitar a garagem de Breno mais e mais vezes. Eu não iria desistir. Aceitei seus desafios e passei horas tentando resolvê-los. Por vezes perdia a noção do tempo pensando e pesquisando e escrevendo. Resolvi o primeiro desafio dele seis meses depois, quando ele percebeu que eu não iria desistir de ir a casa dele e que minhas pesquisas não davam em nada.
"Esta" Disse Breno enquanto abria o menu novamente, desta vez mais lento para que eu pudesse ver como era feito. "É a linguagem dos computadores, Ariel Chorão. É por meio dela que você se comunica com eles. É muito difícil de entender e até de estudar. Tem certeza que é isso que quer aprender?"
"Sim!" Eu disse empolgado.
"Então deixa eu te dizer o que você precisa saber."
Ele me passou o nome de várias línguas, assim como permitiu que eu continuasse a visitá-lo mais vezes para poder aprender sobre como se montava um computador do zero. A verdade era que ele gostava dessas coisas, e achava emocionante ter alguém com quem conversar sobre que se interessasse tanto quanto ele.
Minhas tardes começaram a ser um tanto mais prazerosas enquanto eu me via pesquisando e estudando as línguas, e me envolvendo em desafios com Breno sobre como resolver certos problemas que encontrávamos na jornada.
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Ariel.EXE
RomanceDesde muito novo, Ariel sofre abusos de uma mãe que nunca o amou. Quando atinge a idade adulta e se torna Hacker famoso, elu decide se separar completamente de sua família e acredita ter descoberto o verdadeiro significado do que é Amor Próprio, por...