Parte 1: capítulo 11

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05/01/2023

Nesses anos encarcerado, tive tempo para refletir sobre muitas coisas. Uma delas é o quanto odeio Taehyung. Outra é que, graças ao melhor advogado do país, minha pena de quinze anos foi reduzida para três. Sei que foi ele quem contratou esse advogado, uma tentativa de se redimir. Mas isso não apaga o fato de que fui espancado, passei fome e ainda estou preso há dois anos. Foram os anos mais difíceis da minha vida, especialmente o primeiro.

Taehyung me visitou uma ou duas vezes, mas como eu só conseguia xingá-lo, nunca mais voltou. Mesmo assim, ele ainda manda presentes: bolo nos meus aniversários e brinquedos para passar o tempo, inclusive um Nintendo DS. É evidente que ele não se esqueceu de mim.

Mas eu o odeio.

Esses anos também me trouxeram lembranças do Donghae, especialmente do dia em que ele me conquistou.

01/04/2011 (12 anos atrás)

— Você sabe que precisamos jogar com estratégia, não é? — digo ao Donghae enquanto jogamos Resident Evil no PlayStation 3.

— Você sabia que estou fingindo não saber jogar, não é?

— Ah, para com isso, você não vai mandar uma dessa num primeiro de abril. Aprende a jogar, cara!

E, nesse segundo, ele acerta todos os tiros que tentou, me deixando impressionado. Continuando a jogar, percebo que ele realmente estava me enganando para que eu ganhasse.

— Cara, como é que você pode ser tão bom nisso?! — pergunto, entusiasmado. Eu amava jogos de tiro, tinha vários pôsteres do tipo e gostava muito de brincar de Nerf quando era mais novo.

— Se quiser, posso te mostrar na vida real.

Ouvimos a porta de casa se abrir, e logo vejo meus pais entrando com as compras.

— Oi, querido! E olá, Donghae... — minha mãe nos cumprimenta. Ela nunca gostou da nossa amizade, mas como ele era o ex-namorado da minha prima e nos demos muito bem desde que nasci, ele vinha jogar comigo de vez em quando, mesmo após o término.

Meu pai não se importava muito, então só acenou e foi guardar as compras.

— Jeon, vamos comigo? — ele pergunta e faz sinal de silêncio com o dedo, para eu não contar para minha mãe. Ele ia me mostrar uma arma de verdade, e eu sabia que ela não gostaria nada disso.

— Claro. — nos levantamos do chão e desligamos o videogame. — Daqui a uma hora eu volto, vou me encontrar com uns amigos, mãe — minto para ela, tentando não gaguejar, e mesmo desconfiada, ela permite.

Eu e Donghae caminhamos em silêncio por dois minutos. Meu coração estava acelerado pela adrenalina. Eu queria muito ver a arma, mesmo com um pouco de medo.

— E a arma?! — pergunto, já impaciente.

— Faz silêncio, não fala isso em voz alta! — ele me dá um soco leve no braço, que chega a doer, mas finjo ser forte e não demonstro. Quando chegamos a um beco, ele tira a arma do bolso. Para um adolescente de catorze anos, aquilo era incrível. E principalmente quando segurei e senti o peso.

— Por que trouxe uma arma para minha casa?

— Quer aprender a usar, ou não? — ele evita minha pergunta.

— Eu não vou matar ninguém.

— Claro que não, bestão. Você vai atirar no alvo, talvez alguma fruta. Se você namorar comigo, posso te ensinar a usar e te mostrar meu dia a dia, mas se aceitar, vai ter que ser para o resto da vida.

— Mas somos homens. Homem não pode namorar homem.

— Pode sim. Eu só não vou te beijar até você completar dezesseis, mas estaremos namorando e você não pode contar a ninguém sobre nada que eu te mostrar.

E eu aceitei.

Talvez já estivesse predestinado a esse tipo de vida, pois não me assustei com a violência e as coisas erradas que vi com Donghae naquele tempo que convivemos.

Ele conseguiu me manipular, escondendo drogas no meu quarto, usando minha casa como refúgio e me transformando num cúmplice confiável que faria tudo o que ele pedisse, já que "namorávamos".

05/01/2023

Realmente fui usado todo esse tempo, mas aprendi a usar armas e granadas, comprar e vender drogas e armas contrabandeadas, e a lutar. Se fosse daquele jeito para sempre, não seria tão ruim como começou a ser em 2013, quando completei 16 anos e me tornei quase um adulto. Foi aí que ele assumiu o namoro de verdade e começou a me tratar como um adulto, mas de forma tóxica e possessiva, provavelmente por medo de eu perceber o que estava acontecendo e abandoná-lo.

Nunca agradeci tanto pela morte de alguém, porque poderia passar minha vida toda sendo caçado, e já basta a polícia. Não preciso ser perseguido por mais ninguém.

Os pensamentos relacionados a ele ainda me perseguem, mesmo depois de todos esses anos.

Começo a jogar Nintendo para o tempo passar mais rápido. Hoje, chegaram aqui um jogo do Kirby e outro do Donkey Kong. Taehyung deve estar muito arrependido para fazer essas coisas.

Ele merece perdão, mas eu não consigo perdoá-lo. Sei que, se ele não se importasse, não estaria fazendo tudo isso por mim até hoje.

— Jungkook, você tem visita. — o policial avisa, interrompendo minha partida de Kirby.

Suporto, pensando que possa ser o filho da puta do Taehyung, mas eu quase me engasgo de susto ao ver mais pais ali... depois de nove anos sem suas notícias.

Minha mãe está aos prantos, soluçando de um jeito que nunca tinha visto antes. Seu rosto está marcado por rugas que não existiam nove anos atrás. Meu pai está com os olhos vermelhos e um olhar perdido, como se estivesse tentando encontrar o filho que uma vez conheceu. Me sinto muito mal.

Sinto um nó se formar na minha garganta e meus olhos se enchem de lágrimas. O arrependimento está esmagando meu peito.

— Desculpa. — digo, as palavras saindo fracas, trêmulas, enquanto abraço minhas pernas, tentando me esconder de vergonha na cela que me cerca.

Minha mãe, mesmo em meio ao pranto, tenta me consolar. — Nós que te devemos desculpas, Jeon. — ela diz, fungando, sua voz tremendo. — Você era muito novo, eu sabia que o Donghae te levaria para o mal caminho.

— Mãe, eu... — começo, mas as palavras se perdem. Há tanto a ser dito, tanto a ser explicado, mas nada justificaria o injustificável.

Meu pai limpa a garganta, e olho para ele sentindo mais lágrimas escaparem. — Nós falhamos com você, filho. — diz, sua voz firme, mas carregada de dor. — Não deveríamos ter deixado você se afastar, deveríamos ter visto os sinais desde o começo.

Minha mãe enxuga as lágrimas com a manga do casaco. — Tentamos te encontrar, Jungkook. — ela diz, a voz trêmula. — Procuramos por você em todos os lugares, mas você parecia ter desaparecido... — Sua voz se quebra, e ela leva a mão à boca, tentando conter os soluços. — Eu pensava que você estava morto, filho.

— E o Donghae está preso também? Ele merece apodrecer atrás das grades. — meu pai pergunta com uma amargura na voz.

— Agora que estou aqui, não desejo isso para ninguém. — digo com a voz baixa. — Mas o Donghae morreu. Estou a salvo, pelo menos. — Essas palavras deveriam trazer alívio, mas tudo o que sinto é um peso no peito por tudo o que foi perdido.

Conto tudo o que aconteceu para eles, e foi difícil quando tiveram de ir embora.

Depois de nove anos sem vê-los, nove anos sem nenhuma notícia, o tempo pareceu insuficiente. Queria poder abraçá-los, segurá-los e nunca mais sair de perto deles.

Eles me abraçam com força pelas grades, como se estivessem tentando transmitir todo o amor e apoio que não puderam dar durante todos esses anos.

— Nós estaremos aqui quando você sair, Jeon. — minha mãe diz, se esforçando para falar como a voz firme.

Eles saem, e o vazio da cela se torna insuportável. Tudo o que posso fazer é esperar, contar os dias e esperar que, um dia, eu possa ser livre novamente.

Outlaw ( Kth + Jjk )Onde histórias criam vida. Descubra agora